As mulheres e crianças da aldeia ilha-Djobel, setor de São Domingos, região de Cacheu, pernoitam outrora nos tarrafes com bidões de água a bordo da piroga e exposto aos mosquitos.
Djobel é uma ilha localizada entre as aldeias de Elia, onde agora compram alguns produtos da primeira necessidade e a aldeia de Arame e este último é a aldeia mais próxima da pequena ilha-Djobel em termos de distância, mas nas últimas décadas as duas aldeias não se entendem, devido a disputa da posse de terra. O fato motivou a comunidade a procurar a água na aldeia de Djifungo, pelo menos uma hora ou mais de piroga sem motor, porque em Djobel a água está totalmente salinada.
Segundo a explicação de Isabel Nango, mãe de 10 filhos, com alguns fora de Djobel, por questão do estudo, na época da chuva as mulheres aproveitam a água através das suas engenheiras, no seu caso, em particular por ter residido próxima da escola e a única na aldeia com zinco, colocando bedões, baldes e bacias quando o tempo chove para reter a água dos fins domésticos.
“Temos mais problemas no período da seca, porque no período da chuva, se o tempo chove colocamos as bacias, bedões para reter a água, mas na época seca sobretudo nos meado de março a maio, deparamos com maiores, quem tem o bebe, coloca-o na costa com bediões ao bordo da piroga a remar até Djufungo, e ao chegar no Djufungo, tens que escavar para conseguir a água, não é que existe um poço para apanhar a água e no dia em que há agitação do tempo, tens que pernoitar nas tarrafes, como eu que está próximo da escola, se tempo chove coloco os bedões, baldes e bacias, as outras que estão distante, são obrigados a comprar uma ou duas folhas de zinco um lona plástico para conseguir a água da chuva”, explica Isabel Nango, para de seguida afirmar que “as mulheres procuram a água para casa porque é uma obrigação”, questionado se alguma vez pernoitou nas tarrafes, Nango confirma que “sim, não só uma vez e ainda com mosquito, mas como não temos como fazer, somos obrigados a correr esses riscos, só que agora com a piroga que (o IBAP) nos ofereceram, o risco diminuiu, porque compramos o combustível”.
A situação melhorou nos últimos tempos, graças a um apoio do IBAP (Instituto da Biodiversidade e das Áreas Protegidas), que ofereceu à comunidade, uma piroga metal de motor, reduzindo agora o esforço das mulheres na procura da água. Segundo o que apuramos no local, no âmbito de uma visita de campo de um grupo de jornalistas, organizado pela ONG Palmeirinha, através do projeto “Terra África”, com esta piroga metal de motor, as comunidades pagam um soma em dinheiro para compra de combustível, segundo as mesmas, mensalmente a piroga consome 160 litros de combustível, feitas as contas, são 140 mil e 602 francos cfa, para uma comunidade pobre e em constante ameaças de inundações.
Para irem à escola as crianças que residem em Caché, se deslocam com a piroga de remo, com apoio dos adultos. Na época chuvosa ficam privadas algumas vezes de aulas, por causa de ventos fortes.
Perante esta situação, Isabel Nango, sonha abandonar a ilha-Djobel, com a ajuda do estado.
“Sonhamos abandonar aqui, mas com ajuda do estado só que todos os dias nos dizem espera, espera, mas nada, aqui não podemos sair da caso todos deixar só as crianças, porque quando houve maré alta, pode voltar e encontrar a criança morta na água, já estamos farto de aqui, mas não temos como fazer, por exemplo, há anos atrás uma criança que veio passar as férias morreu devido a maré alta aqui”.
A ilha é constituída por cerca de 50 casas, construídas de arquitetura tradicional, habitadas por aproximadamente 250 pessoas, na sua maioria idosas e crianças, os adolescentes e jovens com a idade escolar quase na sua totalidade voltam à aldeia só no período das férias. A aldeia é também dividida em dois bairros nomeadamente: Burré e Caché, este último tem o maior número de casas e é onde reside o chefe da tabanca. O Burré é o local onde está construída a única escola do ensino básico com duas turmas, funciona em dois períodos, com um único professor, filho do chefe da tabanca, que depois de concluir o 12º ano da escolaridade decide voltar à aldeia para ajudar os mais pequenos. De acordo com os relatos, as crianças da ilha de Djobel, não beneficiam dos géneros da Cantina Escolar, no recreio não tem nada para comer a não ser o que trazerem da casa, na escola, leciona os alunos da 1ª a 3ª classe, na sua maioria meninas. Quem concluir a 3ª classe é obrigado a abandonar a aldeia ou desistir de estudar se não tem família em Suzana, São Domingos ou outras cidades do país. O bairro de Burré é o local onde fazem também o habitual ritual de fanado 'circuncisão', por ter mais espaço de terra.
As principais atividades para sobrevivência na ilha-Djobel, é a agricultura, pesca e extração dos mariscos e que depois são vendidas nas feiras populares 'Lumo' pelas mulheres.
