quarta-feira, 26 de agosto de 2020

A Língua Árabe no sistema educativo guineense

No dia 24 deste mês, li no Blog Conosaba que as “opiniões divergem sobre introdução da língua árabe no sistema educativo guineense”. Entretanto, ao ler a notícia, constatei que havia apenas um técnico sénior do Ministério da Educação a aplaudir essa iniciativa do Ministro da Educação Nacional.

Nas redes sociais as opiniões quase se convergem. Mesmo entre alguns técnicos de educação há uma linguagem que aponta para um desperdício de tempo levantar um falso problema que nem era o nosso problema no sistema educativo, uma vez que não existe essa disciplina. Portanto, era necessário concentrarmo-nos no nosso real problema, na sua resolução, e não introduzir um problema que ainda não existe.

Entre muitas opiniões, vejo um professor que parece analisar a questão partindo apenas de um ângulo e, como seu discípulo, queria chamar-lhe atenção naquilo que apresentou como seu ponto de vista para aplaudir a introdução da língua árabe no nosso sistema educativo.

O Professor disse que [1]recorremos sempre para o ensino superior no estrangeiro e o que deparamos ali, é a situação da língua e rejeitando a língua Árabe no nosso sistema educativo, significa que estamos a fechar as portas para que os nossos estudantes não possam estudar nos países árabes”. Partindo deste argumento, teríamos que introduzir no nosso sistema educativo não só a língua árabe, mas também a língua mandarim, a língua russa e a língua espanhola, e devia ser há muito tempo, porque não é de hoje que os nossos estudantes partem para países que falam essas línguas e enfrentam essas dificuldades linguísticas.

Eu acho que o Professor, como técnico sénior do Ministério da Educação e como ex-Ministro da Educação, deveria lutar pela introdução da nossa História, da nossa Geografia, da nossa Literatura no currículo escolar. Nestas possibilidades, sim, [2]não há nada de desvantagem”, como o professor disse para argumentar a introdução da língua árabe. E aplaudir isso faria todo sentido, Professor.

Já agora, o Professor como sendo um linguista, porque não aconselharia o Ministro da Educação para que introduzisse a língua crioula como forma de [3]permitir a criação de ensino bilingue, onde o Português” e o Crioulo [4]vão ser leccionados na mesma escola”. Essa introdução teria maior impacto no desenvolvimento cognitivo das crianças e no processo de ensino aprendizagem do que a língua árabe.

Introduzir uma disciplina no Currículo Escolar, não depende apenas do aspeto técnico – que o Ministério da Educação não conseguiu resolver até hoje com a língua portuguesa, que é uma língua transversal ao sistema educativo guineense – mas depende também do aspeto financeiro. Não seria melhor que o Ministério da Educação disponibilizasse os recursos a colocar no projecto para ensino de Árabe na melhoraria do ensino-aprendizagem do Português e, desta forma, introduzir a nossa literatura no currículo escolar?

É que, o currículo escolar deve refletir aquilo que a educação pretende construir com a sociedade. Não devemos introduzir disciplinas só por meros caprichos políticos ou agendas ocultas. Por isso, devemos pensar na introdução de disciplinas que vão ao encontro da nossa realidade social, que têm a ver com a nossa identidade nacional e que poderão ajudar-nos a construir uma cidadania ativa. Mas para tal, é preciso que a educação foque naquilo que é nacional (a nossa História, a nossa Geografia e a nossa Literatura) e, posteriormente, pensar em introduzir a Língua Crioula como uma das línguas de ensino.

Para terminar, acho que a adopção dessa disciplina (Língua Árabe) terá apenas uma motivação: a religiosa. Quando deveria ser uma necessidade social como outras disciplinas que mencionei anteriormente. Porque se for pelo argumento de facilitar estudantes que vão países onde árabe é língua de ensino, volto a perguntar: e russo, mandarim ou espanhol?!


Lisboa, 25 de agosto de 2020

Abdelaziz Vera Cruz

Mestre em Português Língua Segunda/Estrangeira

Escritor

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