Guineenses do Porto celebraram o 43º Aniversário da independência
A comemoração da independência nacional, seja em que canto do mundo for, suscita em cada guineense uma certa carga de simbolismo. Quanto não seja a efeméride, um momento exaltante da guinendadi, senão mesmo o culminar de um ciclo que visava a conquista da soberania e auto-determinação. Bem acesa, mantém-se na nossa memória colectiva aquele momento solene de proclamação do Estado da Guiné-Bissau numa das zonas mais recônditas do país (as Colinas de Boé) e num dos teatros da guerra (as matas de Logadjol). Um momento único que nos enche a todos de orgulho, sobretudo após o brilhantismo de uma luta. Singularizada, quer de ponto de vista da ideologia que a norteara – e nisso Amílcar Cabral foi o principal obreiro e arquiteto. Quer do ponto de vista da acção guerrilheira. Aliás, este último, até hoje referenciada como uma das mais movidas contra o então colonizador português.
Nos últimos anos, pela circunstância ou coincidência, tenho quase sempre comemorado a independência fora do país. Em 2013 em Lisboa, na antiga Metrople, Portugal. Em 2014 em Espanha, país dos “Nuestros Hermanos”. Em 2015 na China, Pátria de Mao Setung, China. E este Ano novamente em Portugal, na invicta cidade do Porto.
Se nas anteriores ocasiões, contribui na promoção de actividades comemorativas, na produção de alguns escritos (entenda-se crónicas e poemas), este ano de 2016 tive a oportunidade e o privilégio de estar ao lado das Velhas Glórias do Futebol guineense, no âmbito da realização de um Torneio comemorativo dos 43 anos da Independência. Uma iniciativa bem sucedida sob organização da Comunidade Guineense na Vila de Maia.
No meio dessas celebridades experimentei uma sensação rara. De estar a rever um filme da qual fui um dos figurantes. Como adolescente e na pele de adepto, onde, por vezes e a revelia dos meus pais, trepava os muros, empoleirava nas árvores ou subia a varanda da então “Casa dos Solteiros”, hoje actual sede da PJ, para ver os jogos que decorriam no mítico Estádio Lino Correia. E mais tarde, como jornalista e repórter recolhia dados sobre aqueles momentos memoráveis.
Os leitores devem imaginar o que é estar numa mesma ocasião e simultaneamente com ex-nomes sonantes do futebol nacional como Agostinho, Almeida, Apatche, Adérito, Bobo, Coda, Cláudio, Canhão, Danar, Estácio, Fanfali, Mandundo, Mussa Cambai, Nhaga, Nhu-Rei, Rodolfo, Sambaro. É qualquer coisa como estar numa tarde/noite de constelação de estrelas. Ou com alguns génios de mil e uma noites.
Este reencontro com o passado, relembrado e revivido com nostalgia, deu para reavivar na nossa memória alguns momentos marcantes e mágicos do futebol guineense da década de 70 e 80.
Nessa viagem no tempo, nas entranhas do desporto-rei guineense, o destino nos fez cruzar com as façanhas deAgostinho, um dos primeiros laterais que vimos fazer incursão de mais de 70 metros quando o Benfica atacava e que tinha uma capacidade repentista de recuperação, reposicionando na defesa para travar as investidas do seu marcador directo. Internacional-A na primeira Selecção Nacional de 1975 – chegou a final da Taça Amilcar Cabral e foi copiosamente derrotada pela Guiné-Conakry) - Agostinho, era um futebolista extrovertido que mantinha sempre a boa disposição. Facto que lhe valeu a alcunha de “Amonhongo”. Na mesma época, Rodolfo (Sporting de Bissau) e Nhu-Rei (Benfica) eram apontados como dos melhores avançados que actuavam no futebol nacional. O atacante, que metia velocidades que nem uma Ferrari, culmidados com remates e golos espantosos. O extremo encarnado que com dribes e fintas estonteantes e em velocidade punha os defesa em ko. Adérito (Bafatá e Sporting), Estácio (UDIB) e Mandundo (FC Cantchungo), pertenciam a essa fornada de belos jogadores da época, sendo que nós só tivemos a oportunidade de ver em acção o avançado da então cidade de Teixeira Pinto. Oportuno e com bom toque de bola, Mamdundo deixou uma marca indelével nos adeptos do seu clube e do publico guineense em geral.
