domingo, 7 de fevereiro de 2021

Chefe de Estado Guineense alerta que Justiça tendenciosa potencia sua banalidade

 


O Presidente da República, Umaro Sissoco Embaló, ao presidir, na terça-feira, dia 2 de fevereiro, a cerimónia da abertura do ano judicial mostrou que essa efeméride torna-se, efetivamente, um ato de celebração, mas, para os guineenses em geral, ela é portadora de uma determinada mensagem que consiste na promessa de uma justiça melhor, isenta, não tendenciosa e não corrupta.

O primeiro magistrado do país disse, na presença dos membros do corpo diplomático, que o ato deve servir também como balanço das atividades realizadas ao longo do ano 2020.

“Como todos nós juramos servir com base na Constituição e nas leis, assim como na promoção da justiça como um bem inalienável, nessa ordem de ideia, pergunto: será que a justiça esteve à altura da sua missão, nomeadamente no fortalecimento do Estado de direito democrático e das suas instituições? Foi a própria Justiça que potenciou o risco da sua banalidade e fragilidade”, respondeu sentenciando.

Sissoco Embaló asseverou que no decorrer do ano 2020 a consciência pública foi surpreendida com os acontecimentos graves que se tornaram recorrentes, referindo-se desse modo, a disputa sobre a posse da terra que quase vem alastrar em todo o território nacional. Para ele, esse dia não deve ser somente de celebração, mas sobretudo de reflexão sobre o estado atual da justiça, no país.

Na opinião do Chefe de Estado “não podemos continuar a ter uma justiça que demora na resolução de litígios e na aplicação das suas próprias sentenças”.

Ele foi mais longe ao afirmar que não se pode continuar a ter uma justiça cara, onde só os que têm poder económico é que são favorecidos e acrescenta “temos que ter uma justiça capaz de combater as pequenas e grandes corrupções, baseadas nos resultados concretos, ou continuaremos a ter uma justiça que retoricamente luta contra a corrupção, mas que na prática não mostra os resultados”.

Justiça que encoraja os investimentos

Ainda na sua comunicação, ele questionou se o país vai continuar a ter uma justiça capaz de combater o crime organizado ou uma justiça que incentiva o mesmo. Ele disse querer uma justiça que garanta a segurança jurídica, que encoraja os investimentos estrangeiros em vez de continuarmos a tolerar a incerteza jurídica, desencorajando o investimento estrangeiro.

O Presidente da República garantiu que enquanto Chefe de Estado vai  fazer tudo para mudar esse quadro deplorável do sistema judicial do país.

Tribunais independentes na dependência

Por sua vez, o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Paulo Sanhá reconheceu que o ano findo foi difícil e conturbado a vários níveis, que se afere no domínio da concretização da agenda judiciária, alegando que nunca o poder judicial foi tão fustigado como no ano de 2020.

Paulo Sanhá disse que se falou de tudo sobre os tribunais e os magistrados, mas muito pouco ou nada foi feito para lhes conferir os meios materiais necessários e indispensáveis ao seu normal funcionamento. Segundo ele, a sua instituição merece um idêntico respeito conferido aos demais órgãos da soberania.

O responsável máximo do poder judicial mostrou que a crescente prevalência dos interesses pessoais ou de grupos sobre os interesses do próprio Estado, ameaça significativamente a consolidação do estado de direito democrático, gerando uma grande divisão perigosa na sociedade guineense, com reflexo sobre a atividade dos tribunais. “Os tribunais, no nosso país são, pois, independentes na dependência”.

Sanhá disse que o poder judicial deve ser forte e independente o que só acontece se lhe reconhecer o lugar que o é, efetivamente, reservado pela Constituição da República da Guiné-Bissau, enquanto órgão de soberania.

Sanhá adverte que todos devem obediência às decisões judiciais, independentemente da bondade ou valia técnica delas. Existem meios legais próprios, ao alcance de todos para opor às decisões com as quais não se concorda.

Politização da justiça

Por seu turno, o bastonário da Ordem dos Advogados, Basílio Sanca, disse que a falta de prontidão do sistema nacional de justiça, durante os fins-de-semana, os dias de feriados, a dependência da intervenção dos juízes da primeira instância na distribuição dos procedimentos cautelares, bem como a exigência do quórum da plenária dos juízes conselheiros para a distribuição dos processos no STJ, revela a grave insensibilidade do poder judicial aos direitos humanos. Esse facto, segundo ele traduziu em défice profunda de tutela dos direitos.

 Para ele, essa situação é em grande parte responsável pela manutenção da detenção arbitrária, abusos de autoridades dos órgãos e agentes da policia criminal e graves angústias e de desespero dos cidadãos perante os tribunais.

O bastonário reparou que o funcionamento do poder judicial tem sido marcado pela forte influência da política, principalmente do Ministério Público e do Supremo Tribunal de Justiça o que tem prejudicado enormemente a afirmação do Estado de direito.

Conforme Basílio Sanca, essas realidades revelaram-se com maior intensidade no STJ, sobretudo, durante o julgamento do último contencioso eleitoral, referente as eleições presidenciais de 2019 e no consulado dos três últimos procuradores gerais da República, que participaram afincadamente na oposição para impedir a execução de uma sentença transitada em julgado.

Realizações

Por fim, o ministro da Justiça, Fernando Mendonça disse reconhecer as carências com que o setor depara, isto desde a inadequação e insuficiência de infraestruturas físicas, recursos humanos, desadequação do quadro legal e a insuficiência das condições de trabalho.

O governante disse ainda que apesar de tudo o que tem sido feito, a justiça continua lenta e cara e, como consequência, classista e penalizadora da mudança social e económica, porque a sua lentidão trava ou dificulta essa mesma mudança.

O ministro da Justiça destacou algumas realizações do Governo, tais como a criação dos gabinetes de recuperação de ativos e de administração de bens, a unificação das receitas e ainda perspetiva para esse ano a reabilitação das instalações do tribunal regional de Oio, Bubaque e construção da casa da justiça de Buba entre outras ações.

Alfredo Saminanco

Conosaba/nô pintcha

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