domingo, 30 de janeiro de 2022

X° Congresso do PAIGC: MARTILÉNIO DOS SANSTOS PROMETE REDUZIR SALÁRIO DE TITULARES DA SOBERANIA SE VENCER LEGESLATIVAS

[ENTREVISTA_janeiro 2022] Um dos candidatos ao congresso do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), Martilénio Fernando dos Santos, disse que se for eleito presidente do PAIGC e assumir as rédeas de governação vai reduzir os salários dos titulares dos órgãos da soberania para 75 por cento e canalizar essa redução para os setores sociais, nomeadamente, a educação, a saúde e infraestruturas.

“O guineense comum tem que sentir essa redução na educação, na saúde e nas infraestruturas, ou seja, reduzir e canalizar esses fundos para os setores sociais, bem como criar mecanismos de financiamento das mulheres, perspetivas práticas da governação”, assegurou o Coordenador cessante da Coordenação Nacional dos Quadros Técnicos e Amigos e Simpatizantes do PAIGC (CONQUATSA), durante a entrevista ao jornal O Democrata, para falar do seu projeto político para a candidatura à liderança do PAIGC.

“É verdade que estamos aqui para apresentar uma alternativa. O camarada Domingos Simões Pereira tentou fazer o trabalho que ele se propôs fazer no PAIGC, mas os resultados são os que todos nós conhecemos. Ele terá para sempre um lugar reservado no partido tal como Carlos Gomes Júnior, João Bernardo Vieira, Francisco Benante, porque escolhemos o slogan “todos contam”, significa que todas as pessoas que tiveram o privilégio de terem sido presidentes do PAIGC terão sempre um lugar reservado na história do PAIGC, mas isto também pode ser alargado a outros presídios do partido”, notou.

O Democrata (OD): Se for eleito presidente do Partido, por onde começaria para mudar a gestão do partido?

Martilene Fernando dos Santos (MFS): É uma questão importante. Repara, se tudo estivesse a correr bem, se calhar não haveria a necessidade de estarmos a concorrer para a liderança e para apresentar uma alternativa ao partido. A nossa disposição para concorrer neste momento para liderar o partido é porque reconhecemos que de fato precisa de novos ventos e novos horizontes.

A nossa ambição vem da ligação de mais de trinta anos que nós, estou a falar da minha pessoa e de muitos meus colegas. Temos uma ligação forte com o partido e temos acompanhado o partido desde a abertura democrática. Olhando para esse período, entendemos que tem que voltar a estar no seu lugar. Onde o partido está hoje não nos agrada e não podemos conformarmo-nos com isso. Daí a força e motivação de nos mobilizarmos a todos. Quando digo isso não estou a falar apenas de uma geração combatente da democracia, não.

Estou a falar sim de uma geração que requer inclusão de toda a juventude de forma transversal, nomeadamente, dos nossos combatentes da liberdade da pátria, da nossa juventude e das nossas mulheres, porque no nosso entendimento todos os militantes, simpatizantes, amigos e todos os guineenses, em particular os que têm alguma afinidade com o PAIGC, têm que dar essa contribuição, mas temos que ter a capacidade de valorizar essa contribuição de aumentar a motivação dos nossos camaradas, fazer com que se sintam valorizados e que o PAIGC está onde está hoje graças aos seus esforços. Se conseguirmos mobilizar esses camaradas e juntar todas essas forças, vamos conseguir voltar a pôr o PAIGC no devido lugar.

A nossa candidatura prende-se com essa motivação de voltarmos a pôr o PAIGC no seu lugar, com base em alguns pressupostas e prioridades, bem como o reposicionamento ideológico do PAIGC. O nosso partido conseguiu a sua grande conquista, se calhar a sua maior conquista, a independência que nos concedeu a nacionalidade e cidadania, através de uma combinação feliz entre o campo e a cidade. Hoje assistimos a algumas deslocações do PAIGC de algumas das suas bases políticas e ideológicas. A nossa ligação com o partido não tem a ver só com a militância, mas também com o exercício que temos vindo a fazer dentro das estruturas do PAIGC.

Tivemos o privilégio de dirigir a juventude do PAIGC na abertura democrática. Depois disso, desempenhei por dez anos a função de vice-presidente da maior estrutura do partido que é o Setor Autónomo Bissau (SAB). Atualmente, sou coordenador do Conselho dos quadros do partido. Tudo isso dá-nos algum conforto e temos que ter a capacidade de transmitir essa mensagem.

OD: Martilene dos Santos o que quer mudar exactamente no PAIGC?

