Kecói Queta
É já comum falar-se de formação em geral, e de dirigentes desportivos em particular.
Podemos mesmo afirmar, que se trata de um assunto politicamente correcto. Não existe ninguém que ponha isto em causa, Somos um país onde carece a formação a todos os níveis e em particular no que diz respeito à formação dos agentes desportivos. Se juntarmos a isto o facto de na formação dos agentes desportivos a formação de dirigentes ser a que é menos contemplada, podemos afirmar que estamos perante um cenário realmente desolador.
Antes de falar sobre a formação dos dirigentes desportivos, convém esclarecer algumas questões:
Será mesmo necessária a formação dos agentes desportivos, pelo menos da forma como vem sendo (em alguns raros casos) efetuada? Se esta for necessária, qual a melhor forma de o fazer? Quais são as necessidades de formação?
Para além deste conjunto de questões, outras se colocam de forma mais caracterizante, ou seja: A formação deverá ser igual para todos os dirigentes desportivos? Para os benévolos e para os profissionais? Para os eleitos e para os não eleitos? Para os que ocupam altos cargos de decisão e para os que são meros gestores de pequenas secções?
Durante esta exposição tento dar a minha opinião sobre este conjunto de questões, havendo, no entanto, outras que terão de ser remetidas à reflexão de todos os que de alguma forma estão envolvidos com às questões da formação, em particular da formação dos agentes desportivos.
A importância da formação:
Vou contar aqui, uma pequena história que s e passou comigo e com um velho amigo tio dirigente desportivo, que já anda nestas ”andanças” ainda eu usava fraldas. Quando confrontando com algumas questões sobre a necessidade de fazer alguma acção de formação, este meu “velho amigo”, respondeu-me com ar de espanto e incrédulo: “… formação para quê? Eu já ando nisto à mais de 40 anos e nunca precisei de formação nenhuma! Agora é que andam para aí com essa manias, mas que eu saiba, sempre houve clubes e sempre existiram dirigentes e muitos deles com muito sucesso, o que é preciso é pessoal com gosto e vontade de trabalhar, pessoal que não queira ficar em casa a ver telenovela ou, filme indiano e venha, como eu, aqui para o clube todos os dias sem ganhar um tostão ao fim do mês.
É evidente que para este meu tio amigo, é difícil perceber a importância da formação, num sector onde a tradição nesta área é praticamente inexistente e onde a grande maioria das pessoas trabalham muito e de forma perfeitamente benévola.
Gostaria a propósito disto de citar um breve espaço sobre esta questão, pública pela DGD em 1998:
Se aceitamos noutros campos da actividade porque não também no desporto?
“O associativismo desportivo tem um papel preponderante no desenvolvimento e consolidação do desporto nacional.
Clubes, associações e federações desportivas deparam-se hoje com um conjunto de desafios que tornam a sua intervenção cada vez mais complexa, designadamente associados mais exigentes e menos disponíveis para colaborar, crescente competitividade em financiar os respectivos projectos.
Como consequência, a dinamização das vontades colectivas e mobilização sustentada de recursos comunitários em torno de um projecto desportivo, exigem de quem dirige estas organizações, um leque alargado cada vez mais diversificado de saberes e competência que é urgente desenvolver ”
É indiscutível que a forma de gerir uma associação desportiva, seja qual for, não poderá ser, nos dias de hoje, a forma que foi utilizada durante anos pelo meu “velho tio amigo”, mesmo que no passado possa ter tido grandes sucessos. Os desafios de hoje são outros, as exigências são outras, e tal como na formação dos outros agentes desportivos (atletas, treinadores, árbitros, etc.) é impensável inexistência de formação, assim terá que ser no que respeita aos dirigentes.
Os modelos
Falar de formação, é algo abstracto e demasiado abrangente. Convém pois, especificar um pouco mais o que entendo por formação de dirigentes desportivos.
Antes de mais, convém fazer uma breve caracterização deste tipo de agente desportivo, que encerra em si uma heterogeneidade tal, que se torna um desafio enorme a sua caracterização.
Por uma questão de tempo, vamo-nos cingir aos dirigentes profissionais preconizamos um modelo de formação universitária ou profissional, tal como nos outros sectores da sociedade.
