segunda-feira, 3 de janeiro de 2022

COMITE APRENSIVO COM SITUAÇÃO DA EXCISÃO FEMININA E RELUV REVELA AUMENTO DE VIOLÊNCIA NO PAÍS



O Comité Nacional para o Abandono das Práticas Tradicionais Nefastas à Saúde da Mulher e da Criança (CNAPN) está apreensivo com a situação da excisão feminina que, de acordo com a presidente daquela organização, continua a ser uma “triste realidade” na Guiné-Bissau, enquanto prática secular. A Rede Nacional de Luta contra a Violência baseada no género e crianças na Guiné-Bissau revela aumento de casos da violência baseada no género, que este ano registou oficialmente duzentos e cinquenta e dois (252) caso em todo o país.

O Democrata ouviu essa semana as responsáveis das organizações não-governamentais que estão a desenvolver lutas nos seus respetivos setores em defesa dos direitos das crianças e das mulheres, como camadas mais vulneráveis da nossa sociedade. Trata-se de Marliatu Djaló Condé, que assumiu a liderança este ano do CNAPN, uma organização que zela pela erradicação da excisão feminina no país e Aissatú Camará Injai, que há vários anos lidera uma ferrenha luta contra a violência das mulheres, em particular a violência baseada no género, através da organização (RENLUV).

COMITÉ DEFINE NOVAS ESTRATÉGIAS PARA ERRADICAR A EXCISÃO FEMININA NO PAÍS

A presidente do CNAPN destacou três elementos como fatores de resistência, nomeadamente: cultural, religioso e aplicação da lei que criminaliza a prática em vigor desde 2011.

“É inaceitável que desde 2011 que a lei entrou em vigor tenham sido julgados apenas cinco casos, no universo de cerca de vinte já apresentados ao Ministério Público”, criticou e disse que a maior parte desses casos não chegou a ser levada à justiça para julgamento e dos poucos levados, apenas um foi julgado e condenado com pena efetiva “de resto penas suspensas”.

Marliatu Djaló Condé revelou que nos últimos anos, o Comité tem trabalhado nas campanhas de comunicação, através de programas radiofónicos, para a mudança de mentalidade para poder atingir zonas onde fisicamente ou as estruturas do Comité não têm conseguido chegar e nas campanhas virtuais nas redes sociais.

Apesar de os dados divulgados no meio de 2020 mostrarem prevalência e o aumento de casos da mutilação genital na Guiné-Bissau em relação a últimos estudos realizados e algumas controvérsias encontradas no terreno à volta da prática, a presidente do Comité Nacional para o Abandono das Práticas Tradicionais Nefastas à Saúde da Mulher e da Criança (CNAPN) disse ter assumido um ano positivo de realizações.

“Apesar de algumas controvérsias, estamos otimistas porque temos trabalhado com maior engajamento das comunidades, com declarações públicas de abandono às práticas nefastas feitas nos últimos meses por mais de cinquenta comunidades”, sublinhou.

Em relação às perspetivas, a presidente indicou que o CNAPN iniciou, no último trimestre, um trabalho de revisão de todos os manuais que a organização tem para que em 2022 comece com todos os elementos e as novas estratégias de sensibilização necessários, porque “talvez as estratégias com as quais temos trabalhado não tenham funcionado bem”.

Questionada sobre o nível de abandono escolar de raparigas em idade escolar, a presidente do Comité não precisou os dados exatos, mas disse que zonas com maior prevalência de casamentos infantis e precoces são as que têm maior números de casos, nomeadamente, as regiões de Bafatá, Gabú e Oio.

RENLUV DIZ QUE A MÉDIA DE DENÚNCIAS DE VIOLÊNCIA OSCILA DE 8 A 15 CASOS DIÁRIOS.
A presidente da direção executiva da Rede Nacional de Luta contra a Violência baseada no género e crianças na Guiné-Bissau (RENLUV), Aissatu Camará Injai, revelou que a rede registou oficialmente duzentos e cinquenta e dois (252) casos de violência em todo o país em 2021.

“Mas isso não significa que sejam os únicos casos, porque muitos cidadãos ainda não têm a cultura de denunciar casos de violência no seio familiar e nas comunidades”, esclareceu e disse que a média de casos denunciados está entre 8 a 15 diários.

Aissatu Camará Injai disse que a zona com maior número de registo de denúncias é o Setor Autónomo Bissau (SAB), por ter pessoas com a noção de o que é violência e os direitos humanos.

A ativista frisou que o segundo estudo realizado em finais de 2018 pela RENLUV sobre situação e tipologia de violência contra mulheres e raparigas na Guiné-Bissau, Bissau surge na primeira posição com 19.287 casos, Bafatá tem 1.107, Tombali segue com a marca de 348, Cacheu registou 690 casos, Biombo 576, Gabú 569, Oio 492, Quinara 393 e Bolama com 223 casos.

“Esses dados revelam que a média de denúncia de casos de violência na Guiné-Bissau situa-se entre 8 a 15 casos diários, significando que nem todos casos são denunciados e todos os que foram denunciados foram encaminhados à justiça”, disse.

Aissatu Camará Injai informou que só em 2021, a RENLUV entregou 5 casos ao Centro de Acesso à Justiça (CAJ), 180 à Polícia da Ordem Pública (POP), 13 ao Ministério Público (MP), 47 à Polícia Judiciária (PJ) e 07 ao Tribunal.

Segundo a ativista, dos sete casos que o tribunal recebeu, resolveu 5, o MP solucionou 08 dos 13, a PJ dirimiu 40 e, a POP mediou cerca de cem casos, enviou 40 ao MP e os processo de outros 40 casos não tiveram continuidade porque também não eram casos graves e o CAJ conseguiu dar aconselhamento a todos os cinco casos.

Em relação a tipos de violência frequentes nas famílias e nas comunidades, Camará Injai destacou as psicológica, física e sexual.

Em termos de perspetivas, a ativista disse que em 2022, a rede centrar-se-á na prevenção de violências e sensibilização a todos os níveis e na divulgação das leis que existem e criminalizam tais ações, bem como trabalhará para que a justiça seja célere e garantir que os cidadãos não façam justiça privada.

Quanto às melhorias registadas, sublinhou o número de casos de denúncias de atos de violência registados na Guiné-Bissau em 2021.

Aissatu Camará Injai lamentou que, apesar dos esforços feitos nesta matéria, muitos cidadãos ainda continuarem a encarar certas práticas como um tabu nas comunidades e no seio familiar, sobretudo a violência doméstica.

Por: Filomeno Sambú
Conosaba/odemocratagb

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