domingo, 14 de abril de 2024

Umaro Djau: "DEFENDO UM PACTO NACIONAL COM A INSTITUIÇÃO MILITAR"

A forma como um país alcança a sua independência afecta a sua estrutura militar e, em consequência disso, a formação dessa peculiar cultura político-militar.

Em países onde os processos de luta pela independência foram violentos -- como é o caso da Guiné-Bissau -- há sempre uma tendência para a formação da cultura do "homem forte". Aliás, após a independência, todos nós contribuímos para a afirmação desse poder e cultura militar, através de acções e simbolismos inculcados na memória nacional. 

E, numa relação de causa e efeito, a instituição militar também acaba afectando a formação do próprio Estado.

Assim, a transformação dessa cultura é um trabalho árduo, sobretudo em países mal-governados, extremamente debilitados e com parcos recursos, como também é o nosso caso.

Todavia, os falhanços verificados até aqui para a transformação das nossas Forças Armadas Revolucionárias do Povo (FARP) para forças republicanas são, essencialmente, por falta de vontades (e visões) políticas.

Aliás, como o resto do país. Os falhanços em quase todos os sectores não podem ser distanciados da esfera política-partidária e do Estado.

Reconhece-se também que, como qualquer outra instituição histórica militar, as FARP estão sempre envolvidas em tentativas de manter o seu estatuto privilegiado, através de vários exercícios de legitimação -- uns francamente justificáveis e outros questionáveis.

Numa dada altura, a Guiné-Bissau terá que criar um novo Pacto entre os políticos, a sociedade civil e a instituição militar, através de um trabalho sério, com consensos alargados e metas justas e exequíveis.

Mas, antes, será preciso saber ultrapassar o tabu de discutir a vida e o comportamento institucional da classe castrense. Na minha humilde opinião, as recentes trocas de comunicados entre o PAIGC e a instituição militar devem ser encaradas neste âmbito de um diálogo difícil, desconfortável, mas essencial. Cada um deve ter a coragem de dizer o que sente em relação ao outro, sem medo, sem constrangimentos e independentemente da relação de "intimidade" histórica, ou mesmo na ausência da mesma.

Da minha parte, estarei disposto para dar a minha contribuição para a materialização deste sonho para muitos elementos das forças de defesa e segurança -- em activo ou na reforma.

A estabilização da Guiné-Bissau, o seu desenvolvimento e a consolidação da sua democracia dependerá de um tal desafio de aproximar a instituição militar às instituições civis.

Temos que trabalhar na criação de garantias mútuas entre todos os actores nacionais -- militares, políticos e civis -- para reduzir os conflitos institucionais, dignificar as partes e salvaguardar os interesses vitais da Guiné-Bissau.
Será um diálogo desconfortável e difícil, mas crucial e patriótico.
--Umaro Djau
14 de Abril de 2024

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