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Na
verdade, (…) apesar do considerável
potencial económico de que a Guiné-Bissau dispõe, devido às suas riquezas
naturais e ao estado de pré-desenvolvimento em que encontram alguns sectores
relativamente atraentes, a exploração destes recursos é limitada devido à
instabilidade política recorrente (…).
Afirmação
supra conduz-nos à seguinte questão: A
conjuntura política que tem caracterizado o país estará preparada para os
desafios do desenvolvimento? É o que se pretende discutir neste pequeno ensaio
económico sobre os “desperdícios”, da política
e dos políticos.
O processo
de desenvolvimento da Guiné-Bissau passou por várias fases e contornos políticos
desde à independência em 1973 até aos nossos dias. Este pequeno ensaio pretende
abordar o impacto que algumas decisões políticas tiveram sobre a economia, concretamente
sobre o PIB - Produto Interno Bruto - que
representa a soma (em valores monetários) de todos os bens e serviços finais
produzidos numa determinada região (quer sejam países, estados ou cidades) durante
um período determinado (mês, trimestre, ano, etc.). Em linguagem mais aberta, o
PIB é o indicador mais usado para
perceber o estado da economia de um país, revela se o país está a crescer, a
produzir riqueza ou em dificuldades.
Com
este ensaio não se pretende elaborar um estudo empírico, baseia-se tão-somente na
interpretação dos dados macroeconómicos recolhidos através da seguinte Fonte: “World Bank, World Data Bank”, Dados disponíveis: 1973-2014.
Antecedentes:
Após à independência, em 1973, e logo a seguir à crise de 1977, o país registou
um crescimento de 13,1% do PIB, entre
1978 e parte de 1979, conforme se pode comprovar no gráfico 1 a seguir. Seguidamente,
o golpe de Estado ocorrido em 1980 precipitou a deterioração da economia e, consequentemente,
a redução do PIB em cerca de (-16%).
A
economia, entretanto, voltou a recuperar em 1981-82 e já em 1983 com o programa
de intervenção do FMI – Fundo Monetário Internacional - que permitiu, por um
lado, alavancar o crescimento do PIB,
mas, por outro, descurou a articulação estratégica que deveria ser acompanhada
de uma reforma séria em termos da administração pública e do Estado,
condicionado logo à partida através de um pacto de estabilidade política para a
governação do país. Aliás, os três momentos que marcaram o país, através de graves
ruturas constitucionais entretanto ocorridas, concretamente em 1980 (golpe de
estado), 1998 (recorda-se que aqui não se tratava apenas de um golpe de estado
mas de uma guerra civil com repercussões terríveis para as populações) e 2012
(outro golpe de estado) é a prova da falta de articulação estratégica entre as
instituições do Estado, devolveram ao país as taxas de crescimento negativos,
respetivamente de (-16%), (-28,1%) e (-2,2%).
Nesse
período temporal de 34 anos, o crescimento do PIB abaixo da linha de tendência,
em resultado de instabilidade política, traduziu-se no output gap – quebra do
produto da economia - em cerca de (-79,01%).
Contudo,
anteriormente à guerra civil de 1998, o país demonstrava um crescimento
moderado, entre 1992 e 1996, altura em que o PIB atingiu a sua taxa máxima, cerca de 11,6%, no conjunto dos 4
anos. Na verdade, a guerra civil de 1998 foi o pior momento para a economia
guineense pois colocou em causa os objetivos de desenvolvimento que vinham a
ser alcançados, embora mínimos mas possíveis, uma vez que o PIB regrediu para (-28,1%), a mais baixa
desde a independência da Guiné-Bissau.
Porém,
entre 2001 e 2007, assolado por uma série de instabilidades políticas, com as
constantes quedas de governo, eleições legislativas e presidenciais, o país
manteve uma variação de crescimento médio-baixo pelo menos até 2009 altura em
que permitiu uma excelente dinâmica económica que durou sensivelmente até 2011
com o PIB a tingir cerca de 9%. No
entanto, com o golpe de Estado ocorrido em abril de 2012 a contração do produto
interno afundou de novo a economia para valores negativos (-2,2), conforme se
apresenta:
Gráfico
1. Evolução do PIB (% anual)
Invariavelmente,
verifica-se que em cada ciclo de crescimento há uma rutura que deita por terra
as esperanças do desenvolvimento almejado. O gráfico 2 a seguir apresenta a
evolução do PIB (preços correntes
atuais em USD), a linha vermelha mostra o desempenho da economia e a tendência
linear (linha preta) representa o que deveria ser a evolução normal da economia
a partir de 1977.
