O primeiro-ministro da Guiné-Bissau, Nuno Gomes Nabian, disse não ter informação de que o Presidente, ou alguma autoridade guineense, tenha pedido o envio da força de estabilização da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO).
Em entrevista exclusiva à Rádio França Internacional (Rfi), para falar, pela primeira vez, do ataque às instalações do governo, o chefe do executivo informou que os trabalhos de investigação estão a andar.
“Algumas pessoas estão sob custódia das autoridades. Estamos à espera que o trabalho seja feito, que seja um trabalho transparente, justo e que os autores deste ato sejam levados à justiça. Morreram 8 indivíduos, incluindo um dos meus seguranças. Foi baleado quase à porta do meu gabinete”, afirmou PM.
Nuno Nabian assegurou que o governo vai trabalhar para que a justiça seja feita e traduzir à justiça os autores do ataque
O ataque ao palácio do governo causou, segundo as autoridades nacionais, 8 mortos, mas as circunstâncias ainda continuam por esclarecer, estando atualmente a decorrer um inquérito neste sentido.
Na mesma entrevista o chefe do governo guineense, Nuno Nabian, abordou as problemáticas atualmente em debate na sociedade guineense, as buscas efectuadas pelas forças de defesa e segurança, o possível envio de tropas da CEDEAO e o relacionamento institucional com os militares, o primeiro-ministro começando por recordar o que sucedeu no dia 1 de fevereiro.
RFI: Como está depois do que aconteceu?
Nuno Nabian: Depois dessa tragédia que aconteceu no palácio do governo, estamos a tentar recuperar disto. Foi um ato muito violento. Todos os membros do governo estavam presentes na sala de reuniões do Conselho de Ministros, incluindo o Presidente da República. Era cerca de uma hora da tarde, houve um estrondo lá fora e na altura estava a decorrer a reunião do Conselho de Ministros. Pensamos que fosse o rebentamento de um pneu.
Logo a seguir, houve tiroteios de AK, de metralhadoras. Em seguida, deu-se o rebentamento de uma bazuca e percebemos que, de facto, era um assunto sério. Dali, como é óbvio, toda a gente tentou sair da sala de reunião, não havia controlo à saída, o Presidente da República saiu e foi conduzido pela segurança para se esconder numa sala na área do ministério das comunicações. A maior parte dos ministros que estavam na sala, saíram pela porta traseira para o recinto. Saímos, escapamos. Estava eu, o Ministro da Defesa, o Ministro do Interior, o Ministro da Agricultura, todo o gabinete do Presidente da República. Conseguimos escapar por essa via.
Refugiamo-nos no seminário franciscano (perto do complexo governamental), fomos bem acolhidos e ficamos lá durante quase cinco horas do tempo que durou esse tiroteio. Penso que não é admissível no mundo atual. O Presidente Sissoco ganhou as eleições, penso que há muita coisa que é dita nos medias, mas os guineenses sabem que ele ganhou. Para sair do poder, tem de ser por via democrática. Agora, pegar nas armas e tirar a vida às pessoas, isto é muito complicado.
RFI: Depois do que sucedeu há duas semanas, foi encaminhado um inquérito. Teve alguma informação sobre o andamento dessa investigação?
Nuno Nabian: Sim, fizeram-me um briefing. Os trabalhos estão a andar. Algumas pessoas estão sob custódia das autoridades. Estamos à espera que o trabalho seja feito, que seja um trabalho transparente, justo e que os autores deste ato sejam levados à justiça. Morreram 8 indivíduos, incluindo um dos meus seguranças. Foi baleado quase à porta do meu gabinete.
RFI: Há dias, o Presidente da República acusou 3 antigos oficiais que foram condenados no passado por tráfico de droga por estarem por detrás do que aconteceu. O que se pode vislumbrar relativamente ao que sucedeu?
Nuno Nabian: Há muita especulação. Não gosto de me pronunciar sem ter fatos. Tudo está sob investigação. Há pessoas que foram detidas porque há uma ligação à volta de tudo isto. Há suspeitas. Estamos à espera que a justiça faça o seu trabalho. É verdade que o Presidente falou disto, relacionou os fatos com a atividade do narcotráfico e também falou-se na possibilidade de ser um golpe orquestrado ou de um ato terrorista. Portanto, há ligações certamente. O Presidente esteve lá durante cinco horas, preso. Ele teve a possibilidade de ouvir as pessoas a falarem à volta daquilo que sucedeu. Só a justiça é que vai clarificar toda esta situação.
RFI: Desde os acontecimentos do dia 1 de fevereiro, houve uma série de medidas que foram tomadas. Para além do inquérito que está a ser conduzido, estão a ser nomeadamente efectuadas buscas pelas forças de Defesa e Segurança à procura de armas para evitar eventuais novos atos violentos. Isto tem gerado um certo pânico no seio da população. Poderá ter falhado alguma comunicação?
