quarta-feira, 6 de janeiro de 2021

“Guiné-Bissau voltou a ter voz no concerto das nações”

 

Diz Umaro Sissoco Embaló  em balanço de dez meses de mandato

No seu encontro com os jornalistas no final do ano de 2020, o Presidente da República, o General Umaro Sisso Embaló, fez um balanço positivo da evolução da Guiné-Bissau nos últimos dez meses, que marcaram o início do seu mandato.

O Chefe de Estado destacou no seu longo improviso o facto de a Guiné-Bissau voltar a ter voz no concerto das nações, a abertura do país aos parceiros internacionais, a reestruturação em curso a nível das embaixadas guineenses no exterior e abertura de novas representações diplomáticas, a agressividade positiva da sua diplomacia económica, o reestabelecimento da confiança internacional do país e na parte de perguntas, o Presidente Sissoco Embaló respondeu demoradamente diversas questões levantadas pelos jornalistas concernentes aos assuntos correntes da vida do país, sobretudo os problemas ligados ao posse da terra, a separação de poderes, a funcionalidade da justiça, entre outros. Eis a explanação proferida:   

“Estamos no final do ano que é também marcado como um ano depois das eleições presidenciais de 2019. Em 2019-2020 o mundo foi também marcado com uma pandemia que ceifou a vida de muita gente, em geral e, em particular na Guiné-Bissau.

Depois de assumir a Presidência da República, passados alguns meses, hoje posso dizer-vos que todos os guineenses estão de parabéns. Se analisarmos a nossa política externa, isto é, como nos vê o mundo, hoje, demos um passo importante. Por exemplo, já não temos o UNIOGBIS, que se instalou no país durante 21 anos e com envio alternado de 10 representantes do Secretário-Geral da ONU.

Concerto das nações

Não foi fácil convencer o mundo de que podemos andar com os nossos próprios pés. Significa que tínhamos que ter um líder chip forte. Hoje, não temos também a ECOMIB (Força de interposição da CEDEAO), que esteve cá desde 2012 para nos ajudar garantir a paz e restabelecer a normalidade constitucional.

Em 2021 vamos preparar missões militares para irmos ajudar os nossos irmãos nos diferentes países do mundo. Isto significa que demos um passo muito importante e daí estamos a ter felicitações de toda a comunidade internacional, particularmente de todos os países europeus, digo, as primeiras potências europeias. O nosso relacionamento com os nossos amigos tradicionais, nomeadamente com Portugal, União Europeia (UE), China, Rússia, EUA está no ponto mais alto, facto que não tínhamos há muitos anos. Isto significa que a Guiné-Bissau voltou para o concerto das nações.

A partir de janeiro de 2021, a Guiné-Bissau vai ter representante num dos 15 países da CEDEAO. Trata-se de uma inovação a que ontem ninguém falava. A nível da organização sub-regional, a Guiné-Bissau era visto com desprezo e se tratava quase “sob tutela”. Mas, entendemos que a Guiné-Bissau tem que ter voz no concerto das nações e vamos ter que indigitar o segundo vice-presidente do BOAD (Banco Oeste Africano de Desenvolvimento), em pouco espaço de tempo. Quer dizer, antes de um ano, com o Presidente Umaro Sissoco Embalo, a Guiné-Bissau está em paz.

Quando tivermos um cidadão guineense, representante da CEDEAO no Senegal ou no Gana ou no Benin, não é Umaro Sissoco Embaló, mas sim, aquele representante é da Guiné-Bissau. Há mais de 20 anos que não tínhamos voz na sede da União Africana (UA), porque não pagávamos as quotas. Nenhum dirigente guineense discursava na cimeira da UA. Faziam apenas os contatos bilaterais. Eu, enquanto Presidente da Guiné-Bissau, no dia em que for para a cimeira da UA, vou discursar lá. Significa que nós pagamos as quotas e as nossas sanções foram levantadas.

Graças a nossa diplomacia, conseguimos pagar a nossa dívida junto da UA no valor de 650 mil dólares. Isto permitiu-nos levantar as sanções a que fomos aplicados. A partir de já os guineenses vão ter orgulho. Fizemo-lo e não nos custou nenhum franco CFA no nosso tesouro público. Fizemo-lo com a nossa diplomacia. Marrocos, por exemplo, participou com cem por cento do valor. Não é a primeira vez que Marrocos nos faz isto. A Líbia fez-nos isto várias vezes. Enquanto for Presidente da República, vamos ter voz, tanto nas Nações Unidas, como na CEDEAO, UA, CPLP, em todas as organizações internacionais e os guineenses estarão bem representados.

