sexta-feira, 11 de setembro de 2020

(IN)DEPENDÊNCIA DA GUINÉ-BISSAU: até que ponto somos independentes?



Pretende-se com este artigo de opinião refletir sobre a condição da (in)dependência da Guiné-Bissau e verificar até que ponto o país pode ser considerado independente, buscando empreender série de reflexões críticas sobre os 47 da sua (in)dependência, ou seja, fez-se um balanço crítico e reflexivo desses 47 anos, identificando, de forma sucinta, as conquistas e progressos feitos no âmbito governativo(se houver), assim como os (des)caminhos percorridos, as vicissitudes e os perigos que ameaçam a soberania nacional, a justiça social, a nossa jovem democracia e o desenvolvimento.

Desde a sua independência em 1973 e da sua adesão à democracia liberal, no início da década de 90, a Guiné-Bissau tem vivido inúmeros conflitos políticos e militares, constantes subversões da ordem democrática e golpes de Estado. Considerando esse contexto sócio-político tão conturbado, disfuncional e contraproducente, percebe-se que o país não só está longe do desenvolvimento sustentável e inclusivo, que possa refletir positivamente na vida da população, mas também longe de resguardar os valores democrático-constitucionais. Isso se deve à vulnerabilidade do país e à fragilidade das suas instituições, fazendo com que o Estado não consiga, no mínimo, responder às demandas básicas da sua população, como saúde, educação, justiça, emprego, saneamento básico, distribuição de energia elétrica, construção de estradas, e entre outras.

Assim, uma análise da história política recente da Guiné Bissau mostrará que a classe política guineense tem andado em contramão do desígnio nacional e dos valores defendidos durante a luta de libertação nacional. Ou seja, em termos de política, o que se viu e se vive no país revela-se contraproducente daquilo que o lendário líder da luta pela independência da Guiné e Cabo Verde, Amílcar Cabral, idealizava ao justificar em que se fundamentava a luta de libertação nacional. Naquela altura, Cabral (1974) advertiu o seguinte: “a luta do nosso povo é contra tudo quanto seja contrário à sua liberdade e independência, mas também contra tudo quanto seja contrário ao seu progresso e à sua felicidade”. Portanto, para ele, não faria sentido lutar pela independência se isso não se traduzisse na melhoria de vida da população. Por isso, dizia que a independência era programa mínimo e o desenvolvimento era o programa maior.

No entanto, hoje, trata-se dum Estado com muita vulnerabilidade externa (Estado pedinte/mendigo), sem capacidade de decidir de maneira autônoma qual agenda do desenvolvimento deve ser aplicada. Visto que o Estado nem sequer consegue cobrir as despesas internas (orçamento geral de Estado) com os recursos internos, aliás, não consegue pagar salários por si só, tampouco consegue organizar as eleições com recursos internos. Há quem diga que mesmo para reparação duma escola, manutenção das estradas, hospital ou medicamentos para abastecer redes hospitalares dependem do financiamento dos parceiros internacionais, pois o Estado por si só não consegue dar conta dos serviços básicos.  

 No âmbito jurídico, vê-se a exteriorização dos problemas internos, ou seja, um país cujas soluções para as mazelas e crises que o afetam dependem absolutamente da Comunidade Internacional, ora da CEDEAO ora da ONU, deixando de lado a sua carta magna e as demais leis da república. Por outro lado, importa lembrar que a Guiné-Bissau faz parte daqueles países africanos que ainda estão sendo economicamente monitorados pela França, uma vez que não têm controle da sua própria moeda, dando assim à França o privilégio de ser o único país responsável pela conversão do Franco CFA para Euro e para outras moedas do mundo. Como corrobora N´Krumah (1967), “o controle neocolonialista é exercido através de meios econômicos ou monetários”. 

Em suma, trata-se dum país sem agenda nacional credível e eficaz, sem capacidade interna de produção, quase tudo que se consume lá é importado, vê-se uma forte dependência aos produtos da primeira necessidade vindos do estrangeiro. Como nos adverte Tomas Sankara, “quem te alimenta te controla”.

Devido à situação de precariedade e falta de resposta concreta do Estado às demandas e serviços básicos para a população, impossibilita os guineenses sonhar e projetar o futuro dentro do seu próprio país, fazendo com que a maioria esmagadora dos guineenses residentes no país acreditarem  que a melhor forma de se dar bem na vida ou combater a pobreza que assola o país é através de imigração para a Europa ou para alguns países africanos, nomeadamente Senegal. No entanto, o mais triste e grave nisso tudo é que as elites política e econômica do país procuram melhores serviços de saúde e educação para os seus familiares nesses países, na pior das hipóteses no Senegal. Afinal de que independência se refere? Independência, para quem? Que independência estamos a celebrar? Se estivesse Amílcar Cabral vivo, orgulharia do país que temos hoje? São questões urgentes para refletirmos a respeito da nossa condição de (in)dependência e de subcidadania.

Portanto, a reflexão empreendida nesse pequeno artigo, permite-me inferir que o afastamento físico da presença colonial não se traduziu na possibilidade de país decidir, autonomamente, sobre o seu destino. Não obstante a Guiné-Bissau tornou-se independente há mais de quatro décadas (politicamente falando), continua sendo muito dependente de outros países, principalmente, do seu antigo país colonizador, Portugal. Em outras palavras, “em lugar do colonialismo, como principal instrumento do capitalismo, temos hoje o neocolonialismo” (N´KRUMAH, 1967). Assim, o colonialismo na Guiné-Bissau acabou, se assim podemos dizer, mas continua o neocolonialismo, a “dominação soft”.

 

Nha mantenhas de guinendadi i di luta contra neocolonialismo. Boa reflexão!

Por: Braima Sadjo

Bacharel em Humanidades e Licenciando em Sociologia na UNILAB

Acarape, Ceará, Brasil.

10/09/2020

 

Referências:

CABRAL, Amílcar. PAIGC: Unidade e Luta. Lisboa: Nova Aurora, 1974.

 

NKRUMAH, K. Neocolonialismo: Último Estágio Do Imperialismo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1967.

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