O analista político guineense Rui Jorge Semedo defendeu, em declarações à Lusa, que a Guiné-Bissau “vive um período de desconstrução do Estado” onde atualmente a Presidência do país é o único órgão funcional.
“Quando falamos do Estado, falamos da existência de um conjunto de instituições que dinamizam, regulam a presença do Estado. Então quando vemos um contexto de ausência de instituições importantes como por exemplo o parlamento, de um Governo com legitimidade eleitoral, um poder legislativo funcional, então nós não podemos falar da presença de um Estado com autonomia e plenos poderes”, sublinhou Rui Jorge Semedo.
O Presidente guineense, Umaro Sissoco Embaló, evocou a existência de uma grave crise institucional, em dezembro passado, para dissolver o parlamento e demitir o Governo que tinha sido eleito em junho de 2023.
O chefe de Estado instituiu um Governo de iniciativa presidencial que vários partidos e vozes da sociedade civil guineense afirmam não existir na Constituição do país.
Rui Jorge Semedo considera que o único órgão do Estado guineense a funcionar é a Presidência da República.
“Atualmente é percetível e até que é consensual que a única instituição que funciona de facto, e com um poder até para além da sua competência, é a Presidência da República”, defendeu.
Mestre em Ciência Política, graduado em Ciências Sociais, ambas as formações tiradas no Brasil, investigador do Centro de Estudo Africano da Universidade do Porto, Rui Jorge Semedo prepara-se para lançar, no próximo dia 20, o livro “Desconstrução de um Estado por Construir” (1973 a 2019).
A obra tem como base uma análise do também investigador associado do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa (INEP) da Guiné-Bissau a 41 discursos proferidos por sete Presidentes guineenses por ocasião do final do ano.
Os discursos do atual Presidente guineense, no poder desde fevereiro de 2020, não foram contemplados no livro.
Rui Jorge Semedo explicou que o livro era para ter sido publicado em 2018, o que não aconteceu devido à dificuldade em reunir todos os discursos presidenciais, e não conseguiu obter todos.
Desde a independência unilateral de Portugal em 1973, o analista defende que a Guiné-Bissau conheceu o período do Estado Novo, que vai 1974 a 1980, depois passou por um período de decadência do Estado, a partir de 1980, que se deveu “à rotura” provocada pelo golpe de Estado militar de 1980.
A Guiné-Bissau só voltaria a conhecer um período curto de reforma do Estado a partir de 1991, que permitiu a criação de partidos políticos, mas que terminou em 1998 com o eclodir do conflito político-militar, observou.
O analista considerou que as consequências desta fase de fragilização do Estado guineense são vividas até hoje o que, notou, potencia a desconstrução do Estado que o país vive atualmente.
O analista, com vários artigos científicos publicados na Guiné-Bissau, Portugal, Brasil e nos Estados Unidos de América, afirmou que o país, em 50 anos de independência, “nunca tinha vivido uma experiência de ausência de instituições importantes”.
O livro é apresentado no próximo dia 20 nos jardins da Tiniguena, Organização Não-Governamental que trabalha na conservação dos recursos naturais da Guiné-Bissau e da qual Rui Jorge Semedo é colaborador.
Conosaba/Lusa
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