Quando conduzo as minhas entrevistas para a Rádio Gumbé [www.gumbe.com], sempre faço a questão de perguntar aos entrevistados se preferem o crioulo ou o português. Ainda bem que tenhamos estas e mais opções linguísticas. A Guiné-Bissau deve sentir-se orgulhosa disso.
Há muitos países que têm tido essa dificuldade de coabitação linguística. E não se trata apenas de países colonizados ou em vias de desenvolvimento.
Tomemos os Estados Unidos da América como um exemplo. Em muitos estados, o espanhol está-se a tornar numa segunda língua. Nalguns estados (New México, Florida) muitos documentos oficiais são emitidos em duas línguas, o inglês e o espanhol. Há instâncias em que há mesmo uma terceira língua. É esse o caso de Florida, sobretudo na área de Miami, onde há uma enorme presença dos haitianos.
E falando de Haiti, naquele país o crioulo foi instituído como a língua nacional há já muito tempo, apesar de ter sido uma colónia francesa. Os livros escolares são todos em crioulo e paulatinamente o francês é introduzido nos níveis mais elevados do ensino. Mas, Haiti é outra historia… eles são nacionalistas, por excelência.
Mas não é só Haiti. Tomemos Cabo Verde com um outro exemplo. Os cabo-verdianos são extremamente orgulhosos do crioulo, seja qual for a cor da pele da pessoa. Nas minhas andanças pelo mundo, convivi com muitas pessoas das origens cabo-verdianas. Eu costumo dizer, “um cabo-verdiano na diáspora pode não falar português, mas fala o crioulo, sem dúvida”.
Agora vamos para a Europa. Espanha. A língua galega é a língua oficial da Galícia (uma comunidade autónoma) ao lado de espanhol.
Eu tenho a plena certeza que há milhares doutros exemplos da coabitação linguística. E nem vou falar da África… alguém se lembra da África do Sul? Ali, o inglês, Afrikaans, Zulu, Xhosa, Tswana, Sotho, Swati, etc., etc., são todas línguas oficiais daquele país sul-africano.
Agora de volta à Guiné-Bissau. Sim, o português é a língua oficial da Guiné-Bissau. Mas, muitos quadros e políticos guineenses (para não falar da população em geral) têm dificuldades em se expressarem em português por diferentes motivos.
Demais, uma vasta maioria dos quadros guineenses formaram-se em países não falantes da língua portuguesa, nomeadamente na antiga União Soviética (Rússia), Cuba, Alemanha, França, EUA, Canada, etc. E a nova onda da cooperação bilateral tem levado os estudantes guineenses para outros países como o Senegal, os Marrocos, a Turquia, a Algéria, a Venezuela, a China, etc., etc.
Agora pergunto: como coabitar todos estes quadros técnicos, médios e superiores num país como a Guiné-Bissau, tendo a língua portuguesa como o único padrão? Será que o facto de alguém não ser capaz de se expressar bem em português seria um sinal de menos competência em relação à pessoa formada numa universidade portuguesa?
Lembro-me do antigo político da FLING, François Mendy. Nas eleições de 1994 ele (com formação académica francófona) articulava-se tão bem em crioulo, mas tinha enormes dificuldades em dizer uma única palavra em português. Hoje, o mesmo se diz em relação à maioria dos políticos guineenses – são deficientes em português. E a culpa não é deles. Foi sim um fruto de circunstancias.
Agora, aqui vai o que acho. Obrigar os candidatos a escolherem o português cria uma desvantagem profunda entre os candidatos. Aliás, falar correctamente e articuladamente o português nem sempre poder-se-á traduzir em boa gestão ou governação. Falar correctamente e articuladamente o português não é um sinal de competência. Eu, confessadamente, gosto e sempre gostei da língua portuguesa e, de modo algum quero menosprezar a importância desta língua, sobretudo no ponto de vista académico.
Mas, no caso dos políticos, se o seu eleitorado não lhe entende perfeitamente, para quê falar o português então? Eu sei que nem todos os guineenses entendem o crioulo, mas na impossibilidade de cada um ser capaz de falar em todas as línguas maternas, o crioulo é a segunda melhor opção para o país.
Mas, se alguém preferir o português, tudo bem. Mas, a mesma pessoa deve assumir os riscos de não ser entendida. Mas, valerá a pena tomar um tal risco? E como vai a velha máxima, “os tradutores são traidores”.
Com os meus melhores cumprimentos.
Umaro Djau
Olá Sr. Djau concordo plenamente contigo!! pois como a Língua é identidade cultural de um povo devemos chamar na lingua de "LÍNGUA GUINEENSE" E NÃO CRIOULO.
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