[REPORTAGEM_julho 2020] A Plataforma da Associação de Jovens e Amigos do setor de Safim, região de Biombo no norte do país, revelou que existe um estudo de avaliação de impacto ambiental feito pelo grupo universitário “ACEMW”, especialistas em gestão ambiental,que foi ignorado pelo ministério de Administração Territorial e Poder Local. Segundo a explanação do ativista, o estudo considera o novo vazadouro de lixo a céu aberto recentemente inaugurado, próximo a aldeia de Nghanghan (Safim), uma ameaça séria à aterrisagem e decolagem de aviões no aeroporto internacional Osvaldo Vieira.
Acrescentou que tanto o estudo deste grupo universitário como o que foi feito pela Comissão Interministerial desfavoreceram a decisão do ministério de Administração Territorial de abrir o vazadouro de lixo naquela localidade e sustentaram que a queima de lixos causa fumos que poderão dificultar a visibilidade dos pilotos.
O responsável da Plataforma, Admilson Mendes, fez estas revelações em entrevista exclusiva ao jornal O Democrata (4 de julho de 2020), na qual afirmou que o estudo de avaliação do impacto ambiental conclui que o sítio escolhido para o novo vazadouro não é adequado para o mesmo, bem como se encontra próximo da comunidade da aldeia de Nghanghan, do rio e da bolanha que são aproveitados pela comunidade para a pesca e lavoura.
O novo vazadouro tem uma distância de dois quilómetros daestrada principal, mas encontra-se a menos de 100 metros da tabanca Nghanghan, que tem uma população estimada em cerca de 200 pessoas e que sobrevive da produção das bolanhas e da pesca.
PLATAFORMA ACUSA O GOVERNO DE USAR FORÇAPARA ABRIR O VAZADOURO E IGNORAR ESTUDOS
“O estudo fez menção dos riscos e ameaças que o vazadouro pode criar aos aviões, riscos que são do conhecimento das autoridades deste país, porque é a zona que coincide com a trajetória de aviões que, quando se aproximam do aeroporto,descem ainda mais. Se aquela zona passar a ser inundada de fumo a todo o tempo, constituirá sérios riscos aos aviões, porque o fumo limitará a visibilidade dos pilotos. Nesta zona vemos os aviões voar muito baixo, porque os pilotos descem mais baixo nas manobras de aterrissagem”, referiu o ativista para de seguida avançar que estes e mais outros são riscos elencados pelo estudo e que segundo ele, foram simplesmente ignorados pelo ministério de Administração Territorial e do Poder Local.
Lembrou que o diretor-geral de ambiente foi a uma das rádios da capital e mostrou que o ministério tem uma posição contrária, no que concerne à abertura de novo vazadouro em Safim, tendo recordado que aquele responsável já tinha demostrado a sua posição que aquele sítio não reúne condições para fazê-lo de vazadouro.
Admilson Mendes explicou que, para além dos estudos de avaliação do impacto ambiental feitos pelos técnicos do ministério de Ambiente, também o grupo universitário que fez o outro estudo profundo sobre a abertura do vazadouro de lixo a céu aberto naquela localidade concluiu que há enormes riscos ao ecossistema se o governo permitir o vazamento de lixos naquelas condições. Enfatizou que o grupo decidiu entregar os estudos a diferentes instituições do país, inclusive à Assembleia Nacional Popular e ao ministério de Administração Territorial.
O presidente da Plataforma de Associação de Jovens e Amigos de Safim disse que várias vezes manifestaram as suas preocupações em relação a abertura de vazadouro naquela localidade e que pediram ao governo, nos vários encontros mantidos, sugerindo ao ministério de Administração Territorial a criar condições para o tratamento de lixos, a semelhança de outras partes do mundo.
“Lembro que numa das reuniões mantidas com o ministro Fernando Dias, apresentamos a preocupação da comunidade sobre a utilização daquele espaço. O ministro disse-nos na altura que o espaço seria usado a título provisório, porque aguardavam a mobilização de fundos que permitissem a criação de condições para o tratamento de lixos. Imagina, não têm o fundo disponível, mas já estão a deitar o lixo naquele lugar e de forma desorganizada. Sabemos agora que o ministério não tem condições para o tratamento daqueles lixos e que aquele lugar está a ser usado como o extinto vazadouro de Antula, que sabemos todos do prejuízo que causou à população daquele bairro. O de Safim será muito mais grave”, notou.
