1-Conosaba:
Coimbra tem mais encantos...a cidade onde o Senhor licenciou-se em Direito,
ainda tem boas recordações daquele tempo de estudante em Coimbra?
Coimbra p'ra ser Coimbra
- Três coisas há-de contar
- Guitarras, tricanas lindas
- Capas negras a adejar
- Coimbra terra de encanto
- Fundo mistério é o seu
- Chega a ter saudades dela
- Quem nunca nela viveu
Autor desconhecido
JG: É,
inegável, que quem passa por Coimbra, sujeita-se a ficar marcado para sempre,
por tudo aquilo que tem a ver com a sua dinâmica e particularidade, enquanto
cidade de estudantes. É uma cidade especial, única, com uma vivência estudantil
própria e profunda. Entre muitas e boas recordações, destaco, as noites
estudantis, as serenatas, a festa da queima das fitas, das latadas, mas tenho,
sobretudo, saudades daquela liberdade responsável. Porque, em Coimbra é
possível levar e viver uma vida estudantil intensa, desde o ir às discotecas,
aos bares, às muitas actividades estudantes, sem que ninguém te diga nada no
tangente aos teus deveres. Mas, na hora de prestar contas, apenas tens a tua
consciência para te lembrar ao que vieste, no fundo, para te lembrar as tuas
obrigações enquanto estudante. É esta vivência estudantil característica e
singular, que faz Coimbra ter mais encanto na hora de rumar a outras paragens.
2-Conosaba: Dr. Jorge Gomes da Silva, o senhor é guineense? Em que zona da Guiné-Bissau nasceu de concreto? Sente saudades da sua infância e como foi vivida?
JG: Sim. Sou guineense. E sou da Região do Arquipélago dos Bijagós. Nasci, concretamente, na ilha de Bubaque. Mas, mais do que bubaquense, sou um homem da região, um homem das ilhas. Muito embora, tenha tido uma infância repartida, por Bissau, onde vivia a minha família, Bolama, para onde foi transferido o meu pai e onde iniciei o meu ensino pré-escolar (jardim de infância) e Bubaque, para onde a minha família foi viver, após o trágico acidente de viação que vitimou o meu pai, e onde prossegui e conclui o ensino primário, as memórias da minha infância vão maioritariamente para Bolama. E lembram-me dos brinquedos que eu e os meus irmãos recebíamos do nosso pai, as prendas em dia do natal, os passeios no jardim em frente à Administração, ou pela marginal, saudades de uma festa que, para as crianças, era de todo semelhante ao natal, julgo que se designava por “passa-pronto”, ou seja, juramento da bandeira, em que os familiares se deslocavam ao quartel na companhia das crianças, estas vestidas de preferência de roupa nova. Em suma tenho saudades de Bolama daquele tempo.
3-Conosaba:
Dr. Jorge Gomes, o senhor confirma que é representante da ASSEMBLEIA DO POVO
UNIDO - PARTIDO DEMOCRÁTICO DA GUINE-BISSAU (APU-PDG) na Diáspora Europa, o
partido liderado por Eng.º Nuno Gomes Na Nabian?
JG: Confirmo
que sou presidente da Direcção da Comissão Instaladora da Assembleia do Povo
Unido - partido democrático guineense -APU-PDGB-Secção de Portugal. Lidero uma
equipa forte e coesa, que tem como propósito divulgar e fazer conhecer aos
nossos concidadãos e não só, na diáspora em geral e Portugal em particular, o
que a APU-PDGB tem para oferecer, assim como promover acções e debates de
esclarecimentos sobre as linhas mestras do referido projecto, bem como a
importância que irá ter na vida das populações.
4-Conosaba:
O Senhor hesitou, quando foi abordado e convidado para se integrar ao novo
partido político, “Assembleia do Povo Unido – Partido Democrático da
Guiné-Bissau”, fundado por Nuno Nabian?