Gráfico
2. Evolução do PIB versus Ruturas Constitucionais
Os
dados que se podem retirar do gráfico 2 acima demonstram que no período
compreendido entre 1983 e 2007 o PIB
evoluiu timidamente abaixo da linha de segurança. Ou seja, o hiato
ou output
gap do produto da economia - que significa a diferença entre o produto
efetivo dessa economia e o produto potencial - é tão evidente que requer muita
atenção na abordagem que deve ser feita sobre a política guineense e a sua
interferência direta na economia através dos chamados desperdícios e dilapidação do “produto” Guiné-Bissau. Este
cenário demonstra claramente que em situações normais de estabilidade política e
governativa a dinâmica da própria economia gera liquidez suficiente para se
manter acima da linha de tendência, conforme se apresenta no gráfico.
Na
verdade, as instabilidades políticas recorrentes originam a retração da
economia e, automaticamente, o atraso no processo de desenvolvimento de um país.
Veja-se, por exemplo, os orçamentos de Estado bem como os programas económicos
que deveriam ter períodos de 4 anos de execução e mais 2 anos de avaliação dos seus
impactos.
No
caso concreto da Guiné-Bissau, de 1984 e posterior abertura democrática em 1994
até à presente data, nenhum governo conseguiu concluir o seu mandato, o que só
por si inviabiliza, automaticamente, o cumprimento de qualquer programa de
desenvolvimento económico ou orçamento de Estado. Nesse período, o crescimento
do PIB abaixo da linha de tendência,
em resultado da frequente instabilidade política, traduz-se no output gap - quebra
do produto da economia - em
cerca de (-79,01%), ou seja, a destruição momentânea do grande potencial
económico.
Em termos
da dinâmica de governação, constata-se, através do gráfico 3 a seguir, que o
partido fundador das nacionalidades guineense e cabo-verdiana, nomeadamente o PAIGC,
esteve ininterruptamente no poder desde 1975 até 1998 (altura em que os país de
precipitou para guerra civil com contornos ainda por esclarecer).
Tal
como já se referiu, a crise de 1998 originou uma quebra do PIB na ordem dos (-28,1%), conforme se pode constatar no referido gráfico.
A seguir a esse período e já em 2000 a liderança do executivo guineense passou
para o partido PRS em coligação com a RGB Movimento Bafatá e, em Janeiro de
2001, este último deixa a coligação PRS/RGB.
Gráfico
3. Evolução do PIB Versus Partido / Governo
Como é
evidente numa análise técnica a fundamentação é importante, pelo que importa
ter em consideração alguns aspetos necessários para efeitos de comparação. Contudo,
partindo de alguns pressupostos e, também, de dados comparativos com os países vizinhos,
nomeadamente, Senegal, Guiné-Conacri, Gâmbia e Cabo-Verde, este último por
razões que se prendem com a ligação histórica, constata-se que, no período
compreendido entre os anos de 1980 e 2014 conforme se pode constatar no gráfico
4 a seguir, todos eles tiverem uma evolução do PIB tendencialmente positiva, à exceção da Gâmbia e da Guiné-Bissau
que apresentaram crescimentos nitidamente abaixo da fasquia de Mil Milhões de USD.
Porém,
como é sabido, Senegal e Cabo-Verde, em 30 anos de democracia, nunca tiverem
crises políticas graves que colocassem em causa os seus modelos de
desenvolvimento e, consequentemente, a retração das suas economias em valores
substanciais como aconteceu com a da Guiné-Bissau.
