quinta-feira, 10 de fevereiro de 2022

Guiné-Bissau: Alicerces do Estado de Direito democrático “nunca estiveram tão ameaçados” - ONG


A Liga Guineense dos Direitos Humanos (LGDH) considerou hoje que os alicerces do Estado de Direito democrático na Guiné-Bissau nunca estiveram tão ameaçados e denunciou a detenção de mais de 60 cidadãos de forma arbitrária no país

A denúncia foi feita em carta aberta enviada ao secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, à presidente da Comissão da União Europeia, Ursula Von Der Leyen, e ao presidente da União Africana, Macky Sall, na qual a organização pede uma “intervenção mais enérgica e vigorosa da comunidade internacional sob pena de contribuir indiretamente para a instabilidade permanente, com consequências sub-regionais”.

Na carta, a organização não-governamental de defesa dos direitos humanos avisa que as conquistas objetivamente percetíveis ao longo do percurso democrático do país “encontram-se fortemente comprometidos desde a instalação do regime político vigente, cujo propósito principal se traduz no confisco gradual dos direitos e liberdades fundamentais para instalar um regime totalitário.

Segundo a LGDH, as autoridades políticas, com o apoio das forças de segurança e do poder judicial, “fazem do seu apanágio recurso sistemático aos métodos ilegais tais como violência policial, intimidações, detenções arbitrárias, raptos e espancamento de jornalistas, ativistas cívicos e opositores políticos”.

“A tudo isto, associam-se os discursos políticos segregacionistas e de incitamento ao ódio, que estão a corroer os alicerces da coesão social e tolerância religiosa na Guiné-Bissau”, adverte a organização de defesa dos direitos humanos.

Para a LGDH, é “legítimo afirmar que os alicerces do Estado de Direito democrático nunca estiveram tão ameaçados na Guiné-Bissau como agora”.

“Esta conclusão é o resultado de uma análise exaustiva e objetiva dos padrões e tendências de atuação do regime em vigor”, refere, salientando que os factos descritos os sinais apontam para “cenários imprevisíveis a breve trecho” se se tiver em conta a “fragilidade das instituições democráticas”.

“O quadro nebuloso dos direitos humanos é ainda ensombrado por um ostensivo clima de insegurança generalizada sustentado pela crispação política, à semelhança do motim ocorrido em 01 de fevereiro no Palácio do Governo”, que provocou vários mortos, salienta.

A LGDH afirma que em vez de ser feita uma investigação “séria” e em “estreita observância do quadro legal”, as autoridades “pautaram-se pela instalação de um clima de terror”, que levou, nomeadamente, ao ataque à Rádio Capital, que provocou sete feridos e a “raptos e detenções arbitrárias de mais de 60 cidadãos à margem da lei”, que não estão a ter acesso a advogados.

A organização refere também “invasão ilegal às instalações privadas sem mandado de busca e revista, acompanhada de disparos com armas automáticas e gás lacrimogéneo à residência do cidadão Rui Landim”.

Há também, denuncia a organização, “perseguições, intimidações e ameaças recorrentes de morte aos ativistas e dirigentes da LGDH e de outras organizações da sociedade civil, jornalistas e comentadores políticos, críticos do regime político vigente, em particular, o ex-presidente da Liga Luís Vaz Martins”.

A organização denuncia também a “reativação de um esquadrão de raptos e espancamentos, que funciona como uma espécie de milícia do regime instalado, em especial do Ministério do Interior, onde as vítimas são levadas, em última instância, para simulação e arranjos processuais”.

No dia 01 de fevereiro, homens armados atacaram o Palácio do Governo da Guiné-Bissau, onde decorria um Conselho de Ministros, com a presença do Presidente da República, Umaro Sissoco Embaló, e do primeiro-ministro, Nuno Nabiam, e de que resultaram oito mortos.

O Presidente considerou tratar-se de uma tentativa de golpe de Estado que poderá também estar ligada a “gente relacionada com o tráfico de droga”.

Na sequência dos acontecimentos, a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) anunciou o envio de uma força de apoio à estabilização do país.

A Guiné-Bissau é um dos países mais pobres do mundo, com cerca de dois terços dos 1,8 milhões de habitantes a viverem com menos de um dólar por dia, segundo a ONU.

Desde a declaração unilateral da sua independência de Portugal, em 1973, sofreu quatro golpes de Estado e várias outras tentativas que afetaram o desenvolvimento do país

Conosaba/Lusa

Sem comentários:

Enviar um comentário