sábado, 15 de fevereiro de 2025

Opinião: A Deficiência na Digitalização e Atendimento Eletrônico nas Instituições Públicas da Guiné-Bissau: Reflexões Críticas sobre uma Cultura Administrativa Persistente

 

A modernização administrativa e a implementação de tecnologias digitais nos serviços públicos são pilares fundamentais para a eficiência, a transparência e a acessibilidade das instituições estatais. No entanto, a realidade da Guiné-Bissau ainda revela um panorama de defasagem nesse aspecto, onde a ausência de retorno institucional a comunicações eletrônicas compromete não apenas a funcionalidade burocrática, mas também a credibilidade das estruturas governamentais e acadêmicas. Essa problemática, longe de ser um fenômeno isolado ou pontual, constitui-se como um traço cultural enraizado na administração pública guineense, independentemente do governo em exercício, e exige uma reflexão mais ampla sobre a necessidade de reformulação dos mecanismos de gestão e comunicação.
A ausência de respostas a e-mails e solicitações oficiais por parte das instituições públicas evidencia uma lacuna estrutural grave. No âmbito acadêmico e científico, essa deficiência compromete a fluidez dos processos administrativos e a própria produção do conhecimento. Há cinco meses, submeti dois artigos para um evento sobre o centenário de Amílcar Cabral – um em coautoria com um colega e outro de minha autoria. A instituição responsável pela recepção e avaliação dos textos, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas da Guiné-Bissau (INEP), não forneceu qualquer retorno, mesmo após sucessivas tentativas de contato. Esta situação não representa um caso isolado; diversos colegas e pesquisadores guineenses compartilham experiências semelhantes, demonstrando que o problema não se restringe a uma instituição específica, mas reflete um modus operandi recorrente no setor público nacional.
O impacto dessa ineficiência administrativa transcende a esfera acadêmica. Um estudante guineense de mestrado, cuja identidade será preservada por razões de confidencialidade, tentou realizar uma pesquisa de campo na Guiné-Bissau, vinculada ao Ministério da Educação Nacional (MEN). Cumprindo rigorosamente os parâmetros éticos e legais estabelecidos pela comissão de ética da sua instituição de ensino, formalizou um pedido via e-mail ao Ministério da Educação Nacional, solicitando autorização para conduzir a pesquisa. No entanto, passados meses, jamais recebeu qualquer resposta. A gravidade da situação se intensifica quando a universidade do estudante, por intermédio do próprio reitor, interveio institucionalmente com uma petição formal assinada – que, lamentavelmente, também não obteve retorno. Esse cenário evidencia uma falha sistemática na comunicação administrativa e levanta questionamentos sobre a funcionalidade e o compromisso das instituições públicas com a promoção da pesquisa e do conhecimento científico. Portanto, nossa questão central é: qual a real finalidade dos computadores nos ministérios e instituições públicas da Guiné-Bissau? Para que servem os e-mails institucionais, se não há retorno às solicitações enviadas? São ferramentas efetivamente utilizadas para otimizar a administração pública ou meros símbolos decorativos, sem impacto real na eficiência dos serviços prestados? Se os meios eletrônicos existem, devem cumprir sua função de facilitar a comunicação e tornar a gestão mais ágil e acessível, e não apenas servir como uma propaganda vazia de modernização.
Sabemos que comunicação eletrônica é, no contexto global, um instrumento essencial para a modernização da administração pública e a eficiência dos serviços prestados ao cidadão. Em diversos países, mecanismos digitais são utilizados para garantir respostas céleres, assegurar a transparência institucional e aprimorar o atendimento. No entanto, na Guiné-Bissau, persiste uma cultura institucional que não valoriza o atendimento eletrônico como um direito dos cidadãos e um dever dos órgãos públicos. O problema, portanto, não se resume à gestão de um governo específico, mas à perpetuação de práticas administrativas que negligenciam a importância da digitalização como ferramenta estratégica para o desenvolvimento nacional.
Diante dessa conjuntura, sinto-me compelido a expressar publicamente minha indignação e revolta face à inércia das instituições públicas guineenses no que se refere à modernização dos seus meios de comunicação. O silêncio administrativo diante de solicitações legítimas não pode ser naturalizado ou aceito como norma. É imperativo que o país avance para um modelo de gestão pública mais eficiente, no qual a digitalização não seja apenas um conceito abstrato, mas uma prática concreta e funcional. A resistência ao uso adequado dos meios eletrônicos não pode continuar a ser um entrave ao progresso nacional, pois o desenvolvimento de qualquer nação está diretamente vinculado à capacidade de suas instituições responderem de forma célere, transparente e responsável às demandas da sociedade.
O futuro da administração pública guineense depende da sua capacidade de adaptação às exigências contemporâneas. Para tanto, é necessário um esforço coletivo que envolva não apenas reformas institucionais, mas também uma mudança de mentalidade por parte dos gestores e servidores públicos. A digitalização e a modernização da comunicação institucional não devem ser encaradas como uma opção, mas como um imperativo para a consolidação de uma administração pública eficiente e responsável. Enquanto essa transformação não ocorrer, o país continuará imerso em um ciclo de ineficiência que compromete sua credibilidade e limita seu potencial de desenvolvimento.
Essas observações não têm a intenção de atacar as instituições públicas do país, mas sim de provocar uma reflexão crítica e chamar a atenção das autoridades competentes para a necessidade de uma postura mais proativa na modernização e eficiência da comunicação eletrônica, garantindo um atendimento célere, transparente e responsável às demandas da sociedade.
14. 02. 2025
Waldimir Barbosa
Administrador Público
Professor e Pesquisador

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