sexta-feira, 28 de março de 2025

Opinião: CEDEAO SOB AMEAÇA DE DISSIDÊNCIA DE UM ESTADO-MEMBRO: A NOVA CRISE POLÍTICA DA GUINÉ-BISSAU

 

Na leitura sociopolítica e estratégica internacional, a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) enfrenta um dilema de insegurança. A análise da situação sociopolítica da região e a intenção de resolver as crises e conflitos recorrentes afetam a capacidade das instituições da organização sub-regional de tomarem decisões assertivas.

Na última década, vários países-membros foram mergulhados em crises cíclicas, nomeadamente Mali, Burkina Faso, Níger e Guiné, onde as autoridades de transição e os regimes militares impostos após golpes de Estado tornaram-se um meio facilitado de acesso ao poder dentro do espaço comunitário. Por outro lado, a Guiné-Bissau tem estado, há uma década, sob escrutínio e mediação da CEDEAO, contando com a presença de missões de manutenção da paz da organização sub-regional.

Qual é a medida tomada pela CEDEAO face às crises e golpes de Estado?

Há três décadas, a CEDEAO realizou sua primeira intervenção política e militar nas guerras da Serra Leoa, Libéria, Costa do Marfim e Guiné-Bissau, através da criação de forças de interposição e manutenção da paz. Além disso, impôs sanções a Estados e personalidades políticas e militares. 

No entanto, a organização tem se concentrado excessivamente em mediações políticas, afastando-se de sua missão essencial: permitir a livre mobilidade econômica e profissional dentro da comunidade. O objetivo inicial era garantir que empresas pudessem transferir funcionários e serviços entre países-membros, possibilitando, por exemplo, que um médico, professor, engenheiro ou advogado da Guiné-Bissau pudesse exercer sua profissão na Nigéria, Senegal, Libéria ou Mauritânia. Contrariamente a esse propósito, a CEDEAO tem sido acusada de ingerência nos assuntos internos dos seus países-membros, priorizando questões políticas e diplomáticas sem estratégias eficazes para travar a onda de conflitos na região. Embora se tenha discutido a criação de um comitê "anti-golpes" (anti-putsch), faltou vontade política para sua implementação.

Qual é o principal problema da CEDEAO?

A política de livre circulação de bens e pessoas não funciona adequadamente. O passaporte comunitário é rejeitado pelos serviços de migração e fronteiras de quase todos os países-membros. A falta de infraestrutura de transporte – rodovias, ferrovias e aerovias – bem como a ausência de produção energética sustentável, união monetária (moeda comum ECO) e união aduaneira são barreiras significativas ao crescimento econômico da região.

A CEDEAO está em processo de descredibilização devido às dificuldades na gestão das crises de diversos países, o que resultou na dissidência de Mali, Burkina Faso e Níger e na consequente criação da nova organização sub-regional "Estados do Sahel". A filosofia dessa nova organização opõe-se aos princípios da CEDEAO, que é uma entidade subsidiária da União Africana (UA) e da ONU. Além disso, os Estados do Sahel romperam com a influência geoestratégica do Ocidente, especialmente da França, e se aproximaram de novos parceiros, como Rússia e China, tanto no âmbito militar quanto comercial.

A CEDEAO está ameaçada de perder a Guiné-Bissau?

A Guiné-Bissau tem sido alvo de frequentes intervenções da CEDEAO há mais de uma década. O país lusófono sofreu ingerências que, em alguns momentos, comprometeram sua soberania, ao ponto de decisões importantes dependerem da organização sub-regional. Um exemplo marcante foi a crise durante o mandato do presidente José Mário Vaz, em que a CEDEAO adotou uma postura rígida e intransigente, esvaziando poderes presidenciais, incluindo a anulação de decretos. Esse tipo de intervenção nunca foi verificado em países como Níger, Mali, Burkina Faso, Serra Leoa, Libéria ou Costa do Marfim.

Mais recentemente, a CEDEAO enviou uma missão de alto nível a Bissau com o objetivo de intervir na atual crise política, mas desta vez foi rejeitada como "persona non grata", sendo considerada uma missão viciada e imparcial.

O que pode acontecer diante da rejeição da missão da CEDEAO?

O presidente guineense Umaro Sissoco Embaló parece ter o "vaca e queijo na mão". Por um lado, ele resiste às decisões da CEDEAO, reafirmando que a organização não é soberana em nenhum país-membro e buscando resolver a crise através do diálogo interno com as forças vivas da nação. Por outro lado, a CEDEAO teme que a Guiné-Bissau também se torne um dissidente, somando-se a Mali, Burkina Faso e Níger.

Vale lembrar que Embaló mantém boas relações com os líderes dos Estados do Sahel e com a Rússia, que é o principal aliado militar e geopolítico da nova organização. Ao mesmo tempo, a França, tradicional potência na África Ocidental, busca evitar uma possível dissidência da Guiné-Bissau. Diante desse dilema, a CEDEAO encontra-se sem uma posição clara contra Embaló, incapaz de impor sanções ou um roteiro externo sem a sua anuência.

Por: Aladje Umaro Bari, Mestre em Sociologia pelo ISCTE-instituto universitário de Lisboa licenciado em ciências políticas e relações Internacionais pela Uni Piaget da Guiné-Bissau

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