segunda-feira, 21 de agosto de 2017

«OPINIÃO» "A PROPÓSITO DOS GUINEENSES ESCRAVIZADOS NA LÍBIA" - DR. JULIÃO SOARES SOUSA


Fico muito triste com estas notícias. Sobretudo, quando sinto e noto uma certa letargia por parte das autoridades guineenses em não protegerem os seus concidadãos por este mundo fora. Por vezes até me dá a sensação de que têm vergonha de assumirem as suas responsabilidades perante situações dessas. 

O guineense comum começa a ficar cansado de notícias envolvendo os seus compatriotas e sobretudo da letargia das instituições estatais, perante situações verdadeiramente desumanas como aquela que assistimos na Líbia e que, infelizmente, ocorrem também noutros países. Essas situações começam a ser muitas e recorrentes: com os estudantes guineenses na Rússia, no Brasil, etc, etc. 

Mas alguém pode ter vergonha ou complexo em não assistir aos seus irmãos apenas porque voluntária ou involuntariamente decidiram emigrar? Para mim a maior vergonha é a de um ministro (qualquer que ele seja) que visita um país estrangeiro e não é recebido pelo seu homólogo, mas por um funcionário de segunda ou terceira categoria do país visitado. 

A maior vergonha é quando são barrados nos aeroportos deste mundo. Mas a maior de todas as vergonhas é quando um país não consegue criar condições, internamente, para que os nossos compatriotas não tivessem necessidade de se sujeitarem a todas as espécies de humilhações neste mundo. Espero não estar equivocado, mas estou em crer que na cabeça maldosa de alguns perpassa seguramente a ideia de que as vítimas da Líbia (não sei porquê, mas enquanto escrevia este artigo também veio-me à memória persistentemente Marrocos), da Rússia ou do Brasil é que escolheram esse caminho. Mas, independentemente do juízo (perverso ou não) que se possa fazer sobre o assunto, também muitos de nos temos o direito de perguntar se o Estado guineense tem cumprido o seu papel ao longo dos anos, sobretudo na sua prerrogativa de proteger os seus cidadãos dentro e fora da nossa terra. Aliás, se os cidadãos guineenses gozam constitucionalmente dos mesmos direitos e deveres (quer vivam dentro ou fora) não faria sentido nenhum que o Estado não assumisse o seu papel perante eles. Da mesma forma como espera os seus votos aquando das eleições. 

E o guineense que escolheu viver fora do seu torrão natal deve sentir essa proteção, evitando aquela sensação que muitas vezes e em diferentes momentos nos atravessou o pensamento e a nossa alma de guineenses radicados no estrangeiro de que somos apátridas. Tem havido muitos abusos sobre os nossos compatriotas. Hoje muitos andam desorientados, confiscados pela desesperança relativamente ao futuro da sua Pátria. Outros até de cabeça vergada. 

Não foi isso o que nos ensinou a história ainda recente da nossa terra. A luta que fizemos contra o colonialismo foi para todos (homens, mulheres e crianças) andarem de cabeça levantada, livres e sem complexos de nenhuma espécie. Em qualquer parte deste mundo. Com o orgulho que nos deveria caracterizar como povo e como país a esta hora já deveria estar a caminho da Líbia uma delegação de alto nível da Guiné-Bissau para se inteirar da situação e resgatar os nossos compatriotas. 

E sobre isso (e outras situações similares) todos os guineenses deveriam pôr-se de acordo, porque isso sim, é também uma matéria de interesse nacional. E já agora, por falar em matéria de interesse nacional, numa altura em que se aguarda com expectativa o desfecho relativamente ao famigerado (para não dizer desventrado) acordo de Conakry gostaria muito de ouvir falar também da marcação de eleições legislativas que deverão ter lugar em meados de 2018. Já vai sendo tempo para isso.


Julião Soares Sousa

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