terça-feira, 1 de setembro de 2020

Constitucionalista guineense: GUINÉ-BISSAU ESTÁ A CAMINHAR PARA O PRESIDENCIALISMO MITIGADO

O constitucionalista guineense e docente universitário defendeu, esta terça-feira, que em termo da proposta do conteúdo do projecto da revisão constitucional, adoptado pelo presidente da República, o país está a caminhar para o presidencialismo mitigado.

Na semana passada, comissão técnica de revisão constitucional apresentou oficialmente, ao chefe de Estado, Umaro Sissoco Embalo, o projecto da revisão constitucional e dia depois, o Presidente Embalo, afirmou que a única proposta da revisão Constitucional que vai ser aplicada no país é a quele que recebeu da comissão técnica instituída por ele.

Em entrevista à rádio Sol Mansi, Henrique Augusto Pinhel, justifica a sua tese afirmando que com o conteúdo do projecto, o país passará a ter um primeiro-ministro executor das ideias do presidente da República

“Se vejamos em termo de conteúdos de normas constitucional que estão a ser revido, estamos a caminhar para o presidencialismo mitigado, o que significa que em termos jurídico-constitucional, o presidente da República passa a ser o chefe de Estado e chefe do Governo, porque passa a presidir o conselho de ministros e passamos a ter um primeiro-ministro executor das ideias do presidente da República, ou seja, na prática não temos um primeiro-ministro”. 

Em relação a nomeação do primeiro-ministro, que de acordo com a proposta o presidente pode nomear ou exonerar "tendo em conta os resultados eleitorais com existência ou não de força política maioritária que garanta estabilidade governativa e por coligações ou alianças, depois de ouvidos os partidos políticos representados no parlamento, o constitucionalista, defende a revisão do artigo 104 para evitar os constantes derrubes do governo pelo belo prazer do chefe de Estado.

“Era preciso, rever o artigo 104, para que o Governo seja derrubado só se haver a moção de censura, sem essa, o governo não pode ser derrubado, isso permitiria a estabilidade política governativa, porque o presidente da República não pode pelo seu belo prazer derrubar um governo alegando grave crise política”, sublinha o constitucionalista e docente na universidade.

A proposta de projecto de revisão Constitucional prevê a criação de um Tribunal Constitucional, que passará a dar posse ao Presidente da República. Ainda em relação ao presidente da República, a proposta refere que só pode ser candidato ao cargo quem tiver "residência permanente no território nacional nos cinco anos antes da data de apresentação da candidatura", o que para o politólogo guineense e analista dos assuntos políticos da rádio Sol Mansi, Rui Jorge Semedo, é muito grave esta separação porque restringe os guineenses na diáspora.

“Quando temos um projecto de Constituição da República da Guiné-Bissau que prevê a separação e restringe os guineenses na diáspora a liberdade de ter o mesmo direito com os que estão aqui é muito grave. Este projecto, já tinha dito e repito, enquanto cidadão não enquadra dentro daquilo que é o espírito da República da Guiné-Bissau. Para ser mais explicito, a proposta apresentado é pior do que quando estamos num contesto do partido único, se fazemos agora uma observação comparada entre várias constituições dos países da CEDEAO (Comunidade Económica dos Estados da Africa Ocidental) ou do espaço lusófono (países com a expressão portuguesa), não vai encontrar nenhuma constituição com esta proposta tão agressiva ou que usurpa todas as outras competências dos outros órgãos (da soberania) atribuindo ao presidente da República”, criticou.

O politólogo aponta igualmente a elaboração de uma constituição mais maleável para tirar o país na situação que se encontra, caso contrário pode se criar maior possibilidade de existência de conflito que não vai permitir a consolidação do estado de direito democrático

“É preciso elaborar uma Constituição da República mais maleável, uma Constituição da República que vai permitir um diálogo institucional, mas sobretudo, que cria um espaço de interindependência institucional, avançando logo com o princípio da concentração de poderes nas mãos do presidente da República. Assim, vai se criar maior dificuldade de existência de conflitos, ou seja, a Guiné-Bissau mesmo fazendo a reforma constitucional tecnicamente e de ponto de vista prático, não vai permitir o país transitar para consolidação das instituições. Temos que aprender progredir, quando fazemos a reforma é para progredir não para retorcer e quando fazemos para retroceder estamos a criar as condições de agudizar a luta pelo poder e ao mesmo tempo permitir para que temos maior confronto em que as pessoas vão continuar a recorrer aos comportamentos extra constitucional”, aconselha. 

A referida proposta do projecto de revisão constitucional reforça os poderes do presidente, que passa a presidir o Conselho de Ministros, Conselho Superior de Defesa e o Conselho de Segurança Nacional. 

Comissão parlamentar estranha a iniciativa de Umaro Sissoco Embalo

Entretanto, ontem (31/08), em entrevista telefónica com o presidente da Comissão Eventual de Revisão Constitucional da Assembleia Nacional Popular, diz estranhar a decisão do presidente da República, em avançar com o projecto da revisão constitucional pela comissão criada pelo próprio.

De acordo com o deputado, João Seidiba Sane, que se encontra no estrangeiro desde Janeiro por questões de saúde, “a única instituição competente para criação do projecto da revisão constitucional é Assembleia Nacional Popular, e ele já criou uma comissão que está a trabalhar”.

Questionado sobre a caducidade da comissão criada desde a IXª legislatura, Seidiba Sane, disse que “a plenária da ANP reconduziu a comissão através de uma deliberação que também autoriza o preenchimento das vagas que foram deixados pelos membros [deputados] que não foram eleitos nesta Xª legislatura”.

Por: Braima Sigá/radiosolmansi com Conosaba do Porto

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