sexta-feira, 14 de dezembro de 2018

EM ENTREVISTA À FINANCIAL AFRIK, DSP REVELA O PROFUNDO CONHECIMENTO QUE TEM SOBRE GUINÉ-BISSAU E DA NOSSA SOCIEDADE

Impressiona o domínio acerca da nossa história e a visão de futuro para a resolução dos problemas mais urgentes.

PAIGC - A força que vem do povo!

A Financial Afrik encontrou Domingos Simões Pereira, presidente do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC). O ex-Primeiro Ministro da Guiné-Bissau apresenta um diagnóstico técnico, antropológico e político sobre seu país, uma joia da natureza exposta aos ventos da instabilidade causada pelo adiamento das eleições e por disputas entre as lideranças. Para esse tecnocrata, a ruptura é uma possibilidade. Eis a entrevista:

Financial Afrik – Senhor Primeiro Ministro, como fazer com que a Guiné-Bissau saia de uma situação de instabilidade que parece ser crônica?

DSP – A sua pergunta é complexa. Para mim, que, por parte de mãe, sou Balanta e Mandinga, e, por parte de pai, Banhum e Cassanga, posso lhe afirmar que a Guiné-Bissau profunda deseja a mudança. A nova geração também deseja ainda mais a mudança e a prosperidade. O nosso herói, Amílcar Cabral, foi um homem além de seu tempo, ao defender «Unidade e Luta», o lema do PAIGC (Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde). É forçoso dizer que, apesar das atitudes, ainda não houve um trabalho de reconciliação na Guiné-Bissau. Pensávamos que todos os problemas do país seriam resolvidos com a saída dos portugueses. Mais de quarenta anos depois, os problemas permanecem e pesam sobre a coesão social.

Financial Afrik – Por que, quatro décadas após sua independência, Portugal continua a ser um parâmetro na política guineense?

DSP – Os factos históricos não desaparecem da noite para o dia. Os portugueses aportaram às costas da Guiné-Bissau nos anos 1400. Os colonos encontraram os nativos, os brames, em seguida os mandingas e, progressivamente, os fulas, em territórios cujas fronteiras eram fluidas. A colonização portuguesa teve a particularidade de ter se limitado, no caso do meu país, a uma abordagem comercial, carente de uma visão administrativa e, eu diria, sem uma verdadeira ambição de dominação política. A primeira preocupação do invasor foi construir fortes para se proteger (o de São José foi famoso) e de negociar, formando alianças com determinados grupos.

Financial Afrik – Como se explica que a instabilidade política seja quase uma regra na Guiné-Bissau?

DSP – Nem sempre foi assim. Até o final dos anos 1970, o país era considerado uma ilha de estabilidade, enquanto a guerra civil explodia em Angola e Moçambique. Mas, como diz o ditado, do passado se tiram lições para o presente. Nós proclamamos a nossa independência em 24 de setembro de 1973. Mas, ao se retirar, a potência colonial lançou as sementes dos conflitos futuros.

Financial Afrik – O seu partido, o PAIGC, poderá reconciliar os guineenses e conduzi-los em direção ao desenvolvimento económico e social?

DSP – Não tenho a menor dúvida. No entanto, precisamos romper com os métodos do passado. Tradicionalmente, um bode expiatório era escolhido e acreditava-se que a mudança seria para melhor. Mas mudar um país envolve questões estruturais, planeamento estratégico e uma dinâmica. A história sofrida do nosso país engendrou fenómenos sociais e reflexos que tornaram ainda mais complexa a especificidade do tecido social da Guiné-Bissau.

Será necessário levar em conta, como dizia Cabral, as nossas estruturas tradicionais de poder, verticais entre grupos muçulmanos e horizontais entre os Balantas e as outras tribos. O colonizador soube explorar essas diferenças, para se impor. Além dessas estruturas tradicionais, há a ligação dos guineenses com o exército. Os Balantas forneceram o grosso das tropas durante a guerra de libertação, mas não desenvolveram mecanismos de relacionamento com o poder.

Na independência, a Guiné-Bissau tinha apenas 14 estudantes e um contexto de violência criado por onze anos de guerra. Nos anos 1990, a alternância política resultou numa vontade de despolitizar o exército e desmilitarizar os partidos políticos.

O tempo nos mostra: qualquer visão de longo prazo requer paz social e estabilidade. Esses são os ingredientes necessários para restaurar a confiança entre a Guiné-Bissau e suas parceiras e estabelecer um programa harmonioso de desenvolvimento. O impacto social, a inclusão e o desenvolvimento humano são os três eixos do nosso programa.

Financial Afrik – A incerteza quanto à data das eleições legislativas não é um sinal de que a Guiné-Bissau ainda não chegou ao fim do túnel?

DSP – É verdade. Há alguma incerteza em relação a estas eleições. Sobre essa questão, o nosso partido compartilha integralmente as resoluções do acordo de saída da crise da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) acordadas em Março de 2018 e que estipulam que as eleições sejam realizadas, no mais tardar, antes do fim de 2018. Apoiamos o roteiro de saída da crise.




Conosaba/faladepapagaio/Aliu Cande

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