As atividades de extração dos mariscos, são feitas pelas mulheres segundo a narração da porta-voz das mulheres de Djobel, Isabel Nango, para poder apoiar o marido no sustento da família.
“Principal atividade sobretudo para nós, mulheres é a extração da ostra e camarão, para garantir o sustento da família, como está a ver, aqui não há frutas, a única forma é esta atividade e os homens praticam a pesca e agricultura”.
Em Djobel não há plantações tanto de mango como de caju, maior produto agrícola de exportação na Guiné-Bissau. Ou seja, nesta localidade não há frutas para o consumo, todos que se consomem são comprados nas feiras populares.
A situação da ilha para quem conhece é deplorável, segundo o especialista em alterações climáticas e políticas de desenvolvimento sustentável, Morto Baiem Fandé, em um dos seus artigos de opinião, a retirada é a opção prioritária, uma vez que a proteção e a acomodação continuariam a colocar a população em risco de vida.
A situação deplorável de Djobel é relatada pelas mesmas, segundo o cometé da Ilha, Baciro Nango é preciso um envolvimento sério das autoridades porque daqui a alguns anos o espaço pode desaparecer, por causa da água.
“Nós aqui, não temos outra maneira de fazer, por isso que queríamos abandonar o espaço com a ajuda do estado para nos povoar num outro sítio, mesmo não tendo espaço para lavoura, podemos continuar a cultivar o arroz aqui, mas o Estado, como sabem nós temos um espaço em Aramé que é nosso e, como vimos que aqui em Djobel a água está a consumir a terra fomos procurar o espaço mas vimos que a maioria das pessoas de Arrame ocuparam o local, e nos dizem que nós já não temos nada naquele espaço, por isso que o assunto chegou ao estado, mas só que o estado não está a fazer nada, ficaram sempre em favor de Arrame, e nós somos guineenses, e votamos em todas as eleições, o estado tem que nos prestar a atenção, não podemos continuar a viver em Djobel, eu pode dizer que, daqui a cinco anos não vai encontrar ninguém aqui, porque os jovens sempre estão em fuga e a água está a ocupar o espaço cada vez mais”
A aldeia é inundada durante marés de águas vivas, afetando negativamente a habitação, agricultura, deslocamento de pessoas e bens. Destas situações, espera-se ainda que piores poderão ocorrer nas próximas décadas, uma vez que projeções indicam que a subida do nível médio global do mar e do nível relativo do mar na África Ocidental deverão continuar durante o Século XXI, mesmo que seja cumprido integralmente o Acordo de Paris (2015), que propõe manter a temperatura média global até 2100 entre 1,5 e 2 ºC acima dos níveis pré-industriais.
No período da chuva, a questão da inundação é mais frequente nas casas, como a solução para fazer face à situação, uma vez que a questão dos seus reassentamento não é uma realidade por enquanto, a comunidade segundo a explicação de Nango, redobraram esforços nos últimos anos nas plantações de tarrafes.
“Na época chuvosa há constantes inundações, com a chuva e maré alta, as inundações outrora atingem as nossas casas, por isso, decidimos plantar os tarrafes como forma de nos proteger dos mares altos, porque o estado não importa de nós”.
Um estudo recente indicou que Djobel poderá ficar totalmente submersa nas próximas décadas e que outras aldeias localizadas na mesma região também deverão passar por situações similares.
Em 2019, a antiga ministra da Administração Territorial concedeu um terreno aos populares de Djobel e que depois desembocou num confronto armado resultando em mortos e vários feridos. Segundo explica ao “Jornal O Democrata”, o comité da aldeia da Arame, Moimo Sanhá, “os populares de Djobel não se limitaram apenas a limpar o espaço concedido, mas foram para além do limite e derrubaram os pomares de caju das pessoas com o propósito de aproveitar mais espaço”.
Agora, segundo a porta-voz das mulheres de Djobel, Isabel Nango, a situação de conflito sobre posse de terra coloca as mulheres num dilema grande quando estão grávidas e precisam de atendimento médico.
“Dantes quem estava grávida, faz controlo médico em Suzana, porque é mais próximo daqui, mas agora como estamos em conflito com Arame, procuramos atendimento em São Domingos, porque ninguém tem a ousadia de ir pegar o transporte misto em Arame para Suzana, mesmo de motorizada. Agora fazemos o controlo em São Domingos via marítimo, porque estamos com medo de nos agredir”, denúnciou.
Ficou evidente que o processo de retirada da população de Djobel será muito caro e complexo. Será necessária uma intervenção ativa do Governo e de outras entidades para suportá-lo, já que a própria comunidade não teria capacidade para tal devido à falta de mão-de-obra e falta de recursos financeiros.
Por: Braima Sigá/radiosolmansi com Conosaba do Porto
Reportagem no âmbito do projeto “Terra Africa”, da Agência francesa de Desenvolvimento dos Media – CFI
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