Quando um guineense vai ser representante, ele tem que saber de que terá que levar um outro guineense. Temos várias competências. Eu não sou o melhor, que por isso fui eleito PR, mas sim, o povo depositou confiança em mim. Tenho que prova-lo de que o que faz o melhor é a ação.

Neste momento, abrimos algumas representações diplomáticas, nomeadamente em Qatar, Turquia e brevemente vai ser na Arábia Saudita e nos Emirados Árabes Unidos. Mas eles também virão cá. Em 2021, Cabo Verde vai abrir embaixada na Guiné-Bissau e vou receber a visita do Presidente cabo-verdiano. A Guiné-Bissau vai ter no mínimo 15 a 20 embaixadas. Isto é muito importante, para além de que vamos ter mão-de-obra. Até os nos amigos tradicionais, nomeadamente Egito e Argélia já foram embora. Nos países em que temos embaixadas se eles não estão cá vou fechar a embaixada. O embaixador é a minha voz junto de lá e o presidente daquele país tem que ter a sua voz junto de mim. Com os EUA estamos a conversar para regressarem, porque temos a China, a Rússia e a França. O único membro permanente das NU que não temos aqui é os EUA, como é óbvio não temos embaixador em Washington. O embaixador Fernando Delfim estava a representar a Guiné-Bissau nas NU e foi substituído pelo embaixador Henrique Silva. Este agora vai cobrir ONU e EUA. Isto vai na lógica de que não há Estado pequenino, há sim Estado, economicamente, mais forte. Na votação é sempre um país, um voto.

Abertura aos parceiros

Com a Turquia estamos a ver a possibilidade de trazer a sua grande empresa, a Suma, que fez o aeroporto do Senegal e vários outros, para nos reativar o aeroporto Osvaldo Vieira. Eu gosto de jogar não a esperteza, mas sim a inteligência. Quero que nos trazem Turcos Airline, Royal Maroc, South African Airline, que venham cá e passam para os EUA. Por mais que tornarmos o nosso aeroporto competitivo é melhor.

A 1 de fevereiro, Senegal Airline passará a fazer quatro-cinco voos semanais. Eu faço isso em sintonia com o Governo. O primeiro diplomata do país é o Presidente da República; o primeiro mobilizador de fundos é o PR, porque é ele quem representa o país dentro e fora.

No domínio militar, segurança e aviação civil, temos em plano a construção de várias escolas em 2021. Isto nos servirá para termos escolas para sargentos, oficiais subalternos e oficiais superiores. Temos quadros capacitados tanto no Ministério de Defesa, como no Interior para termos escolas desse nível. Assim teremos possibilidades de criar forças armadas republicanas. É o militar quem faz para que a sociedade goste dele e não ao contrário. O militar faz parte da sociedade e não é a sociedade que faz parte do militar.

Com Portugal temos excelentes relações. Praticamente não há semana alguma que não troquei mensagens com o Primeiro-Ministro ou com o Presidente português. Telefonamos um a outro quando é necessário tratarmos questões de interesse comum entre os nossos dois países. E Portugal está a ser hoje a nossa porta de entrada junto da UE, e não só. Eles nos dizem, em todo o lado que vocês precisarem, podemos colocar os nossos amigos à nossa disposição. E nós também passamos a ser a porta de entrada de Portugal junto da CEDEAO.

No dia 28 de dezembro recebi o secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros da França, porque a próxima vez que o Presidente da França visitará a sub-região, ele efetuará uma visita a Guiné-Bissau. Mas antes, vamos receber a visita do Presidente da República Portuguesa. O Primeiro-Ministro português devia vir, mas dado o seu contato com o Presidente da França que foi diagnosticado positivo do novo coronavírus, isto impediu a sua deslocação. Não seremos nós os únicos a deslocar para outros países, os outros também virão visitar-nos para partilharmos com eles aquilo que temos.

Reestruturação de embaixadas

Pela primeira vez, temos o regulamento consular, a movimentação e reestruturação nas nossas embaixadas. Isto significa que dantes nomeava-se o pessoal diplomático e os embaixadores não vinham para a Guiné-Bissau. Agora não é assim. O princípio de rotatividade tem de funcionar e condições serão criadas para que os diplomatas representem a Guiné-Bissau com dignidade e sem corrupção.

Dantes, os embaixadores da Guiné-Bissau para viajarem pediam boleia. Quer dizer a soberania da Guiné-Bissau estava na soberania e na bandeira de outros países. Agora temos dinheiro para comprar carros para os embaixadores. Hoje, estamos a reabilitar todas as residências oficiais da Guiné-Bissau que estão fora. Outras eram abandonadas. Isto é só para vos mostrar que o Presidente da República segue a par e passo as missões diplomáticas. Portanto, um Presidente muito interventivo.

