Lisboa, 23 jul 2020 (Lusa) – Cerca de 40 pessoas concentraram-se hoje junto da Assembleia da República, em Lisboa, para contestar o Presidente, primeiro-ministro e Governo da Guiné-Bissau, apelando ao parlamento português para rejeitar o que dizem ser “os golpistas”.
“O que se passou no último dia 29 de fevereiro foi um golpe de Estado, porque um candidato que não saiu das urnas de forma legítima se apoderou do poder, com a ajuda das forças de segurança, instalou-se no Palácio [Presidencial], e está autoproclamado Presidente da República e nós estamos aqui, a comunidade guineense, revoltados com essa situação”, disse à Lusa Mariano Quade, um dos dinamizadores da manifestação, referindo-se a Umaro Sissoco Embaló.
Durante o protesto, os participantes empunhavam cartazes em que criticavam organizações internacionais, como a União Europeia (UE) e a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO).
“A CEDEAO não vale nada para a Guiné-Bissau. Não vai fazer nada para a Guiné-Bissau, vai apoiar golpistas. Nós não queremos golpistas. Queremos liberdade na Guiné-Bissau, queremos democracia na Guiné-Bissau. É por isso que vim aqui hoje, para pedir à comunidade internacional para nos ajudar a libertar a nossa terra”, afirmou Cadi Quebé, 62 anos.
A organização regional foi criticada por Mariano Quade, que considerou que esta “está a funcionar por amiguismo” e acusou-a de, por “ter uma relação com o autoproclamado Presidente”, tender a “fazer não uma posição mediadora, mas parcial, que coloca os outros atores políticos numa situação de desvantagem”.
Num dos cartazes erguidos pelos participantes no protesto lia-se que a UE “financiou um golpe de Estado com dinheiro dos contribuintes europeus”.
O primeiro-ministro português, António Costa, foi também alvo das críticas dos manifestantes, por ter recebido o seu homólogo da Guiné-Bissau, Nuno Nabian, durante uma visita privada deste a Portugal.
“A atitude do nosso primeiro-ministro, o senhor António Costa, não é digna. Não devia receber o autoproclamado. O partido dele não ganhou as eleições, mas ele recebeu”, afirmou o luso-guineense Isidoro Copilo, que acredita que Portugal se deve demarcar do Governo de Nuno Nabian.
Mariano Quade abordou também esta reunião, considerando que “é motivo de indignação”.
“Sabemos que Portugal é uma democracia consolidada e, portanto, nunca iria alinhar do lado daqueles que violam a democracia, e por isso nós não compreendemos esta posição”, vincou o organizador da manifestação.
Mariano Quade apontou que ao reconhecer um Governo que diz ser não legítimo, Portugal está a “compactuar com uma situação de ilegalidade”.
Um grupo de cidadãos guineenses a viver na Europa tinha convocada para hoje à tarde uma manifestação em Bruxelas, que pretendia denunciar detenções e espancamentos de “pelo menos uma centena de pessoas”, alegando violência policial, mas o protesto foi cancelado devido às precauções por causa da pandemia de covid-19.
A Guiné-Bissau está a viver um período de especial tensão política desde o início do ano, depois de a Comissão Nacional de Eleições ter declarado Umaro Sissoco Embaló vencedor da segunda volta das eleições presidenciais.
O candidato dado como derrotado, Domingos Simões Pereira, líder do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), não reconheceu os resultados eleitorais, alegando que houve fraude e meteu um recurso de contencioso eleitoral no Supremo Tribunal de Justiça, que não tomou, até hoje, qualquer decisão.
Umaro Sissoco Embaló autoproclamou-se Presidente da Guiné-Bissau em fevereiro e acabou por ser reconhecido como vencedor das eleições pela CEDEAO e restantes parceiros internacionais.
Após ter tomado posse simbolicamente, o chefe de Estado demitiu o Governo liderado por Aristides Gomes, saído das eleições legislativas de 2019 ganhas pelo PAIGC, e nomeou um outro liderado por Nuno Nabiam, líder da Assembleia do Povo Unido - Partido Democrático da Guiné-Bissau (APU-PDGB), que assumiu o poder com o apoio das forças armadas do país, que ocuparam as instituições de Estado.
A CEDEAO tinha pedido a formação de um Governo que respeitasse os resultados das legislativas até 22 de maio, mas o prazo não foi cumprido, porque os partidos com assento parlamentar, divididos em dois blocos, reivindicavam ambos ter a maioria para formar Governo.
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