Bernardo Mário Catchura
Cidadão Comum.
Dr. José Mário Vaz
Assunto: Carta aberta
Excelência,
Sirvo-me da presente para manifestar-lhe o meu inconformismo
com a actual situação política, que arrasta dia após dias, sem solução à vista.
Situação, essa, que no meu entender, teve o seu início com a aprovação do
programa do governo que autoriza a exploração dos recursos naturais, que no entender
da Vossa Excelência é prematuro devido a impreparação do país para o efeito,
passando pela exoneração do, então, ministro do interior cuja nomeação do seu
substituto gerou um braço de ferro entre a presidência e o governo e posteriormente
foi agudizada, sem motivo justificante, com a demissão do primeiro governo
desta legislatura em 12 de agosto.
Excelência,
Peço perdão, mas, os motivos invocados para a demissão do
governo, até hoje, não convence a maioria esmagadora do povo guineense, visto
que estando na qualidade do PR, tendo provas dos factos que alegava, deveria
ser “bonus
pater famíliae”, uma vez que assiste-lhe o direito de presidir, quando
entender, ao Conselho dos Ministros (artigo 68º/m) onde, também, podia
ser abordado o assunto, senão, mesmo, o melhor espaço para a discussão das questões
de governação, nomeadamente a exploração dos recursos naturais, a corrupção no
aparelho do Estado, a implementação do projecto agrícola “MON NA LAMA” e entre
outros.
Estranhou-me bastante a quando, sua Excelência, invocou a
existência de processos judiciais sobre certas figuras do governo e recusou
nomear outras com o mesmo fundamento, uma vez que no nosso sistema, Jurídico-Processual
Penal, vigora o chamado Princípio de Presunção da Inocência. O principio, este, que com base no
qual a pretensão do Procurador-Geral da República não teve sucesso a quando tentou
impedir a Vossa Excelência candidatar às presidenciais com o mesmo fundamento que
hoje invoca para impedir que os outros gozem dos seus direitos civis e políticos.
Excelência,
Estou ciente que quando a Constituição da Republica diz no Art.º 68º que
são as suas competências:
i)
Nomear
e exonerar os restantes membros do governo sob proposta do PM.
j)
Criar
e extinguir os ministérios e secretarias de Estado sob proposta do PM.
Quer com a expressão, “proposta”, convidar o PR para fazer a
sua análise sobre a estrutura do governo a criar e dos membros do governo a
nomear para formar a sua vontade na tomada de decisão. Ou seja, é no sentido de
permitir-lhe, assim, orientar-se pela idoneidade das pessoas a nomear e da
conveniência da estrutura do governo tendo em conta a necessidade do país e da
sua real situação económica para depois emitir o seu parecer com base no
princípio da boa-fé objectiva. Mas, isso não afasta o governo da
responsabilidade de prestação das contas públicas e, consequentemente, pagar
pela má gestão da coisa pública. Nesta linha de pensamento, não vejo o motivo
de há mais de quatro meses, o país, ainda, contínua sem ministros de Interior e
de Recursos Naturais.
Para ser sincero, há uma certa altura em que eu congratulava
com a sua opinião, aliás, a maioria esmagadora do povo congratulava. Digo isso,
porque a própria ANP no acto da votação da segunda moção de confiança, ao
governo demitido, recomendou, por unanimidade, uma remodelação profunda do
governo. E, por sua vez, a Vossa Excelência, garantiu o povo, publicamente,
pela segunda vez, que não iria demitir o governo que acabaria por demitir em
contraposição de todos os pedidos feitos pelo povo, pela ANP, pelos Movimentos
da Sociedade Civil e, inclusive, pela Comunidade Internacional. Naquela altura,
não é que gostavam mais das pessoas que estavam no poder, mas, tendo em
consideração que o país saiu duma crise que durou mais de dois anos, período de
transição, com o cancelamento de financiamento por parte da comunidade
internacional e tendo em conta a fragilidade das nossas instituições, que são
de tal forma vulneráveis, era previsível que com a queda do governo entraríamos
numa situação crítica como essa que estamos a enfrentar.
Excelência,
Tenho acompanhado com preocupação o seu envolvimento directo
na criação da crise e no seu agudizar. Facto, esse, que hoje revela um sentimento
de vergonha nacional. Uma vez que o PR é nos temos do art.º. 62° o símbolo da unidade.
Hoje, apesar da tentativa de reconsideração da sua posição,
levanta fortes suspeitas sobre a sua capacidade de poder ser imparcial,
independente e idóneo para resolução da actual crise. Porquanto o papel que está,
neste momento, a desempenhar não é sua. Isto é, de mediar o problema do PAIGC
com os seus militantes. Por isso, sugeria que deixasse que os inconformados,
dentro do PAIGC, recorram às entidades competentes para dirimir os conflitos de
género e não a sua Excelência, na qualidade do PR, interferir no problema dum
partido. Pois, não acredito que, após esta sua intervenção, irá fazer o mesmo
com o PCD que neste momento a sua
direcção está de costas viradas com a sua juventude e ou com o PRID que, também, tem conflito interno.
Perante esses e vários outros factos, venho, na qualidade dum
cidadão comum, suplicar à Vossa Excelência, no sentido de acordar e espreitar
pela janela para ver o quanto o seu povo está a sofrer. O povo quer a
estabilidade política e governativa para que cada qual, por si só, sem contar
com o dever do Estado, desenvolver suas actividades com as suas habilidades,
própria, na luta pela sua sobrevivência. Portanto, envereda-se pela defesa dos
interesses comuns e não de grupos ou amigos.
Estou inconformado!
Guiné-Bissau no coração!
Bem-haja!
Bernardo Mário Catchura
Cidadão Comum.
Bandim, Bissau, 17 de Fevereiro de
2016
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