[REPORTAGEM] Os emigrantes guineenses residentes na ilha de Santo Antão, nos municípios do Porto Novo, Paul e Ribeira Grande em Cabo-Verde, dizem que se sentem bem integrados naquele país (arquipélago) da África Ocidental, mas confessaram que estão “ impacientes” com a morosidade e a burocracia que se regista no processo de obtenção de documentos de regularização extraordinária.
A maior parte destes imigrantes guineenses reside no município de Ribeira Grande e opera na área do comércio e alguns na construção civil, mas até à produção deste artigo alguns ainda não tinham conseguido ter os seus cartões de residência para evitar pagar as multas, mas sempre foram tratados bem pelas autoridades cabo-verdianas.
A preocupação foi transmitida pelo vice-presidente da Associação dos Cidadãos Estrangeiros da África Ocidental, o guineense Dibane Dabo, em entrevista ao enviado especial do Jornal O Democrata, Alison Cabral que está de visita a Cabo-Verde para saber da vida dos cidadãos guineenses, nomeadamente a situação da integração e os projetos que estão a desenvolver naquele país com uma ligação histórica profunda com a Guiné-Bissau.
Disse que um dos problemas que os guineenses têm enfrentado em Cabo-Verde é a situação da documentação, devido à falta de paciência em seguir as regras estabelecidas pelo governo de Cabo Verde, para a obtenção das documentações que lhes permitam a sua maior integração na sociedade local.
Dibane Dabo lamentou que tenha havido a falta de colaboração dos cidadãos nacionais ao longo deste processo, não obstante existir abertura por parte das autoridades cabo-verdianas no sentido de todos terem acesso aos documentos.
“Em Cabo-Verde existem regras.Para obter documentos é fundamental segui-las. Seguindo estas regras, num curto espaço de tempo você pode ter o acesso às documentações necessárias para o processo de regularização”, disse.
Segundo explicação de Dabo, ao chegar em Cabo Verde, três meses depois, o cidadão estrangeiro é obrigado a regularizar a sua situação de residência junto das autoridades, que num período de seis meses pode ter acesso a este documento que lhe permite sair da irregularidade. Depois desse passo, a obtenção do cartão de residência e a nacionalidade cabo-verdiana pode exigir uns cinco anos de permanência .
“As autoridades cabo-verdianos querem que todos os emigrantes residentes em Cabo-Verde estejam legais, com as respectivas documentações, mas a falta de colaboração levou a que muitos de emigrantes continuem numa situação irregular e viram bloqueadas a sua integração dentro da sociedade cabo-verdiano”, acrescentou.
Relativamente à renovação dos passaportes da Guiné-Bissau, o vice-presidente da Associação dos Cidadãos Estrangeiros da África Ocidental revelou que são obrigados a deslocarem-se à Ilha de Santiago à Praia, ou Mindelo, que ficam mais próximas do Santo Antão.
EMIGRANTE DENUNCIA QUE CIDADÃOS ESTRANGEIROS CIRCULAM COM PASSAPORTES DO PAÍS EM CABO VERDE
Questionado se é verdade que cidadãos de outros países circulam em Cabo Verde com documentos da Guiné-Bissau, Dabo que vive em Cabo Verde desde 2005, denunciou que muitos cidadãos de outras nacionalidades foram vistos a circularem com documentos do país no Arquipélago, tendo alertado as autoridades guineenses a tomarem medidas para pôr cobro a esta prática.
“Muitos cidadãos das outras nacionalidades obtiveram os documentos da Guiné-Bissau, circulam em vários países do mundo, mas ninguém é responsabilizado. O Estado deve assumir a sua responsabilidade para controlar esta prática. Eu, por exemplo, tenho passaporte de Cabo-Verde e em qualquer localidade que estiver não tenho problemas, porque consegui-o de forma legal, não é o caso da Guiné-Bissau”, indicou, lembrando que a Guiné-Bissau tem fronteiras terrestres com o Senegal e com a Guiné-Conacri, que permitem entradas fáceis dos cidadãos estrangeiros, razão pela qual é fundamental que o Estado guineense reforce a vigilância de modo a controlar a emissão dos documentos do país.
O vice-presidente da Associação dos Cidadãos Estrangeiros da África Ocidental, que vive juntamente com a sua mulher e o seu filho na Ilha do Santo Antão, transmitiu ao Democrata, que nunca teve problemas com a justiça cabo-verdiano, porque ”sempre trabalhou e respeitou as regras das autoridades de Cabo-Verde”.
Apesar da falta de vontade dos guineenses em regularizar os documentos, Dabó assegurou que não existem neste momento cidadãos guineenses detidos na Ilha do Santo Antão, principalmente detidos ligados ao tráfico de drogas. Segundo a sua explicação, os guineenses residentes nesta ilha focam bastante nas suas atividades de comércio.
Em relação à situação sócio política da Guiné-Bissau, assegurou que a comunidade local tem acompanhado com preocupação o que se passa no país e chamou atenção das autoridades no sentido de tirarem a nação guineense da situação em que se encontra há vários anos, evitando criar divisões entre guineenses, ódio e intrigas, mas sim trabalhar arduamente para alcançar a paz e a armonia almejadas.
“Hoje, na Guiné-Bissau, muitos jovens perderam a esperança, mas é devido à falta de vontade dos atores políticos do nosso país, que não têm trabalhado para criar as condições de emprego, permitindo a integração da juventude”, sublinhou e disse que não se arrependeu por ter emigrado para Cabo-Verde, tendo realçado os apoios que recebeu para sua afirmação naquele país com 10 ilhas.
Santo Antão é uma das nove ilhas habitadas de Cabo-Verde, localizada no grupo de Barlavento, a noroeste, e segunda maior ilha do arquipélago em superfície e a terceira em população, com aproximadamente 40 km de extensão longitudinal e cerca de 20 km de largura. De origem vulcânica, Santo Antão é a ilha mais setentrional e ocidental de Cabo Verde e a mais afastada do continente africano, pelo que o seu extremo oeste é considerado o ponto mais ocidental de África. O canal de São Vicente separa-a da ilha mais próxima, a ilha de São Vicente.
Segundo dados oficiais desta Associação dos Cidadãos Estrangeiros da África Ocidental, vivem neste momento na Ilha de Santo Antão mais de 40 cidadãos nacionais. Em 2022 cerca de 3.700 imigrantes em situação irregular em Cabo Verde candidataram-se ao programa de regularização extraordinária lançado pelo Governo em Janeiro do mesmo ano, sendo mais metade da Guiné-Bissau.
De acordo com estimativas anteriores da Embaixada da Guiné-Bissau na Praia, a comunidade guineense em Cabo Verde será superior a 10 mil pessoas, mas cerca de metade está em situação irregular, sem documentos.
Conforme a legislação aprovada no final de 2021, os cidadãos que requeiram a regularização extraordinária ficam isentos do processo contraordenacional que possa existir e, consequentemente, não serão aplicadas coimas.
O foco principal deste período de regularização extraordinária de imigrantes são cidadãos estrangeiros da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) e da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), mas cidadãos de qualquer outra nacionalidade também podem aceder a este processo de legalização.
A Comissão Nacional de Regularização Extraordinária aponta para 15.000 imigrantes africanos em situação de ilegalidade em Cabo Verde, a grande parte dos quais guineenses.
Por: Alison Cabral
Foto: AC
Conosaba/odemocratagb
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