Há pessoas que andam a criticar de que o Presidente é executivo, sim, porque a nossa constituição diz que o nosso regime é semipresidencialista. O Presidente da República está sempre no Conselho de Ministros. A nossa Constituição diz que o Presidente da Republica pode presidir o Conselho de Ministro quando o entender. Significa que posso presidi-lo todos os dias, se assim o entender. O Governo é responsável junto do Presidente da República que o nomeia e do parlamento que o controla. Quando houver essa simbiose entre estes três órgãos de soberania, o país anda. Essa é a melhor via para funcionarmos.

Diplomacia económica

Hoje, temos uma relação de grande confiança com os nossos parceiros. Temos quase 50 por cento de conclusão com o Fundo Monetário Internacional (FMI). Em breve vamos ter um programa com essa instituição financeira, estimado em cerca de 20 milhões de dólares americanos. Temos um acordo com o Fundo Africano de Garantia de Crédito (FAGAC). Esta organização traz o dinheiro, deposita-o nos bancos comerciais para emprestar empresários sérios.

Estive na cerimónia de investidura do Presidente Alassane Quattará, na Costa do Marfim, onde recebi em audiência o presidente do Banco Africano de Desenvolvimento (BAD) com quem falei e essa instituição vai financiar a Guiné-Bissau o alcatroamento de 300 quilómetros de estrada. Isto vai nos permitir mudar a vista parcial do país. Contamos com a influência dos quadros do Senegal que estão no Banco Mundial e no FMI, independentemente da gestão rigorosa que temos neste momento no Ministério das Finanças. Tudo que é pago eu tenho que saber através do ministro. Ele me informa com o PM os pagamentos a serem efetuados. É por essa razão que nós pagamos os salários da Função Pública no dia 15 de dezembro. Não vamos ficar só em Pagar salários. Temos que ter escola, boa saúde. Por isso, em 2021, temos que ter um hospital de referência para evitarmos ir a Dacar ou para Portugal. Em muitos casos, a questão é de ter uma infraestrutura e forma de gerir também.

No próximo ano, o BAD vai nos dar um apoio orçamental no valor de 12 milhões de dólares. Na negociação com o Banco Árabe para o Desenvolvimento Económico de África (BADEA) esta instituição aprovou na sua carteira 80 quilómetros de estrada alcatroada. Quer dizer, aos poucos vamos acabar de alcatroar as grandes estradas de ligação da Guiné-Bissau. Quando recebi o presidente do BAD, ele me informou que em 2021 a sua instituição vai iniciar as estradas regionais, por exemplo, a que faz ligação entre Senegal e Farim. Vamos, a nível interno, fazer a ligação com as estradas transfronteiriças e mesmo a estrada de Nhacra-Jugudul.

Já temos a obtenção de apoio do BOAD no valor de 22 mil milhões de francos CFA; temos uma contratação de empréstimo junto do Banco Islâmico de Desenvolvimento (BID) para aquisição de medicamentos e equipamentos para o combate ao COVID-19; temos a obtenção de financiamento de 15 milhões de dólares americanos junto do Banco Mundial (BM) para apoio de urgência a produção agrária. Tudo isto é a credibilidade que o nosso país está a ter aos poucos.

Restabelecimento de confiança

Em 2021 vamos chegar onde todos os filhos da Guiné-Bissau querem. Haverá o restabelecimento de confiança entre a Guiné-Bissau e os seus parceiros bilaterais e multilaterais. Muitos dos nossos parceiros, inclusive da CEDEAO nos perguntam como é que estamos com Portugal. Se respondermos que a nossa relação não está boa eles ficam frio conosco. Se Portugal disser temos que apoiar a Guiné-Bissau, então nada pode falhar. Espanha já nos disse isso.

Eu devia efetuar uma visita oficial à Espanha, em dezembro, mas que foi adiada para 2021. A preparação da minha visita oficial a Bruxelas e ao parlamento europeu está em curso. Assim sendo, os guineenses podem constatar a dinâmica da nossa diplomacia.

Na área agrícola, podemos dizer que no ano transato tivemos uma boa colheita, independentemente da covid-19. Trouxemos sementes e Senegal nos apoiou com cerca de dois milhões de dólares. Isto significa que estamos a apoiar o setor agrícola. Estamos a procura de financiamentos junto do BM, BAD, FIDA (Fundo Internacional para o Desenvolvimento Agrícola), BID, Kuwait Fund, BADEA e BOAD. Arábia Saudita e Kuwait Fund estão disponíveis para nos apoiar, independentemente de estarem prontos para abrir as suas representações diplomáticas na Guiné-Bissau. Marrocos quer um terreno para a construção da sua representação diplomática em Bissau.