JG:
Devo
confessar que houve uma certa hesitação da minha parte. Pois, são 21 anos
dedicados exclusivamente a minha actividade de Advogado. E o simples facto de
embarcar neste grande projecto passava a significar, ter que conciliar as duas
coisas: a minha actividade profissional e a actividade partidária. Mas, após
ler os estatutos do partido, que também pesaram na minha decisão, dois factores
foram determinantes para a minha adesão ao APU-PDGB: 1.º A forma como na nossa
1ª reunião, o Secretário-geral da APU-PDGB, Dr. Juliano Augusto Fernandes, com
toda a sabedoria que se lhe reconhece, fez a apresentação do Projecto político
do partido, da sua essência, assim como daqueles que o lideram. Pude concluir,
que estávamos perante pessoas com credibilidade, porquanto, inspiravam
confiança. Muitas delas, como eu, com provas dadas nas suas vidas profissionais
ou público-privadas. E que abraçaram este projecto com o único propósito de
servir a causa pública, de servir o nosso país, as nossas populações; 2º, o
facto de achar que depois de 29 anos fora, sendo 21 dedicados à advocacia, é
chegado a hora de retribuir aquilo que o meu país fez por mim. No fundo,
entendi que tinha chegado a hora de dar a cara e oferecer-me para participar e
contribuir para o desenvolvimento e criação de condições para o bem-estar do
meu povo.
5-Conosaba:
O seu partido tem programa para governar o nosso país, caso vença próximas
eleições legislativas na Guiné-Bissau? Fale, um pouco, sobre principais
projetos do partido, por favor...
JG: O
meu partido tem o projecto político para o país, do qual a seu tempo, resultará
um programa de governo. Mas, seja como for, uma coisa é certa: O meu partido
não pode falhar. Não pode, mais uma vez, permitir que as legitimas expectativas
do povo guineense, sejam defraudadas. É bom não escamotear que essa foi uma
prática recorrente, perpetrada por sucessivos governos ao longo dos 43 anos da
nossa existência enquanto país. Aliás, já frisei que embarquei neste projecto,
por acreditar no seu propósito, na medida em que credível e inovador, constato
que existe uma manifesta vontade, sobretudo politica, para resolver os reais
problemas do pais e das pessoas. Por isso, qualquer programa do governo que meu
partido venha a submeter a sufrágio, terá que ter em conta o seguinte: temos
uma saúde inexistente, um ensino deplorável, uma justiça ineficaz e centralista,
um turismo inaproveitado, uma administração desorganizada internamente, um
território desordenado e nada atractivo, os jovens fustigados pelo desemprego e
uma economia estagnada.
6-Conosaba:
O ex-representante da ONU na Guiné-Bissau, Miguel Trovoada, recomendou ao chefe
de Estado guineense, José Mário Vaz, que não seja árbitro e jogador ao mesmo
tempo, defendendo que tem que estar equidistante da política. Por favor, Dr.
Jorge Gomes o que pensa sobre afirmação (em cima mencionada) vindos da boca do
Dr. Miguel Trovoada?
JG:
Sinceramente,
julgo que o que o nosso Presidente da República, verdadeiramente gostaria era
de estar a exercer funções de Primeiro-ministro. E ter-se-á candidatado à
presidência da república como último recurso. Só assim se compreende o seu
pendor presidencialista, ou melhor, o seu gosto pelas funções reservadas ao
chefe do executivo. Só assim, se compreende a sua sistemática ingerência em
assuntos da governação. Isso tudo, ao arrepio da Constituição que ele mesmo
jurou cumprir e fazer cumprir. Pergunto eu, o Presidente não terá conselheiros
que o exortem para a inobservância do importante princípio da separação de
poderes? Um dos princípios basilares em qualquer estado de direito e
democrático. E é, exatamente, por teimar em ser jogador e ao mesmo tempo
árbitro, que o país está mergulhado num imbróglio político-jurídico. Ou seja, é
exatamente, pela sua inequívoca falta de isenção (porquanto, está deveras
comprometido com uma das equipas em jogo), que o país, as instituições estão
estagnados e mais uma vez quem paga e quem sofre é o povo.