MFS: Mudar a maneira de tratar os nossos camaradas, fazê-los sentirem que são parte do processo. Tem sido uma coisa crónica entre as situações crónicas no PAIGC. Por exemplo, ganhamos as eleições e perdemos, não temos conseguido preservar as nossas conquistas e as nossas vitórias. Temos que ter as capacidades para mobilizar e motivar os nossos camaradas que conseguem ganhar as eleições para o exercício do poder político. Se não conseguirmos fazer essa transposição, esse acompanhamento e fazer esses camaradas sentirem esse exercício do poder, perdemos rapidamente o poder. O poder tem três fases: a fase da conquista, da preservação e da perda.

OD: O PAIGC não tem conseguido preservar o que ganha. O que tem falhado?

MFS: Mais uma vez tem a ver com a gestão dos nossos recursos, recursos internos. Se assumir o PAIGC, vamos conseguir salvaguardar essas partes que têm a ver com a conservação do poder, porque se ganharmos o congresso, a partir do 20 de fevereiro, vamos mobilizar todas as forças vivas deste país e vamos estabelecer uma agenda nacional sob a liderança do PAIGC, incluindo outras formações políticas e a sociedade civil e não é apenas uma mensagem, porque isso decorre da nossa convicção.

OD: Agora critica-se de fora e a nível interno a liderança de Domingos Simões Pereira. Tem alguma opinião sobre isso?

MFS: Acho que o camarada Domingos Simões Pereira tem feito um esforço para liderar o partido. É verdade que estamos aqui para apresentar uma alternativa, mas o camarada Domingos Simões Pereira tentou fazer o trabalho que ele se propôs fazer no PAIGC, mas os resultados são os que todos nós conhecemos. Ele terá para sempre um lugar reservado no partido tal como Carlos Gomes Júnior, João Bernardo Vieira, Francisco Benante, porque escolhemos o slogan “todos contam”, significa que todas as pessoas que tiveram o privilégio de terem sido presidentes do PAIGC terão sempre um lugar reservado na história do PAIGC, mas isto também pode ser alargado a outros presídios do partido. Não temos nenhum interesse em ofuscar alguma referência dentro do partido. É verdade que cometeram falhas, mas também fizeram algo de bom para o partido.

OD: Neste momento é inegável que há divergências internas no partido. Qual é o foco dessas divergências?

MFS: Mais uma vez, se falar disso, falarei da minha experiência pessoal de trinta anos no partido. Essa experiência permitiu-me conhecer essas situações todas. Isso coloca-nos a nós, à nossa geração, numa posição de algum conforto. Sou candidato por isso estou comprometido com a causa do PAIGC, não me candidatei só para me candidatar. É verdade que há divergências internas no partido. O PAIGC é uma estrutura partidária muito grande, mas temos que ter a capacidade de lidar com as diferenças.

OD: O PAIGC precisa de um rosto novo. Quem será a figura ideal para dirigir o partido e levá-lo à vitória nos embates eleitorais?

MFS: Somos nós, no nosso projeto todos contam. Serei o melhor presidente. Não sei dizer se DSP foi ou não um bloqueio ao PAIGC, mas sei dizer que tem feito um esforço e devemos valorizar esse esforço. Ele estará sempre ligado à história do partido. É verdade que o partido precisa de um novo rosto.

OD: Tem havido críticas ao Domingos Simões Pereira. Muitos militantes acusaram-no de ter dado mais poderes à diáspora do que as bases?

MFS: Não sei dizer se é ou não. Sou suspeito ao falar disso. Fui o primeiro responsável pela criação da primeira célula do PAIGC na diáspora, ou seja, da criação da primeira estrutura do PAIGC na diáspora guineense. Então isto por si só já demostra a minha ligação com a diáspora. Não posso estar a aqui a dizer que deu mais poderes a diáspora do que as bases, porque a diáspora representa um número muito importante para nós. A diáspora elege dois deputados, mas a nível nacional temos 102 deputado e o nosso partido tem conseguido eleger esses deputados. Há que ter um equilíbrio, ter maior abertura para a nossa diáspora, para que se possa sentir que é também parte do processo.

OD: Tem-se reclamado a inclusão de jovens nos órgãos essenciais do partido. Defende a revisão dos estatutos do partido?

MFS: Os estatutos nunca são perfeitos. Por exemplo, a Constituição dos Estados Unidos da América vigora há mais de 200 anos. Nós não podemos estar a mudar os estatutos do partido em função da moda da pessoa, não. Isso não pode acontecer. Não posso chegar ao PAIGC e mudar os estatutos de acordo com a minha perspetiva. Os Estatutos são um conjunto de regras, um instrumento que nos regula a todos. Temos que nos adequar aos estatutos, não o contrário, sem prejuízo para algumas correções pontuais. O fundamental é termos um instrumento que nos regula a todos. No último congresso mudamos os estatutos e não podemos estar a fazê-lo de quatro em quatro anos. Afinal o que é que não estava certo?