Resumidamente pode-se caracterizar os dirigentes benévolos, como sendo alguém que fez seu percurso desportivo, como praticante, treinador, árbitro ou simplesmente espectador e que em determinado período da sua vida resolveu dedicar-se ao dirigismo, normalmente por volta da “meia- idade”, quando é possível alcançar alguma estabilidade familiar e profissional. São normalmente, pessoas movidas por grandes paixões associadas as modalidade, clubes ou associações, que dispões de algum tempo para dedicar a essas actividades.
Se a este nível é relativamente fácil, traçar um perfil da maior parte dos dirigentes, já no que diz respeito, a questões como seja: a habilitação literária, o nível socioeconómico e a profissão, devido à grande heterogeneidade existente, é difícil traçar um perfil correcto sendo precisamente esta características de diversidade que deverá ser tida como referência. Perante este panorama, então qual será o melhor modelo de formação para estes dirigentes? Quais as suas necessidades reais de formação? Qual a sua disponibilidade para a formação?
Tal como diz Jorge Miuez Araújo (1992), “ sendo ilusório pensar-se o dirigente como um “super-homem” especialista em todas as áreas do conhecimento presentes no funcionamento de uma organização, parece-se que o seu perfil se deve aproximar do que denominamos de “um utilizador esclarecido”, capaz de formular na sua complexidade os problemas com que se vê confrontado e integrar as contribuições de cada uma das áreas de conhecimento.
Torna-se evidente, que tratando-se de uma área de actividade benévola, o tipo de formação terá que sofrer os constrangimentos próprios deste tipo de actividade, ou seja, a formação terá que ter um carácter contínuo, mas incidir no que é estritamente fundamental para a melhoria da qualidade da intervenção, não podendo ter a veleidade de formar especialista no que seja, a não ser na sua própria intervenção, potenciando e melhorando qualitativamente todos os conhecimentos adquiridos ao longo dos vários anos de actividade.
“Um dos objectivos do desporto para os próximos dez anos deverá ser o de criar estruturas para a formação continua dos seus dirigentes (…) mais bem adaptado à organização deste tipo de ações de formação.
(…) Pensamos que a açaõ de formação contínua não tem como fim dar ao dirigente conhecimentos especializados em áreas como o direito, a gestão, a fiscalidade, regulamentação, etc. Claro que é necessário transmissão de conhecimentos mínimos e gerais, para que em cada sector, possa ser avaliado o tipo de problemas a dar aos problemas que se colocam, sendo que a complexidade acrescida deste domínios do conhecimento torna obsoleta qualquer ação de formação contínua de tipo enciclopédico. Para além do mais, esses conhecimentos estão hoje em dia disponíveis sob a forma de documentação escrita, audiovisual, etc.
Pelo contrário o que faz falta ao dirigente é uma formação metodológica, que lhe permite utilizar as suas competências no melhor interesse de associações.”
Estas afirmações, não invalidam a existência de açoes de formação esporádica (seminários, colóquios, etc.) , as quais irão permitir suprir algumas lacunas da formação contínua ou fornecer conhecimentos mais direcionados e especializados. No entanto, a questão fundamental reside na formação contínua, que deverá ser enquadrada por níveis a exemplo de que é feito por outros agentes desportivos.
Penso ser evidente, que as necessidades de formação para um presidente de uma federação não serão as mesmas das de um responsável por uma secção de um clube. Não quero dizer com isto que um é mais importante que o outro, apenas reafirmar que as necessidades de formação, embora com pontos comuns, terão que ser efetuadas com objetivos específicos. Torna-se, pois, urgente definir um Plano de Formação Nacional de Dirigentes Desportivos, devidamente enquadrado na legislação, a que chame a si a participação de todos quantos estão envolvidos neste processo, repartindo as responsabilidades e competências pela Administração Pública Desportiva e pelo Movimento Associativo. Plano de Formação esse, que permita a participação efectiva e voluntária de todos os dirigentes e que forneça ferramentas úteis para a melhoria da intervenção nas áreas de gestão, de administração mas também da área desportiva, indo da formação da alta competição, tendo por objetivo último a formação do individuo, não numa perspectiva meramente técnica, mas acima de tudo social, uma vez que cada individuo se encontra ao serviço de uma instituição desportiva.
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