7-Conosaba:
Se pudesses mudar a nossa Constituição da República, mudarias? Para o melhor?
Não sei, deve ter muitas lacunas...
JG:
Verdade
seja dita, a nossa constituição, no geral está em linha com as constituições
tidas como assentes nos princípios do estado de Direito e Democrático. Basta
olharmos para o seu artigo 59.º que diz que, são órgãos de soberania o
Presidente da República, a Assembleia Nacional Popular, o Governo e os
Tribunais, e diz mais, a organização do poder político baseia-se na separação e
independência dos órgãos de soberania e na subordinação de todos eles à
Constituição. A meu ver o problema reside, ora na interpretação abusiva da
constituição ou no recurso a má-fé para a sua interpretação. Ou seja, aquilo
que eu chamaria, a conveniência à sua interpretação. Se eu a pudesse mudar
suprimiria o nº 2 do artigo 36.º, que abre a porta à existência da pena de
prisão perpétua para os crimes a definir por lei. Pois, entra em contradição
com o nº 1 do mesmo artigo, que diz que no nosso país, em caso algum haverá
pena de morte. Suprimia também a al. m) do Artigo 68.ª que confere ao
Presidente a possibilidade de presidir o Conselho de Ministros, quando o entender
, pois, num país como o nosso, em que os atropelos à constituição são
frequentes, vem gerar mais confusão e funcionar como mais um foco de conflito
entre a presidência e a primatura. Mas, o mais importante para mim seria acabar
com a chamada traditio constitucional, ou melhor, as denominadas práticas
constitucionais enraizadas no nosso ordenamento jurídico. Segundo estas praticas, o Presidente da Republica escolhe ministros para as pastas dos
Negócios Estrangeiros, Finanças, Defesa e Administração interna. Eu discordo.
Para mim, quem deve poder escolher e propor nomes para a função governativa,
deve ser o chefe do executivo, sem quaisquer interferências do Presidência da
República. Afinal, quem responde pela acção governativa, quer perante o Parlamento,
quer perante o eleitorado, até perante a Presidência da Republica é o chefe do
executivo. E não faz sentido, por isso, que responda por actos governativos de
quem não escolheu. Aliás, estas práticas constitucionais estão na origem do
actual conflito ente a Presidência da República e o então Primeiro-ministro e
Presidente do PAIGC.
8-Conosaba:
O combate do PAIGC foi uma das mais exemplares lutas de libertação de toda a
história das revoluções no mundo, concorda? Então, porque andamos até agora á
deriva?
JG: Para
mim, esta pergunta comporta duas perspectivas. Numa perspectiva puramente
militar concordo, pois, foi uma luta em que um grupo de homens e mulheres,
organizado e imbuído da força da razão, numa clara situação de desigualdades de
armas, conseguiu derrotar o poderoso exército português, já que não nos podemos
esquecer que, Portugal, foi sempre apoiado pelas grandes potências europeias de
então. Já discordo, se nos virarmos para uma outra, a global. Aqui é bom não
esquecer que a luta do PAIGC foi prodiga em intrigas, conspirações e
assassinatos de camarada seus. Pois, nunca foi capaz de abraçar e cultivar a
paz interna. Prezando, em substituição, aniquilação física daqueles que ousaram
ter opiniões divergentes, o que aliás, foi transportado para a nossa sociedade
no período pós luta. No fundo o PAIGC, quer guerrilheiro, quer o que o
substituiu até aos dias de hoje, nunca cultivou os princípios da paz,
pluralidade de opiniões e da tolerância, expressões pilares daquilo que deve
ser uma democracia partidária.
9-Conosaba:
União Africana, adotou novas estratégias políticas para desenvolver a nossa
África! É para acreditar?