Explicou que não existe limite entre o vazadouro e o rio que se encontra naquela zona e que, de acordo com o ativista, a contaminação daquele rio significaria problemas para os restantes rios com os quais se interliga. Adiantou que o fumo iria inundar as aldeias e que o vazadouro é invadido pelascrianças que procuram brinquedos e outros produtos que desconhece.
“Toda a comunidade estava esperançada que o resultado do estudo do impacto ambiental seria determinante na decisão do governo. O parecer dado pelos técnicos desfavoreceu o governo, mas infelizmente as orientações não foram acatadas pelo próprio ministério de Administração Territorial e Poder Local”, contou.
O ativista recordou que o ministro, numa das suas declarações à imprensa, disse que havia um acordo entre o governo e a comunidade, em que a comunidade exigia ao governo como contrapartida, a energia elétrica e água.
“Para nós, isso é caricato. Somos cidadãos guineenses e temos direito à energia elétrica como cidadãos da capital Bissau e de outras regiões. Se aceitarmos isso é provável que não iremos beneficiar da água e luz que diz que pedimos, porque vamos morrer todos da contaminação destes lixos”, criticou.
ESPECIALISTA EM GESTÃO AMBIENTAL: “VAZADOURO DE SAFIM PREJUDICA ECOSSISTEMA NOS ARREDORES”
O porta-voz do Grupo Universitário “ACEMW”, constituído por cinco especialistas em gestão ambiental, Manecas António da Silva, confirmou ao repórter em entrevista telefônica que a sua organização fez um estudo profundo de avaliação do impacto ambiental sobre o sítio indicado para o vazadouro de lixo pelas autoridades.
Explicou que concluíram, no estudo, que o vazadouro a céu aberto encontra-se entre três ecossistemas, designadamente: um ecossistema litoral a frente; uma bolanha, a esquerda e atrás outro ecossistema urbano (local onde habita a população). Alertou que os três ecossistemas estão na condição de uma ameaça eminente de contaminação por lixos se “as autoridades prosseguirem com o vazamento de lixos naquele lugar e nasmesmas condições”.
“Se a Câmara Municipal de Bissau continua a usar esta mesma técnica do tratamento de lixo, deitá-lo naquele vazadouro a céu aberto, haverá consequências graves para a vida da população local, como também constituirá uma ameaça grave para a aterrisagem e decolagem de aviões no aeroporto internacional Osvaldo Vieira. Aquele é um lixão a céu aberto, porque não tem as características de um vazadouro de lixo digno de nome que pudesse ser implementado, a semelhança de outras partes do mundo”, advertiu o especialista.
Sublinhou que aquele sítio pode ser até comparado com o vazadouro de Antula, em termos de características, mas enfatizou que a situação geográfica do novo vazadouro representa maior perigo devido aos ecossistemas que se encontram nos arredores do espaço e do próprio aeroporto internacional. Por isso, aproveitou a entrevista para alertar, de novo, às autoridades competentes no sentido de suspenderem o vazamento de lixos naquele lugar para evitar a contaminação dos ecossistemas, sobretudo evitar também o prejuízo que o vazadouro pode causar aos aviões que aterram no aeroporto de Bissau.
Entretanto, um dos altos responsáveis de ministério do Ambiente que pediu anonimato, explicou ao O Democrata em entrevista telefônica, que o governo pediu um parecer técnico de especialista agrupados numa comissão interministerial, para verem se o local indicado para o vazadouro em Safim reúne as condições para o vazamento de lixos.
Acrescentou que a comissão era constituída por técnicos dos ministérios do Ambiente, das Obras Públicas, de Administração Territorial e Poder Local.
