sexta-feira, 7 de fevereiro de 2025

Juristas questionam decreto do Supremo guineense estipulando que PR termina mandato em Setembro


Presidente guineense Umaro Sissoco Embaló. © AFP - LUDOVIC MARIN

Nas vestes do Tribunal Constitucional, o Supremo Tribunal de Justiça confirmou nesta quarta-feira ter decretado que o mandato do Presidente guineense termina a 4 de Setembro de 2025. O despacho do supremo com data do 3 de Fevereiro, surge numa altura em que tem havido um intenso debate sobre a data efectiva do fim do mandato presidencial. Contudo de acordo com dois juristas guineenses ouvidos pela RFI, esta decisão "é inexistente e não se enquadra no ordenamento jurídico guineense".

Em entrevista à RFI, os juristas guineenses Marcelino Intupe e Luís Peti consideram, que "não existem consequências jurídicas" da decisão do Supremo Tribunal de Justiça.

Do ponto de vista do advogado Marcelino Intupe, o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça simplesmente prorrogou o mandato do chefe de Estado guineense, o que significa que está a prorrogar também o seu próprio mandato. Algo que "não é aceitável do ponto de vista Constitucional", diz o jurista.

"Não existe nenhuma consequência jurídica. O Presidente do Supremo Tribunal de Justiça prorrogou o mandato do Presidente da República. Também implicitamente, está a prorrogar o mandato dele, está a ver, esta que é a situação. O que não é aceitável do ponto de vista Constitucional. A constituição é clara, o mandato do Presidente da República tem a duração de cinco anos. A lei eleitoral no Artigo 182, diz assim 'o término do mandato do Presidente da República começa na data de tomada de posse do seu sucessor ', ou seja no dia 27, ou seja na tomada de posse do novo Presidente da República. E neste momento devíamos estar a preparar a tomada de posse do novo Presidente da República", vinca Marcelino Intupe.

No mesmo sentido, o também jurista e advogado, Luís Peti, afirma que "esta decisão é inexistente e não se enquadra no ordenamento jurídico guineense".

Para nós é uma situação que não se enquadra e é inexistente, digamos assim. Não tem nenhum enquadramento e muito menos pode ser aplicado no sistema judicial guineense. É lamentável ver o Supremo Tribunal de Justiça de um país num Estado de direito a ter este tipo de pronunciamento, até por sinal foi a solicitação da ala do regime que solicitou o Supremo Tribunal de Justiça a ter este pronunciamento em relação ao fim do mandato do actual Presidente da República. É estranho. Porquê? Porque nunca se viu no sistema judicial guineense o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça dar um pronunciamento por acórdão em relação ao mandato do Presidente da República. Não é a matéria que está em causa mas, sim, é o próprio pronunciamento do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça. O acórdão tem que ser feito pelo colectivo de juízes, como se sabe, e ele faz este pronunciamento e denomina-o de acórdão. é estranho, que tenha ele sozinho assinado o tal acórdão. Se fosse acórdão, ao menos teria sido rubricado por três juízes que compõem o colectivo. Mesmo sendo um juiz votando contra, ter-se-ia pronunciado. Ou seja, deu voto vencido, argumentando as razões da sua não anuência ao tal acórdão", explicou Luís Peti.

Recorde-se que o Supremo Tribunal de Justiça confirmou ontem que o mandato do Presidente da República, Umaro Sissoco Embaló, termina a 4 de Setembro deste ano e que só cessa funções com a tomada de posse do seu sucessor. O despacho emitido a 3 de Fevereiro, surge na sequência de um requerimento do Partido Republicano da Independência para o Desenvolvimento (PRID), formação que integra a Plataforma Republicano "NÔ CUMPU GUINÉ" (Construímos a Guiné-Bissau) que apoia o Presidente Umaro Sissoco Embaló.

O Presidente do PRID recorreu recentemente ao Supremo Tribunal, para este se pronunciar na qualidade do Tribunal Constitucional, sobre o fim efectivo do mandato do Presidente da República, assunto que tem sido motivo de intenso debate político, com certos sectores políticos a afirmarem que o mandato de Umaro Sissoco Embaló termina no final deste mês de Fevereiro, de acordo com a lei.

No passado dia 3 de Fevereiro, o Bastonário da Ordem dos Advogados disse ter sido alvo de ameaças juntamente com a sua família, após ter considerado publicamente que o mandato presidencial deveria terminar na data do quinto aniversário da posse do Presidente Embaló.

Declarado vencedor pela Comissão Nacional de Eleições (CNE), e apesar de o Supremo Tribunal não ter então dado nenhum parecer sobre as contestações interpostas pelos seus adversários políticos, Umaro Sissoco Embaló tomou posse numa cerimónia simbólica, numa unidade hoteleira de Bissau, a 27 de Fevereiro de 2020.

O Supremo Tribunal acabou por dar o seu parecer e confirmar a vitória eleitoral de Umaro Sissoco Embaló, vários meses depois, a 4 de Setembro de 2020.

Esta data é considerada pelo campo de Umaro Sissoco Embaló como sendo o marco de referência para contar os cinco anos de mandato presidencial.

Refira-se ainda que recentemente, o governo guineense anunciou a sua intenção de propôr que as eleições legislativas e presidenciais se realizem em simultâneo, no período compreendido entre 23 de Outubro e 25 de Novembro, altura prevista por lei para a realização de eleições no país, depois de terem sido canceladas as legislativas inicialmente previstas a 24 de Novembro de 2024.

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