Julião Soares Sousa, historiador guineense ligado ao centro de estudos interdisciplinares da Universidade de Coimbra © Liliana Henriques / RFI
A Guiné-Bissau comemora no próximo dia 24 de Setembro os 50 anos da sua independência. Neste quadro, a RFI propõe até domingo uma série de reportagens e entrevistas alusivas à História do país e em particular ao período da luta de libertação. Hoje, no primeiro episódio desta série, debruçamo-nos sobre o passado do território do que viria a ser a Guiné-Bissau, antes da chegada dos portugueses em meados do século XV.
Para evocar este aspecto, a RFI conversou com Julião Soares Sousa, historiador guineense ligado ao centro de estudos interdisciplinares da Universidade de Coimbra e também com Mamadu Jao, investigador e antigo director do INEP, Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa da Guiné-Bissau.
Mamadu Jao, antigo director do INEP © Liliana Henriques / RFIAo sobrevoar de forma geral a História da Guiné, Mamadu Jao recorda que "alguns dados nos dizem que no momento da chegada dos europeus, portugueses principalmente portugueses, aqui na zona da actual Guiné-Bissau. Esta região já era habitada por várias populações, vários grupos étnicos integrados no contexto histórico em diferentes entidades sociopolíticas. O território da actual Guiné-Bissau fazia parte do grande império do Mali, através de algumas províncias e, mais tarde, através do império de Gabu".
Efectivamente, a partir dos elementos arqueológicos recolhidos até agora, o que se sabe é que a região onde se insere a Guiné-Bissau era habitada por inúmeros povos, nomeadamente os Felupes, os Manjacos, os Mancanhas, ou ainda os Balantas. A Nação da Guiné-Bissau que continua hoje a ser múltipla, não existia ainda com os contornos territoriais e de identidade própria que se conhecem actualmente, como o historiador Julião Soares Sousa.
"A Guiné-Bissau, antes da chegada dos portugueses, era um território que não existia tal como o conhecemos hoje. A Guiné-Bissau era um território enquadrado num âmbito geográfico que integrava vários impérios, nomeadamente o império do Mali e o império do Gana. Portanto, ele não existia como entidade autónoma com as fronteiras que nós conhecemos hoje que são fronteiras que começaram a ser aplicadas a partir de 1884-85, aquando da Conferência de Berlim, os tratados que lhe sucederam, com a França (com a qual Portugal esteve envolvida em disputas territoriais nessa região). Era um território muito mais amplo que incorporava vários territórios que nós conhecemos hoje como o Senegal e a Gâmbia", sublinha o investigador.
Questionado sobre a diversidade de culturas existentes num país tão pequeno, com mais de vinte etnias diferentes, Julião Soares Sousa refere que ela "se deve um pouco à grande mobilidade que houve na região, sobretudo com o avanço da desertificação, muitas populações escolheram as zonas litorais para se fixarem nomeadamente junto aos cursos de água. É assim que vemos o povoamento da zona ao longo do rio Senegal, o povoamento ao longo do rio Gâmbia e também ao longo dos quatro rios que a Guiné possui."
Os portugueses e restantes europeus que chegaram àquela região, não entraram por conseguinte em terreno virgem e o contacto com as populações locais foi, logo de início, marcado pela tensão e até a violência."Temos tendência para pensar que os contactos, quando eles chegam, são abraços, se calhar beijos. Não foi, porque foi, de facto, um encontro muito tenso. Um dos navegadores, por exemplo, Nuno Tristão, foi morto ali na costa da Guiné", refere o historiador Julião Soares Sousa. "Naturalmente que houve aí um contacto intenso, mas que depois deu origem à fixação de alguns desses europeus, nomeadamente portugueses; essa fixação que depois se transforma na colonização que nós conhecemos sobretudo a partir do século XIX, que foi muito mais intensa do que antes", conclui o universitário.
Conosaba/rfi.fr/pt
Sem comentários:
Enviar um comentário