O antigo Presidente timorense José Ramos-Horta e ex-representante da ONU na Guiné-Bissau defendeu que a mudança de perceções sobre drogas poderia promover um "ambiente social e jurídico" mais positivo no país africano, que continua vulnerável ao crime organizado.
Em entrevista à agência Lusa a propósito do novo relatório da Comissão Global sobre Política de Drogas, "The World Drug Perception Problem" [O Problema Global da Perceção das Drogas], da qual faz parte, saudou o facto de Timor-Leste ainda ser pouco afetado por este problema.
"Felizmente em Timor-Leste não temos crime organizado e a ameaça da droga é pequena, possível de ser gerida. Mas a prevenção através de educação e medidas de intervenção antecipada para desmantelar qualquer crime organizado que queira instalar-se em Timor-Leste são absolutamente necessárias", avisou.
Todavia, o antigo representante especial da ONU na Guiné-Bissau lamentou as dimensões humanas, sociais, económicas, políticas e de segurança a nível global, incluindo naquele país lusófono africano.
"Os estados frágeis como a Guiné-Bissau e dezenas de outros são muito vulneráveis ao crime organizado e que são uma verdadeira ameaça ao Estado de Direito, paz e estabilidade", referiu
Ramos-Horta evita apontar responsabilidades sobre a atual situação, onde o consumo e posse de droga continuam a ser penalizados, e questiona a influência dos pequenos traficantes e os efeitos da repressão legal em pessoas que usam drogas, nas famílias e comunidades.
Na sua opinião, "remover os preconceitos da discussão política promove um ambiente social e jurídico mais justo, onde a confiança pode ser reconstruída entre as comunidades mais pobres e marginalizadas e seu governo, e as pessoas que foram rejeitadas podem voltar a fazer parte de uma comunidade nacional".
Ramos-Horta integra desde novembro de 2017 a Comissão, que foi formada em 2011 com o objetivo de promover um debate sobre o modelo internacional de regulação das drogas e a respetiva legislação, considerada repressiva
Convidado feito ex-secretário-geral da ONU Kofi Annan para representar a região da Ásia-Pacífico, disse que esta é uma zona muito grande e diversa no que diz respeito a drogas, desde os regimes repressivos dos países do Golfo às políticas mais liberais da Nova Zelândia e Austrália.
Refere também que é na região que estão os maiores produtores de ópio e meta-anfetaminas do mundo, países com grande taxa de homicídios e sentenças de morte relacionadas com a droga, mas também que abrigam tribos indígenas que utilizam substâncias como kava, canábis e kratom para cerimónias culturais.
"O debate social existe em todos os países, mas o nível e a qualidade da informação que as populações recebem não são neutros. Este é o objetivo deste relatório da Comissão. Estamos a tentar, com base em informação de todo o mundo, passar mensagens simples", afirmou à Lusa.
Embora reconheça o impacto negativo que o consumo de drogas pode ter na vida das pessoas, os autores do documento consideram que as reformas das políticas têm sido difíceis de realizar, projetar ou implementar devido aos preconceitos e valores morais prevalecentes.
O documento procura analisar as perceções e medos mais comuns, confrontá-los com factos disponível sobre drogas e sobre as pessoas que as consomem e, consequentemente, recomendar mudanças que podem ser promulgadas para apoiar reformas para políticas de drogas mais efetivas.
A Comissão é composta por 25 membros com experiência como líderes políticos, científicos e empresariais, incluindo 12 ex-chefes de estado ou ministros, um ex-secretário geral da ONU e três Prémio Nobel.
Entre outros, fazem parte os antigos presidentes de Portugal e do Brasil Jorge Sampaio e Fernando Henrique Cardoso, o empresário Richard Branson ou o antigo vice-primeiro-ministro britânico Nick Clegg.
Nos seis relatórios anteriores, abordou questões como o impacto das políticas atuais nas pessoas e o seu insucesso em reduzir a produção e o consumo de drogas ilegais e em travar organizações criminosas.
Conosaba/Lusa
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