À entrada do sexto ano na Casa Branca, Barack Obama proferiu na quarta-feira novo discurso do Estado da União. Prometeu aumentar o ordenado mínimo, forçar a aprovação de uma nova lei de emigração e expandir a rede pública de ensino préprimário, lembrando que, até final do ano, termina a Guerra no Afeganistão e o “ciclo do medo” pós 11 de Setembro.
“E com o fim da Guerra no Afeganistão, é altura do Congresso ordenar o fecho de Guantánamo. O combate ao terrorismo não deve ser feito apenas com meios militares, mas também por nos mantermos fiéis aos nossos princípios constitucionais, servindo de exemplo para o resto do mundo”, afirmou Obama.
Uma hora antes, e no estrito cumprimento do protocolo, um sorteio na Casa Branca ditava que o lusodescendente Ernest Moniz, o secretário da Energia, fosse o “Designated Survivor”. O título traduz-se no seguinte: em caso de catástrofe durante a cerimónia, no edifício do Congresso (atentado terrorista, por exemplo), Moniz assumiria a Presidência.
Como até final da noite tudo correu bem, Moniz permaneceu tranquilo em casa, nos arredores da cidade de Boston.
MAIS TRÊS DÓLARES POR HORA DE TRABALHO
Em Washington, Obama estendeu a mão à oposição republicana, maioritária na Câmara dos Representantes (câmara baixa do Congresso), mas recordou que se as suas conversas ao telefone não tiverem resultado e o impasse se mantiver sobre algumas das propostas legislativas, ele usará a sua caneta para assinar ordens executivas e forçar políticas.
Apesar do recado, o chefe de Estado lembrou os sinais positivos, nomeadamente o acordo entre democratas e republicanos, no final do ano passado, sobre um novo orçamento.
“É tempo de criar emprego e não novas crises. Vamos fazer de 2014 um ano de acção”, disse. “A China já não é o melhor país para investir no mundo, mas sim os Estados Unidos.
Vamos tornar 2014 um ano ímpar para a América. Estamos mais preparados do que qualquer outra nação à face da terra. Perante isto, o Congresso deve perguntar: vamos ajudar ou bloquear este progresso?”.
Como forma de promover o crescimento, Barack Obama revelou o aumento do ordenado mínimo de 7,25 dólares (5,3 euros), por hora de trabalho, para 10,1 dólares (7,3 euros). A medida aplica-se em exclusivo aos funcionários públicos do Estado central. “Desde que, no ano passado, pedi um aumento do salário mínimo, vários estados decidiram fazê-lo independentemente, assim como algumas empresas”, afirmou o líder americano, ao mesmo tempo que apontava para um funcionário da “Punch Pizza”, uma pizzaria de Chicago.
“Nick é o homem que faz a massa e devo dizer que ele agora tem mais massa no bolso, depois do patrão lhe ter aumentado o salário para dez dólares por hora”, recordou. “Peço ao Congresso que siga o exemplo da Punch Pizza e faça o que for possível para aumentar os salários. É bom para a Economia. É bom para a América”.
A seguir às palavras, surgiu o anúncio: “Enquanto Chefe de Estado assinarei, nos próximos dias, uma ordem executiva que determina o aumento do salário mínimo para 10,1 dólares por hora. Convido o Congresso a apoiar nova legislação que expanda o aumento para o resto do país. Dêem um aumento à América”.
ROMNEY REGRESSA E CRITICA
Obama Mitt Romney, o rival republicano de Obama nas presidenciais de 2012, reagiu por antecipação ao anúncio do aumento do ordenado mínimo.
“Porque não aumentar para 20 dólares? O preço dos produtos irá encarecer devido ao aumento do preço do trabalho”, disse Romney ontem à tarde, no programa de Neil Cavuto, um perito em economia do canal de televisão Fox News.
“O que eu gostaria de saber é o seguinte: quantos funcionários do Estado central ganham o ordenado mínimo? Não há muitos. Além disso, a ideia de que estes funcionários irão ganhar mais do que os contribuintes que trabalham no sector privado parece-me perigosa”, explicou.
Sobre este ponto, numa curta entrevista ao Expresso, Iain Murray, vice-presidente do organismo “Competitive Enterprise Institute” (conservador e adepto da limitação do papel do Estado), afirmou: “Hoje a América está dividida entre os que trabalham no sector privado e os que trabalham no sector público. Os primeiros têm emprego para a vida e pensões garantidas. Os segundos estão à mercê de uma administração que tornou os benefícios mais caros e restringiu o acesso ao crédito com mais burocracia. Esta é a desigualdade na América do Presidente Obama”.
Fim da guerra no Afeganistão Obama recheou o discurso com referências às forças armadas americanas e ao seu esforço de Guerra.
Recordou que, quando chegou ao poder, mais de 180 mil soldados americanos serviam no Iraque e no Afeganistão. “Hoje já não temos ninguém no Iraque e mais de 60 mil regressaram do Afeganistão, onde, até final do ano, terminará a guerra mais longa da nossa história”.
Apesar do entusiasmo em redor da retirada, republicanos e alguns militares alertam para o resultado dessa decisão.
“Tal como no Iraque, os Estados Unidos reclamam vitória no Afeganistão, mas apenas para conseguir condições para uma retirada, sem verdadeiramente alcançar os objectivos políticos de paz e estabilidade”, afirmou, ao Expresso, Matthew Ho, antigo Marine e funcionário do Departamento de Estado americano.
“Desde que Obama tomou posse, a violência e a corrupção no Afeganistão aumentaram. O tráfico de ópio cresceu e as eleições e que se realizaram foram uma fraude. Militarmente, não derrotámos os insurgentes e os Talibã fortaleceram-se devido às ajudas financeiras de outros países com interesses na região”, denunciou Ho. Ainda em matéria de política externa, Barack Obama reconheceu que a Al Qaeda mudou, expandindo-se para outros países. Na Síria, por exemplo, o Presidente americano promete apoiar a oposição que rejeite o radicalismo islâmico.
Sobre o Irão avisou o Congresso americano que vetará qualquer proposta de novas sanções, com receio de comprometer as negociações com aquele país sobre o programa nuclear.
TRATAR DOS 12 MILHÕES DE EMIGRANTES ILEGAIS
Obama dedicou pouco tempo à reforma do sistema de saúde, que teve partes temporariamente suspensas e contou com um processo de registo caótico, por culpa de um site que não funcionou durante meses a fio.
Usou a mesma discrição quando comentou o programa de vigilância da Agência Nacional de Segurança (NSA, sigla em inglês), voltando a prometer que tudo fará para que o direito à privacidade dos americanos seja respeitado. Ambos os temas têm fragilizado a administração Obama, que conta com registos de popularidade pouco acima dos 40%.
Após o Senado ter aprovado este ano uma reforma da lei de emigração, projecto que esbarrou na Câmara dos Representantes, Obama insistiu para que a proposta chegue o mais rapidamente à sua secretária.
“Vamos avançar este ano. O impacto desta medida é notável. Calcula-se que a legalização destes milhões de pessoas produza um incremento de um bilião de dólares (730 mil milhões de euros) na economia americana, ao longo dos próximos 20 anos”.
Sem comentários:
Enviar um comentário