segunda-feira, 24 de agosto de 2015

'OPINIÃO' DO DR. BERNARDO MÁRIO CATCHURA




Caros compatriotas.

Aproveito este momento para, publicamente, mostrar a minha posição técnico-jurídica perante esta situação política que se nos coloca, com base na minha interpretação dos preceitos constitucionais. 

Aos 12 dias do mês em curso, através do decreto presidencial nrº 05/15, o PRESIDENTE DA REPÚBLICA (doravante PR) com base no artigo 68.°, Alínea g) da CRGB, demitiu o executivo liderado pelo Engª. Domingos Simões Pereira. De acordo com o plasmado nesse dispositivo consta que, “o presidente da república pode demitir o governo em caso de grave crise política que ponha em causa o normal funcionamento das instituições da república, ouvido o conselho de estado e os partidos políticos com assento parlamentar”. 

Entretanto, podemos perguntar o que é, afinal, uma grave crise política? 

R: a grave crise política é uma situação difícil e grave que pode comprometer o desenvolvimento/ andamento ou a continuidade de um processo político. Que nesta situação em concreto está em causa o mau relacionamento entre o PR E PM (primeiro ministro). Sendo assim, uma vez demitido o governo constitucionalmente, o PAIGC tem direito e dever (estatutariamente) de indicar o nome de outra pessoa para ocupar o cargo do PM, que, na minha opinião, não deveria, ser o nome da mesma pessoa, líder do governo demissionário, uma vez que se trata das relações intersubjectivas.

Pode argumentar-se em defesa, que não deveria estar em causa as relações pessoais, mas sim institucionais…. Diria que nunca existiu e existirá um relacionamento bom, em circunstâncias nenhumas, entre as instituições, se a relação humana entre as pessoas que lideram as duas instituições não se dão bem. Portanto, um terá que não continuar, para se salvaguardar os interesses comuns. 

Ora, no que tange ao decreto nrº 06/15, de nomeação do novo PM, Bacio Dja, nos termos da alínea g) do artigo 68º e 70º da CRGB, pelo PR, sem que seja o nome indicado pelo seu partido e sem que sejam ouvidas as forças políticas representadas na ANP. 

A minha posição é seguinte: 

O decreto, nrº 06/15, de nomeação do PM é formalmente inconstitucional. 

Mas, embora seja inconstitucional, em nenhum preceito constitucional consta que o PR deve solicitar o partido vencedor para indicar o nome do PM. Na CRGB consta apenas que, o PR nomeia e exonera o PM tendo em conta os resultados eleitorais e ouvidas as forcas políticas representadas na assembleia nacional (não foram ouvidas). O que quer, com isso, significar que o PM a ser nomeado pelo PR, deve pertencer o partido com a maioria parlamentar, que nesse caso é o PAIGC, vencedor das eleições legislativas e ouvidas as forças politicas com assentos no parlamento e só…. 

Do ponto de vista técnico diria que existe uma lacuna constitucional em relação a posição da pessoa, no seio do seu partido, a nomear, para ocupar o lugar do PM, pelo PR, deixando assim uma margem de manobra ao titular do direito de nomeação. 

Atenção! 

Essa margem de discricionariedade não justifica um "mar de rosa" concedido ao PR, pelo que o intérprete aplicador do direito deverá recorrer aos estatutos do partido vencedor das legislativas para proceder essa nomeação. Isto é, estatutos do PAIGC que pela inerência é o seu presidente que, exactamente coincide com o PM demissionário. 

Bem, se considerarmos que há impedimento/ impossibilidade de relacionamento institucional causada pelo mau relacionamento entre o PM demissionário e PR, o mesmo partido deverá indicar o seu substituto, não fazendo isso o PR pode nomear um dos vices presidentes, podendo assim ser por ordem decrescente (1°vice, em caso da impossibilidade, 2°, 3°, e assim sucessivamente) ouvindo as forcas politicas representadas na ANP. Ora não obedecida a determinação constitucional (audição das forças politicas representadas na ANP) o decreto padece de vício de inconstitucionalidade formal.

Porém, não deixará de se colocar um problema de ordem política, que tem a ver com o facto de que, não sendo o PAIGC que indicou ao PR o nome do Baciro Dja, este pode confrontar-se com a falta de apoio parlamentar suficiente para fazer passar o programa do seu governo. É por isso que a audição dos partidos políticos com assento parlamentar antes de nomeação do PM, no contexto da configuração de poderes na Guiné-Bissau, é indispensável, a fim de o presidente assegurar-se que o primeiro-ministro que pretende nomear não encontrará bloqueios no parlamento. Não sendo o caso estamos perante um erro politica e jurídico (inconstitucionalidade formal) bastante grave do presidente da república na medida em que isso acabará por conduzir a dissolução do parlamento, coisa que é absolutamente inoportuno no contexto actual, na medida em que o país terá dificuldades de obter meios que o permitam realizar eleições dentro do prazo.

Alias, se haver dissolução do parlamento, abrir-se-á um novo debate jurídico, de se saber se as eleições legislativas decorrentes da dissolução do parlamento devem realizar-se dentro de determinado prazo, ou se isso ficará ao critério do presidente.

Bernardo Mário Catchura

Licenciado em Direito pela faculdade de Direito de Bissau

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