sábado, 22 de maio de 2021

Allah ku maudo.

Que os agentes sejam colocados nos locais de reza, nos dias de Eid, para garantir a segurança aos fiéis Muçulmanos, é absolutamente admissível e louvável, porque os nossos países enfrentam sérias ameaças, sobretudo a ameaça Jihadista, para a qual, tendo em conta a realidade actual no seio das FDS, divida-se que o país esteja em condições de fazer face.
Daí o total acordo em relação à presença dos agentes do MINT nos locais de reza no dia de Eid ElD Fitr, o que devia abranger todo o território nacional, caso o Ministério dispusesse de meios humanos para isso, o que infelizmente não é o caso.
Os fiéis muçulmanos, como impõem os ensinamentos do Islão, antes de se dirigirem ao local do Eid, nesse dia, tomaram todas as medidas de higiene necessárias e se apresentaram no seu melhor, isto é, em termos indumentários e outros.
E, para se precaverem das desagradáveis surpresas, como disciplinados que são, tendo em conta o actual contexto do COVID 19, seguiram rigorosamente as recomendações das autoridades sanitárias, à luz do estado de calamidade, renovado há poucos dias, através de um decreto presidencial de Sua Excelência Senhor Presidente da República.
Assistiu-se este ano a cenários desagradáveis nunca dantes vistos, os quais não honraram os muçulmanos e “a fortiori” os seus quadros, e seria de uma vergonhosa desonestidade intelectual, não denunciar e condenar com toda a última das energias este ato ignóbil, inqualificável e injustificável.
Este posicionamento, que é o de uma maioria silenciosa, não é um incitamento a seja o que for, e nem tão pouco a um apelo ao virar de costas a este regime que apoiei sempre, desde a campanha eleitoral até este momento em que escrevo esta comunicação.
Se o governo estava a pensar em restringir alguma liberdade do cidadão muçulmano nesse dia de Eid, podia pura e simplesmente recomendar que não se realizassem rezas em lugares públicos, em cumprimento do estado de excepção em vigor, como medida preventiva, e essa decisão teria acolhimento favorável, porquanto aconteceu no ano passado e não houve nenhuma oposição.
Mas, se o governo permitiu aquilo que, como ficou bem plasmado no decreto, os cidadãos praticassem os seus cultos, mas na estrita observância das recomendações das autoridades sanitárias, e a Guiné-Bissau nao estando em guerra, qual era a necessidade de colocar todo esse aparato nos locais de reza?
Qual era o objectivo que se pretende atingir com esta atitude musculada? Será que o governo não sabe que a mera presença de uma força de repressão nos locais de reza constitui uma pressão, sobretudo no Imam, encarregue de dirigir a cerimónia religiosa?
Ir até ao ponto de, em certos lugares, cidades ou vilas, exercer violência sobre os fiéis muçulmanos, coisa nunca vista na história da Guiné-Bissau! Trop, c’est trop!
Em certos lugares em Bissau, os Imames nem terminaram o “khutba”, e o público foi dispersado, por supostas ordens superiores. Não será isso abuso de poder?
Por este país passaram grandes chefes de estado, alguns muito religiosos, como é o caso do falecido Henrique Rosa, mas a comunidade muçulmana nunca sofreu pressão de tamanha falta de consideração igual aquilo que se viveu este ano. Afinal kinku ka rispita kin?
Compare n’est pas raison, como diz o Francês, mas será que isso seria admissível pela comunidade cristã, e não geraria um conflito com consequências imprevisíveis? Npunta nan son….
Foi decretado um dia de feriado para a celebração do Eid, o fim do sagrado mês de Ramadan. Até o dia seguinte podia ser de tolerância de ponto, devido às distâncias a que muitos são obrigados a deslocar-se para irem assistir a reza com as famílias, como acontece nos países vizinhos. Mas se tal não é o caso, talvez seja por culpa daqueles quadros muçulmanos que tiveram a oportunidade de exercer altos cargos na governação e no parlamento, e que nunca se interessaram por esta questão, e nem se interessarão, porque a maior parte deles são assimilados, aculturados e complexados, sobretudo aqueles com mais canudo.
Em relação ao “incidente de Cuntuba” e outros lugares, no Leste do país, aquilo não passa de má interpretação do conteúdo do Livro Sagrado (Alcorão) nessa matéria.