Nuno Nabian: Sim, certamente que falhou alguma coisa em termos de comunicação. É normal que isso aconteça porque ninguém sabe exatamente quem são as pessoas que estão envolvidas neste ataque. Fala-se de rebeldes da Casamança, fala-se de pessoas envolvidas no tráfico de droga, etc… Portanto, de onde é que saíram com aquelas armas? Foi uma coisa terrível. Por enquanto, uma das pessoas está em fuga. Claro que há necessidade de as autoridades tentarem fazer o trabalho de investigação.
RFI: Há relatos de buscas que não correm muito bem e que inclusivamente há pessoas que são agredidas durante essas buscas, há denúncias neste sentido. O que é que o primeiro-ministro tem a dizer quanto a isto?
Nuno Nabian: Penso que as pessoas que estão a fazer este trabalho são muito responsáveis. Se a pessoa é chamada, é suspeita, tem que ser procurada. Agora, se houver alguma resistência, as autoridades têm que atuar. Penso que deve haver alguma cooperação neste sentido. Mas eu não tenho informação alguma de que esteja a ser utilizada a força para levar as pessoas à justiça. Não tenho essa informação.
RFI: Perante esta situação, foi decidido na cimeira da CEDEAO que poderia ser enviada à Guiné-Bissau uma força de estabilização. Como é que esta decisão surge? Também se falou na eventualidade de o executivo, o governo ou o Presidente, ter falado com os responsáveis da CEDEAO para se tomar uma decisão neste sentido. Isto aconteceu de fato ou não?
Nuno Nabian: Não tenho informação de que o Presidente, ou alguma autoridade guineense, tenha pedido o envio da força. Na verdade, houve uma reunião da CEDEAO e os presidentes decidiram que há a necessidade do envio de uma força de estabilização do processo democrático na Guiné-Bissau. Isto foi uma decisão tomada nesta cimeira e, certamente, a CEDEAO comunicará oficialmente com a Guiné-Bissau sobre esse aspecto e o processo será tratado de acordo com as normas que existem. Para que isso aconteça, tem que haver uma comunicação oficial da CEDEAO para as autoridades da Guiné-Bissau e as autoridades da Guiné-Bissau certamente se pronunciarão sobre este assunto.
RFI: O parlamento vai ser consultado sobre esta eventualidade?
Nuno Nabian: Há critérios e normas que têm que ser seguidos. Por isso é que eu disse que o assunto vai merecer certamente uma análise mais profunda e as autoridades que serão competentes nessa matéria terão oportunidade de se pronunciar.
RFI: O facto de eventualmente vir à Guiné-Bissau uma força de estabilização da CEDEAO poderia acontecer dois anos depois de a CEDEAO ter saído da Guiné-Bissau com as autoridades a considerarem que as forças de Defesa e Segurança guineenses tinham plenamente a capacidade de garantir elas próprias a segurança do território. Isto está a gerar algum debate no seio da população. Como é que acha que isto pode ser interpretado ao nível das Forças Armadas?
Nuno Nabian: A CEDEAO passou um longo período na Guiné-Bissau. Quem fez a petição para a saída da CEDEAO da Guiné-Bissau foi o atual Presidente da República. Portanto, a CEDEAO saiu. As nossas forças de Defesa e Segurança assumiram as suas responsabilidades para criar um clima de paz e tranquilidade para todos os cidadãos. É um assunto que certamente será tratado no fórum próprio. Não me cabe dizer que as Forças Armadas não estão contentes ou se a população está contente. A verdade é que isto terá que ser tratado no fórum próprio.
RFI: O atual Chefe de Estado-Maior das Forças Armadas está ausente. Ele faz o elo de ligação entre o poder executivo e o exército. Julga que isto ressente-se neste momento nas relações que existem entre o poder executivo e a classe castrense?
Nuno Nabian: O Chefe de Estado-Maior deve voltar ainda esta semana. Estava em tratamento médico em Barcelona. Está a recuperar e está bem. Na verdade, o Chefe de Estado-Maior serve de elo de ligação, mas penso que não há nada de extraordinário quanto a isto. As relações institucionais são boas. Há muita gente que me faz perguntas, por exemplo, sobre as minhas relações com o Presidente da República. É normal que haja pontos de vista diferentes sobre certas matérias, mas o relacionamento com o Presidente da República é um relacionamento bom. Foi nessa base que temos vindo a trabalhar e a garantir a estabilidade que é fundamental para este país.
RFI: Em que situação nos encontramos? Julga que há um risco neste momento que possa tornar a acontecer aquilo que aconteceu no dia 1 de fevereiro?
Nuno Nabian: Não, eu penso que não. As nossas forças de Defesa e Segurança estão a cumprir as suas missões que consistem em defender a integridade territorial do país e garantir a paz e a estabilidade e são homens que de fato deram muito a este país. Penso que nada de alarmante. O que aconteceu podemos até interpretá-lo como um ato isolado. Não são as nossas forças de Defesa e Segurança que estão envolvidas nesse ato. O país está calmo, as pessoas estão a trabalhar. Aquilo que aconteceu é um ato que todos condenamos. Vamos trabalhar para que seja resolvido e para que a justiça seja feita e que as pessoas compreendam o que aconteceu. Não há nada de alarmante no país neste momento.
Por: RedaçãoConosaba/O Democrata/Rfi
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