Nessa viagem ao passado histórico e glorioso do futebol guineense, fizemos uma paragem obrigatória nos anos 80 para rever a passadeira vermelha que fora estendida aos centro-campistas Bobó (FC Cantchungo), Almeida (Sporting de Bissau, Claudio (UDIB), Fanfali e Nhaga (Bula, Sporting e Benfica) e Mussa Cambai (Sporting). (Bula, Sporting e Benfica).
Bobo vem na fila da frente, com uma ascensão rápida e meteórica que lhe fez chegar aos melhores palcos do futebol africano (vide a Taça Amílcar em 1983 na Mauritânia) e português, tendo em terras lusas sido o jogador guineense com mais títulos de campeão e de vários troféus (no Maia, na Estrela de Amadora, no Porto e no Boavista). Seguem-lhe, Almeida que, no Sporting de Ciro, o fenómeno, e do Mister Demba Sanó fora o cérebro do meio-campo, com uma leitura perfeita do jogo e uma visão periférica do campo, Cláudio, que começou no Desportivo de Farim, tendo rapidamente subido os degraus para envergar as cores da UDIB e da Selecção e depois Fanfali (UDIB). Veloz na função de médio-extremo, com incursões rápidas que atropelavam os adversários, Fanfali marcou grandes golos, como os que ajudaram os udibistas a arrecadarem o título de Campeão na época 1984/86 e o remate esplendoroso que deu golo da Selecção Nacional frente ao Togo, com o país inteiro a vir a baixo num dos torneios de futebol da Zona Oeste da Africa, disputado no Lino Correia em Bissau. Nhaga, com quem jogaram como adversários na mesma época, era mais frio mas muito calculista e portentoso nos remates. Era uma espécie de atirador de meia-distancia, com os seus livre e bolas disparadas fora da área a marcarem a sua passagem pelo Sporting e Benfica.
A nossa viagem no tempo estava quase a terminar. Chegamos aos finais da década de 80, com os avançados Danar (Estrela Negra de Bissau e UDIB), Sambaro (Desportivo de Gabú e UDIB), Coda (Desportivo de Gabú e Benfica de Bissau) e Apatche (Bula FC e Sporting) no horizonte. Os 3 primeiros eram extremos, sendo Coda e Danar esquerdinos e Sambaro dextro. De comum, eram todos jogadores fugazes e rápidos. Danar, quando lhe era pedido pelo Mister Benjamim, acelerava fundo estrangulando a defesa contrária, enquanto que Sambaro e Coda, em muitas ocasiões, aliavam a velocidade ao bom poder de remate. O reencontro com o último desse quarteto, Apatche, fez-nos lembrar a sua pujança física. O avançado fugaz que no alto dos seus 1 metro e noventa irrompia com frequência a área para desferir remates e apontar golos de belo efeito. Na defesa, Mussa Cambai dava nas vistas, embora sendo jogador de baixa estatura. Tinha muita personalidade e estava sempre na hora do desarme. A sua polivalência expressava bem a sua irreverencia, podendo jogar no eixo central ou nas laterais, sendo que neste último gerou alguma polémica quando na 5ª Edição da Taça Amílcar Cabral o Técnico Cipriano Jacinto viu fracassada a sua utilização…
Terminamos a viagem de recuo do Dia 24 de Setembro de 2016 aos tempos áureos do futebol, com essa singela homenagem as nossas Velhas Glórias do Futebol guineense. Valeu a pena termos estado ao lado deles cerca de 40 anos depois. Obrigado e melhores votos em mais uma quadra da Independência da Guiné-Bissau. Venha daí mais comemorações como a da tarde noite de Gaia, na cidade invicta!
Por: Muniro Conté *
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