Na verdade, quando surgiu o Islão, o homem não tinha tanto domínio da Ciência e muito menos da Astronomia, por isso é que havia tanta divergência quanto aos dias de reza, cada localidade se baseava na observação da lua e os lugares não tinham a forma de se comunicarem, mesmo que as distanciais não fossem assim tão consideráveis.
De facto, hoje em dia, esse estado de coisas devia ser ultrapassado. Vejamos um exemplo concreto. São 3 horas de tempo que separa a Guiné-Bissau da Arabia Saudita, o berço do Islão. Será que faz sentido os povos desses países jejuarem ou rezarem em dias diferentes? Essa pergunta é recorrente, mas a resposta nunca será encontrada enquanto não privilegiarmos a Ciência, o Conhecimento.
Vimos que os países árabes muitas vezes rezam em dias diferentes, por uma questão da interpretação do conteúdo do Livro Sagrado sobre essa matéria especifica. No vizinho Senegal, acontece o mesmo, e este ano não foi excepção à regra.
Porque é que na Guiné-Bissau se os muçulmanos de Cuntuba entenderem que não viram a lua e querem rezar na sexta-feira, onde está o problema.
Rezar na quinta os sexta-feira, não os faz menos e nem mais muçulmanos, porque acreditam, a semelhança de todos os muçulmanos do mundo, nos 5 pilares do Islão.
O Estado decretou um dia de feriado e e com esse dia e que deve preocupar-se em relação ao absenteísmo dos funcionários que tem a responsabilidade de pagar salários. O funcionário que não rezar no dia marcado oficialmente para a reza, a esse funcionário deve ser marcada a falta e descontado do seu salário.
Agora aquele que não esta vinculado ao Estado e que do Estado não recebe salários, alem do facto de viver do fruto do seu trabalho, se quiser rezar tantos dias quantos quiser, o problema e dele, desde que não afecte nada ao funcionamento normal das instituições.
E tao simples quanto isso. E se isso fosse observado, não teriam essa desnecessária confrontação entre as populações e as forças de ordem.
Que esta seja a primeira e última vez em que a comunidade muçulmana e provocada, porque o Governo tem outras responsabilidades que não seja distrair o Guineense com assuntos que não lhe diz respeito.
A Guiné-Bissau e um estado laico, como tal, salvo neste estado de pandemia, cada comunidade deve ser a liberdade de praticar a sua religião.
O “surat” ou capítulo denominado “bakhara”, “a vaca”, do Sagrado Alcorão, reza o seguinte, numa das passagens da “aya”, ou paragrafo 185, diz que:
“quem dentre vocês observar a luz, que jejue”, ou seja, se observarem a lua, jejum! E esta recomendação e aplicável ao fim do Ramadão. Mas essa observação tem as suas regras, nao é dado a qualquer aventureiro, mas a uma pessoa idónea e com pelo menos duas testemunhas também idóneos”.
Se as populações de Cuntuba ou de outros lugares entenderem que o facto de não terem visto a lua naquela localidade não vão rezar na quinta-feira, onde está o problema? Porque deve o Estado, um estado considerado laico, à luz da Constituição da República, vai interferir? Um Estado deve ter um comportamento pedagógico e não um comportamento musculado que viole os direitos dos cidadãos, que são a razão da sua existência.
Não há nada que possa branquear as forças que intervieram em Cuntuba ou noutros lugares, porque isso não passa de abuso de poder e um autêntico obscurantismo. Aliás, essas forças não fizeram senão cumprir uma missão que lhes foi dada, por isso o dedo acusador deve ser apontado em direcção a quem deu essas ordens absurdas e susceptíveis de no futuro engendrar situações difíceis de controlar.
Sem estar a fazer a promoção de seja quem for, mas tenho a plena certeza de que essa ignobilidade não veio de um não muçulmano, porque na Guiné-Bissau, os dirigentes não muçulmanos, contrariamente a propaganda, são os que mais procuram fazer com que a laicidade do Estado seja um factor de coesão social, por uma verdadeira Guinendadi.
Governar e também a capacidade de avaliar antes de tomada de decisões.
Lebsimenti tene limite!
I djusta dja!
Deus abençoe a Guiné-Bissau!
Allah livre a Guiné-Bissau do obscurantismo!

Por: Yanicky Aerton

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