JG:
A
partir de uma certa altura, deixei de acreditar na União Africana na medida em
que entendo que é vítima de conflitos de interesses variados. Que interesses
são esses? Interesses dos próprios países, interesses sub-regionais, regionais,
mas sobretudo, de interesses e agendas pessoais dos seus dirigentes. Por isso,
não passa de um somatório de interesses incompatíveis. Pelo que, quaisquer
novas estratégias políticas, se não partirem do pressuposto de harmonização de
tais interesses e agendas, desenhando o modelo e definindo os princípios para
uma África mais Democrática, onde prevaleça interesses dos cidadãos e não dos
dirigentes, a transparência na tomada das decisões, e sobretudo, rompendo com a
perpetuidade no poder, tudo não passará de mais uma miragem. E, assim, julgo,
que continuaremos mergulhados na descrença.
10-Conosaba:
Desta vez, os nossos militares não se meteram ao barulho (ménher ménher),
acusavam sempre os militares de serem culpados de tudo! Que nota daria as
nossas forças armadas nesta “salada russa, a nossa maneira guineense”?
JG: Eu
sou de opinião que os nossos militares, salvo raras excepções, nunca se meteram
ao barulho. Os políticos ávidos de poder, por não possuírem alternativas ao
grande emprego do estado, ou por não aceitarem encontrar alternativas, é que
tinham por hábito assediar aos militares. Seduzindo-os, fazendo promessas disto
e daquilo, como forma de obter coberturas militares para as suas causas. Ou
seja, quando cessavam funções governativas, em vez de regressarem as suas
actividades público-privadas, ou procurem ser uteis a sociedade num outro
prisma recorriam a intrigas e conspirações, apenas com o único objectivo:
regressarem ao poder. Até porque, uma parte substancial exibiu sempre um
considerável défice de qualidade. Por isso, fazer da função governativa um modo
de vida passou a ser um móbil. E, assim, transformou-se em sistemático foco de
instabilidade. Só que, desta feita, o actual CEMFA, por ser imune a essa velha
pártica, fez saber aos seus homens que o lugar dos militares, em tempo de paz,
deve ser nos quarteis. E os políticos, que façam política, mas longe dos
quarteis. Posto isto, numa escala de 0 a 10, daria uma pontuação máxima aos
nossos militares.
11-Conosaba:
É certo que o clima político na Guiné-Bissau está longe de estar saneado.
Concorda ou não? Por favor comente...
JG: Concordo
plenamente. Olhando para o actual círculo giratório representado pela
Presidência, PAIGC, PRS e Assembleia Nacional Popular, é impossível obter algo
nos possa colocar ou recolocar no caminho da estabilidade, em prol das nossas
populações. Porque todos eles, são movidos por interesses particulares, mesmos
observando que aqueles que os elegeram são os mais prejudicados. É aqui que
entra o meu partido. A APU/PDGB, é actualmente a única força política capaz de
resgatar o nosso país a esses políticos egoístas, sem qualquer sentido de estado
e sem qualquer sensibilidade nacional. Mas, para lograr esse desiderato, é
preciso apostar numa política diferente. Apostar na capacidade de realização,
na competência para decidir e na vontade para fazer. Em suma, em pessoas que
estando à altura dos desafios que o país lhes coloca, também são capazes de
interpretar, quer o projecto político, quer o programa de governo do partido
para o país. Assim como, o seu impulso transformador na sociedade guineense.
Por a APU-PDGB estar decidida em protagonizar a mudança do paradigma
governativo, é que convocamos todos os homens, mulheres e jovens para se
juntarem a nós, para que possamos mostrar às nossas populações e ao mundo,
sobretudo, que afinal, é possível desenvolver o nosso país, é possível oferecer
o bem-estar ao nosso povo.
12-Conosaba:
Guiné-Bissau qualificou-se para a CAN pela primeira vez! O povo guineense está
em festa, depois de a sua seleção ter conseguido um inédito apuramento para a
fase final da CAN. Apesar do nosso país esta como esta é possível ganharmos a
Taça das Nações Africanas?
JG: Acho
que a nossa qualificação constituiu motivo de alegria para todos nós. E foi
muito importante para recuperar, por instantes, a nossa auto estima, que em boa
verdade, anda pelas ruas da amargura. Se é possível vencer a taça das nações?
Porque não?
Fim
Porto, 30 de Setembro de 2016.
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