terça-feira, 6 de outubro de 2020

A juventude e o ativismo na Guiné-Bissau: um caminho para a mudança de paradigma político e social?

 

O país e a juventude guineense experimentaram nos últimos anos várias manifestações políticas e sociais inéditas. Jovens organizados em massa popular como ativistas em diferentes organizações dos movimentos sociais, para demostrar o inconformismo sócio-político que tem marcado a Guiné-Bissau por décadas. Entre as suas motivações perfilam-se inúmeras razões entre os quais: a má gestão administrativa estatal, usurpação dos poderes e corrupção no aparelho público. Os ativistas igualmente estudantes comuns (ensino médio), universitários e diferentes profissionais, não hesitaram em despertar a consciência popular através das marchas, protestos, intervenções nas redes sociais, rádios, televisão e nos outros espaços –, organizados em núcleos de cidadãos nacionalistas que almejam as mudanças necessárias no paradigma político nacional. Uma luta que, ora lhes valeram prisões e espancamentos pelas forças de Ordem Pública, contudo, grande parte não se vergou perante a injustiça. Uma vez que os repertórios dos movimentos sociais constroem-se em símbolos e imagens na cultura política alicerçadas pelas lutas, construído no processo social (Gohn, 1997). Sendo assim, no passado, o continente africano havia registado a transformação política e social através da mobilização em massa nos protestos populares beninenses em novembro de 1989 (numa altura em que vários estados africanos espreitavam o multipartidarismo), originando a renúncia do regime autoritário do Mathieu Kérékou, na Conferência Nacional das Forças Vivas da Nação, em fevereiro de 1990, após 29 anos no poder (Diamond e Plattner, 1999 citados por Sanches, 2014). A histórica revolução da juventude popular guineense não atingiu o topo do êxito que se esperava (renúncia do presidente José Mario Váz), mas os efeitos não se enganam. Nos dias atuais, proliferam-se grandes mudanças na mentalidade social e política de boa parte da sociedade guineense. Por um lado, na altura, mesmo com certas rupturas ideológicas entre as organizações e os próprios jovens – uns prós e outras contra – o então regime, inclusive assistia-se as marchas que demostravam claras posições políticas e protestos nas redes sociais –, por vezes determinadas pelas opções político-partidárias originando posições antagônicas, conclui-se que a juventude tem protagonizado mudanças extraordinárias no status quo em termos políticos e sociais. Entretanto, reconhece-se, por outro lado, que os jovens guineenses de modo geral, estiveram muito cedo atentas as questões políticas e sociais no país e manifestavam suas revoltas através do estilo musical Hip Hop e não só. No rap alertavam e criticavam as injustiças político-militares com fortes impactos na vida social. Nas suas músicas, os rappers exerciam uma clara consciencialização social com vista a mudar o paradigma e estimular a posição popular. Constata-se hoje uma clara certeza de que, houve despertar da consciência influenciada pelos últimos acontecimentos protagonizados pelos movimentos sociais na Guiné-Bissau –, por mais que sejam poucas, continuam visíveis nos espaços de opinião pública como nas rádios, televisão ou nas redes sociais, os efeitos esperançosos numa juventude diferente e consciente para o futuro do país. Uma juventude com a consciência cívica progressista, com ideias capazes de alavancar o desenvolvimento político, econômico e social do Estado. Uma luta árdua, mas justa e benéfica para os guineenses e para a Guiné-Bissau. Avante!!

Referências

GOHN, Maria da Glória. Teoria dos movimentos sociais paradigmas clássicos e contemporâneos. São Paulo, Loyola, 1997.

SANCHES, Idalina Rodrigues. Novo contexto mas velha política: a evolução do sistema partidário moçambicano entre 1994 e 2014. Painel 1- Democracia, governança e Estado. “Espaços lusófonos” (1974-2014) trajectórias económicas e políticas. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian e Universidade de Lisboa, 2014.

Calido Mango

Cientista social pela Unilab, pesquisador e escritor

Mestrando em Ciência Política, Universidade de Aveiro - Portugal


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