Em relação à Comunicação Social, reforçamos as infraestruturas dos órgãos públicos, nomeadamente a Televisão da Guiné-Bissau (TGB) e a Radiodifusão Nacional (RDN). A situação está a mudar nestes órgãos.

Também, estamos a acompanhar as nossas forças de defesa e segurança pela forma como estão a garantir a segurança do país.

Aquando da sua visita à Bissau, falei com o Presidente da Mauritânia sobre a situação das minhas viaturas e ele ao regressar para o seu país resolveu mandar-me os novos carros com a Polícia do Ministério do Interior está a patrulhar a capital para garantir a nossa segurança.

Caros jornalistas, estas são as grandes linhas. Agora, estou ao vosso dispor para responder as vossas perguntas”.

Perguntas e respostas

Após a explanação do Chefe de Estado, os jornalistas pediram esclarecimentos sobre vários assuntos, dos quais, as obras relativas aos aeroportos Osvaldo Vieira e a construção prevista do novo aeroporto, a relação Guiné-Bissau/China, o problema da posse de terra que já fez vítimas mortais, a luta contra a corrupção, o exílio de Aristides Gomes nas Nações Unidas, a questão de regresso do Domingos Simões Pereira que tem mandato de captura internacional, a solicitada audição pela Justiça do Primeiro-Ministro Nuno Gomes Nabiam sobre corte ilegal da madeira, a manutenção da paz com chefias militares em sanções, entre outros.

O Presidente Umaro Sissoco Embaló respondeu que nas suas diligências com a Turquia, aquele país tem uma grande empresa, a Suma, que vai reabilitar o aeroporto internacional Osvaldo Vieira, para que este possa receber aviões de grande porte, podendo estabelecer a ligação aérea entre a Guiné-Bissau e outros grandes aeroportos do mundo.

Na matéria de cooperação, Sissoco Embaló esclareceu que a relação com a China está em alto patamar, e nesse seu mandato, aquele país asiático está determinado em construir dois novos ministérios, nomeadamente o de Defesa e do Interior. Ainda nessa matéria, o Chefe de Estado afirmou que em 2021 vão ser realizadas obras de construção de escolas para as áreas de Defesa e Segurança que irão permitir a formação dos militares e polícias. No que se refere à Guiné-Conacri, ele defendeu que a relação desse país com a Guiné-Bissau ultrapassa de longe a sua pessoa. Portanto, são países irmãos cujas relações não dependem de Umaro Sissoco Embaló ou do Presidente Alpha Condé.  

No que concerne ao combate à corrupção, o Presidente anunciou que a Política Judiciária, como detentora dessa missão, está mais reforçada como instituição de ação interventiva e de investigação criminal, mas, também, o próprio Presidente da República está a ponderar a criação de uma agência de ética ou de anticorrupção que terá como missão principal a moralização da sociedade guineense.

No que concerne aos exilados, Umaro Sissoco Embaló confessou aos jornalistas que em nenhuma circunstância mandou prender Aristides Gomes e Domingos Simões Pereira. Ele defende que a separação de poderes existe e cabe a Justiça fazer o seu trabalho. Nessa linha de ação, o Chefe de Estado anunciou que não permitirá a perseguição política a nenhum guineense.

No que toca as grandes obras previstas no país, o Presidente Sissoco revelou que finalmente o país vai conseguir realizar a dragagem do porto de Bissau em 2021, por intermédio de Marrocos. E as obras de reconstrução de estradas que estão em curso em Bissau, estas são suportadas por Macky Sall, Muhammadu Buahari e Denis Sasso N´Guesso, que ostenta nomes de três ruas. “Eles suportam o alcatroamento, a construção dos passeios e a iluminação solar. As obras que serão suportadas por BADEA e BAD (380 Km) estas serão financiadas ao país e serão executadas por concurso internacional.

No que respeita ao problema de posse de terra que já vêm fazer vítimas mortais, o Chefe de Estado manifestou-se determinado em acionar medidas para que esse problema seja discutido com o Governo logo nos inícios de 2021 e seja resolvido.

Sobre as missões militares de manutenção da paz, o General Sissoco Embaló disse que o país vai preparar o seu contingente em temos de qualificação. Ele absteve de se pronunciou sobre as sanções das chefias. “As chefias militares não fazem manutenção da paz, eles simplesmente preparam o contingente”, salientou.

Na pergunta sobre a nova Constituição da República, o Chefe de Estado esclareceu a imprensa de que a comissão que ele nomeou introduziu algumas inovações que são a criação de um Tribunal Constitucional, uma Comissão Económica e uma Comissão de Meio Ambiente. Nessa linha de ação, entre a Comissão de Revisão criada pela ANP e a sua comissão pode-se apenas harmonizar as correções.

Texto: Bacar Baldé

Fotos: José Djú

Conosaba/nô pintcha


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