Gráfico 4. Evolução do
PIB por países da sub-região + Cabo-Verde
No
entanto, o crescimento progressivo desses países, sobretudo do Senegal que
desde 1994 tem tido uma evolução apreciável, passando de 3,3 Mil Milhões USD
para 15,5 Mil Milhões em 2014 do PIB, contou, em parte, com a falta de
organização política e económica da Guiné-Bissau, sobretudo após o conflito
armado de 1998 que colocou a economia guineense em recessão em cerca de
(-28,1%), por razões que têm essencialmente a ver com a mudança de
posicionamento estratégico desse país (Senegal) em termos da sua Balança
Comercial e na escolha de mercado da Costa Ocidental de África. Tanto assim que
a Guiné-Bissau importa praticamente todos os seus bens de consumo e de capital.
Os géneros alimentares e o petróleo representavam, por, exemplo, em 2009, cerca
de 51% das importações, o principal fornecedor destaca-se o Senegal que é
responsável por 54% das mercadorias importadas. De ano para ano o Senegal tem
vindo a reforçar a sua posição na Guiné-Bissau, tal como acontece a partir de 2001
nas áreas de Comércio e Serviços.
Contrariamente,
a Guiné-Bissau deixou de ser um país com um setor económico muito forte em
termos de agricultura para se aproximar do Comércio e Serviços, conforme se
pode constatar no gráfico 5 a seguir, tendo este setor, em 2001, ultrapassado
largamente a fasquia dos 47,1% do PIB. Ora, como é sabido, aliás, verifica-se claramente,
que a atividade comercial, serviços e turismo guineense é controlada por
capital estrangeiro, uma vez que o tecido empresarial nacional é frágil e com graves
falhas de organização.
Para
além disso, a economia paralela, que também é controlada por capitais
estrangeiros, representa cerca de 41,6% do PIB (dados de 2013), não se prevendo
uma máquina fiscal capaz e eficiente no combate à evasão e fraude fiscal em
virtude das crises cíclicas que têm assolado o país.
Gráfico
5. Setor Económico (% do PIB)
Quanto
ao setor industrial, que outrora foi a menina dos olhos bonitos da
Guiné-Bissau, chegou a atingir cerca de 26,9% do PIB em 1981, tem vindo a perder a sua posição traduzindo-se numa
redução em de cerca de 40% do seu peso em 2014, situa-se agora em 13,6% do PIB.
Pretende-se
demonstrar com este pequeno ensaio que a estabilidade política e governativa é
desejável para fazer face aos objetivos de crescimento e sustentabilidade da
nação, criando condições para o bem-estar social das populações. No entanto, para
que assim seja, é importante a coerência na gestão das políticas públicas, na
estabilidade política e governativa, na criação de um clima favorável de
negócio e, acima de tudo, no desenvolvimento das parcerias estratégicas entre
os órgãos de soberania tendo em conta o espirito de solidariedade
institucional.
Por
fim, importa ter presente que a política é um instrumento que permita encontrar
soluções para os problemas que afetam as populações, que permita, sobretudo,
fazer com que o presente seja um presente de compromisso e o futuro, um futuro
de realizações.
É
desejável que as forças vivas do país procedam, quanto antes, as reformas
estruturais que dignificam a nação, criando condições para uma participação política,
através de iniciativas públicas e privadas na esfera da economia real, dando ênfase
às ações geradoras de emprego e aumento da produtividade. O indicador do PIB é
o que mede a sustentabilidade económica de um país, pelo que quanto maior for este
indicador maior é a capacidade de geração de riqueza, crescimento e criação de
emprego, e menor será o esforço em termos de endividamento público que em 2013
era de 39,8% do PIB, portanto, há que lutar para que seja real e verdadeiro o
tão almejado desenvolvimento e progresso da nação.
Aos
partidos políticos, os dois que têm governado o país, nomeadamente PAIGC e PRS,
aconselha-se que procedam uma profunda revisão das suas bases ideológicas e,
correlativamente, uma adaptação assertiva dos seus estatutos que acompanhem os
sinais do tempo. Assim, estes partidos terão a oportunidade em abrir e atrair
jovens e quadros com novas ideias que apontem o futuro com reflexos diretos no desenvolvimento
do País.
Neste preciso
momento em que este ensaio é produzido, a nação guineense celebra 42 anos de
independência, mas, por infortúnio a que já se habituou, mais uma crise
política se instalou e já foram nomeados três primeiros-ministros no espaço de
um ano.
Lisboa,
24 de setembro de 2015
Luís
Vicente
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