A inclusão de jovens nos órgãos decisores do partido é uma questão muito importante, mas às vezes tenho medo de correr certos riscos. A razão principal da minha candidatura prende-se com a juventude. Quando vejo uma juventude com falta de esperança, fico inquieto. Nenhum partido pode almejar um futuro bom sem a juventude. A juventude sem escola e com um futuro duvidoso não pode almejar um futuro bom para um país. Queremos fazer que a juventude seja não só a força do desenvolvimento como também a força da mudança e do sentimento do bem-estar para que possamos ter uma sociedade mais próspera e inclusiva.

OD: O Comité Central reiterou a confiança na liderança de DSP à frente do partido e incentiva para candidatar-se a um terceiro mandato. Concorda com a decisão do Comité Central ou acha que DSP deve ser reservado à corrida presidencial?

MFS: Nesta questão que me colocou consegui explorar três partes: reiterar a confiança ao camarada presidente do partido para liderar o PAIGC até ao próximo congresso, sim. Todos concordamos com essa decisão, porque não podemos estar a incentivar subversões dentro do partido. Temos que permitir que o ciclo democrático interno corra regularmente, mas apoiá-lo a um terceiro mandato, não foi decidido. Sou membro do comité central do partido e todos sabem que eu apresentei uma carta de candidatura no partido junto da comissão eleitoral do congresso e foi comunicado na reunião do comité central, até porque não seria bom para a democracia. Ele terá sempre um lugar reservado no partido, por ter feito o que tem feito pata o partido.

OD: Os elementos subscritores da carta aberta o correm risco de serem sancionados pelo PAIGC, de acordo com a decisão do Comité Central. Como interpreta esta decisão do Comité Central: democrático ou antidemocrático?

MFS: Infelizmente, desconheço integralmente essa vontade ou decisão do comité central. Sou membro do comité central e que não tem competências para sancionar. Quem sanciona é o conselho de jurisdição do PAIGC. Houve pronunciamento sobre aquela carta, mas é um direito que lhes assiste. Podemos avaliar a forma mais correta ou menos correta de avaliar as coisas, mas cada um tem o direito e a liberdade de questionar o funcionamento ou a gestão do partido.

OD: Depois de ter entregue a sua candidatura à comissão eleitoral do X congresso, fez algumas referências em relação à gestão do partido. Quer dizer que o PAIGC não tem sido gerido bem?

MFS: É óbvio que se tivesse sido gerido bem não estaria aqui para apresentar a minha candidatura. Estamos a trabalhar para voltar a pôr o PAIGC no seu lugar. A base da nossa candidatura é a inclusão, a combinação de todos. Na Guiné-Bissau, quem gere a economia familiar são as mulheres, portanto temos que ter a coragem e a capacidade de empoderá-las no sentido de trabalharem e participar na prosperidade da família. Se for eleito a partir do dia 20 de fevereiro, vou dizer aos camaradas e a todos os meus colegas que me acompanham nesta luta para assumirmos, todos, um período de sacrifício em prol de uma Guiné melhor, porque vamos assumir uma agenda nacional que nos levará à gestão eficiente da coisa pública da Guiné-Bissau.

O nosso sacrifício passa necessariamente pelo consentimento da redução para 75 %, dos salários dos titulares dos órgãos da soberania. Tem a ver com o rigor, porque não estamos a produzir. O guineense comum tem que sentir essa redução na educação, na saúde e nas infraestruturas, ou seja, reduzir e canalizar esses fundos para os setores sociais, bem como criar mecanismos de financiamento das mulheres, perspetivas práticas da governação. Não é uma inevitabilidade viver nessa pobreza, não! Estamos aqui para assumir isso a partir do dia 20 de fevereiro.

OD: É coordenador de CONQUASTSA. Como dirigiu esse órgão e que resultado conseguiu?

MFS: Foi para mim, um ensaio muito importante. Agora falar de CONQUATSA, sou um suspeito porque ao falar dessa estrutura estarei a gabar-me. Não faz muito meu jeito, falar de mim. CONQUATSA fez muitas realizações no partido e uma das maiores realizações, se calhar, a primeira e a única vez na história do partido, foi a organização da Universidade. Realizamos um seminário de capacitação de quadros, participamos na elaboração de último programa eleitoral do PAIGC, mas podíamos ter feito muito mais coisas.

OD: Se perder o congresso, vai lutar para a liderança da CONQUATSA?

MFS: Não devo dizer nunca, mas já dei a minha contribuição nessa estrutura do partido. Não sou a única pessoa. Tenho pessoas que me acompanham e que estão à altura de liderar CONQUATSA, mas tem que haver observância dos princípios da liberdade nas escolhas dentro do partido.

Por: Filomeno Sambú
Foto: Marcelo Na Ritche
Conosaba/odemocratagb

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