“A comissão interministerial concluiu, no seu relatório, que não aconselha o ministério de Administração Territorial e a Câmara Municipal de Bissau a abrir o vazadouro naquele espaço, que se encontra nos arredores da cidade de Safim. A primeira iniciativa era fazer um estudo para construir um aterro sanitário, mas não um vazadouro que é totalmente diferente deum aterro sanitário previamente definido”, lamentou para de seguida avançar que as autoridades decidiram acionar medidas políticas para abrir o vazadouro naquele lugar, sem levar em conta o parecer dos técnicos da Comissão Interministerial.
INSPETOR GERAL: ESTUDO DE GRUPO UNIVERSITÁRIO DEFENDE INTERESSES DE OCUPANTES TRADICIONAIS
Contactado pelo repórter por telefone, para falar do estudo deavaliação do impacto ambiental realizado pelo grupo Universitário “ACEMW”, que acusa o ministério de ignorar as suas recomendações sobre o risco que o vazadouro representa para os ecossistema arredores e o aeroporto internacional Osvaldo Vieira, o inspetor-geral do Ministério da Administração Territorial e Poder Local, Nelson Bamba, confirmou que o ministério recebeu o relatório do estudo de avaliação do impacto ambiental feito pelo Grupo Universitário “ACEMW”, que desfavorece a iniciativa de abertura do vazadouro de lixo a Céu aberto naquela localidade em Safim, devido a sérios riscos ao ecossistema arredor e a uma ameaça a aterrisagem e descolagem de aviões no aeroporto Osvaldo Vieira.
Porém, negou que em nenhum momento o ministério que representa ignorou o estudo, e lembrou que a única entidade vocacionada para fazer o estudo do impacto ambiental no país é a Autoridade de Avaliação Ambiental Competente do ministério do Ambiente (AAAC).
Referiu que o Grupo Universitário que realizou o estudo do impacto ambiental não é uma entidade ideal e que, supostamente, o grupo terá ligações com os ocupantes tradicionais do espaço onde foi instalado o novo vazadouro de Safim.
“É um estudo feito, tendo em conta o interesse do grupo e dos ocupantes tradicionais do local, o que quer dizer que, um dia destes pode aparecer outro grupo para fazer o mesmo trabalho em função do seu interesse ou de outrém. Que fique claro que as autoridades não são obrigadas a acatar trabalhos desta natureza que não sejam de uma autoridade competente, portanto há interesses no estudo realizado, por isso não confiamos no estudo realizado pelo Grupo Universitário “ACEMW” ”, indicou Nelson Bamba.
Uma das reivindicações da comunidade local tem a ver com o tratamento do lixo, aliás, a comunidade local disse que o ministério da Administração Territorial teria prometido, antes da instalação do vazadouro, que iriam trabalhar no tratamento do lixo e que o vazadouro não constituiria problemas ou ameaças à saúde da população que vive nos arredores do vazadouro.
Sobre esse assunto, Nelson Bamba esclareceu que neste momento é difícil construir um aterro sanitário no local, tendo em conta às condições e a urgência que as autoridades tinham de transferir o vazadouro de Antula para Safim, por isso decidiu-se fazer um vazadouro controlado, respeitando os requisitos ou medidas recomendadas pelos técnicos do ministério do Ambiente, nomeadamente: a vedação do espaço, a construção de uma guarita (casa de guarda) para controlar a entrada e saída de carros, a criação de um grupo de dez apontadores que seriam formados na área de gestão de resíduos sólidos.
Segundo Nelson Bamba, a construção do muro está em curso, a guarita já foi construída e tem um guarda para controlar o vazadouro, mas “infelizmente a porta foi roubada”.
Sobre o parecer técnico da comissão interministerial que envolve técnicos de diferentes ministérios e que segundo uma fonte de O Democrata, terá aconselhado o governo a não prosseguir com abertura de Vazadouro naquela localidade, o inspetor geral explicou que não se tratava de um parecer, mas sim de um relatório de visita dos técnicos do Ambiente e disse que houve um estudo feito pela AAAC, mas relacionado com o aterro sanitário, ou seja, a construção de um vazadouro controlado.
Por: Assana Sambú/Carolina Djemé
Foto: Aguinaldo Ampa
Conosaba/odemocratagb
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