sexta-feira, 14 de junho de 2024

Conferência da IDC-África em Paris: "A democracia está em perigo"

Conferência da IDC-África em Paris © RFI/Lígia Anjos

Paris – O Senado francês recebeu esta sexta-feira, 14 de Junho, a segunda reunião da Internacional Democrata do Centro África (IDC-África). No evento participaram, nomeadamente, o primeiro-ministro cabo-verdiano, Ulisses Correia e Silva, o primeiro-ministro são-tomense, Patrice Trovoada, o líder da UNITA, Adalberto Costa Junior, e o líder do MDM, Lutero Simango.

A conferência arrancou com um primeiro painel que abordou a temática "Segurança e paz para garantir uma democracia durável". Um dos vice-presidentes da IDC-África, Adalberto Costa Junior, também presidente da UNITA, maior partido da oposição angolano, começou por propor uma reflexão sobre os instrumentos existentes para preservar a paz, lembrando que "não há paz onde impera a desigualdade e onde são desrespeitados os direitos humanos".

Adalberto Costa Junior recordou, ainda, que "o controlo territorial criou conflitos como os da Ucrânia, Palestina, no Médio Oriente, ou em Taiwan. Os países mais fortes tentam impor-se aos mais fracos e não há paz onde impera a desigualdade e onde são desrespeitados os direitos humanos", reforçando que "a paz é a condição sem a qual não se alcança o desenvolvimento".

Primeiro-ministro são-tomense, Patrice Trovoada, no Senado francês, 14 de Junho 2024. © RFI/Lígia Anjos

No segundo painel foram abordados "os desafios da democracia. Estado de Direito. Eleições transparentes", nesta mesa redonda participou o primeiro-ministro são-tomense, Patrice Trovoada, deixou claro que - para ele - a solução para uma boa democracia depende "da qualidade da Justiça". "São Tomé e Príncipe é uma democracia que funciona. Somos poucos e é o caso também de Cabo Verde e de poucos outros países que têm um sistema que funciona, mas esses sistemas precisam de ser consolidado. Hoje, o que observamos no mundo, não só em África, mas também na Europa, na América Latina, na Ásia é que a democracia está em perigo", sublinhou o primeiro-ministro são-tomense.

Acerca do acordo militar rubricado entre São Tomé e Príncipe e a Rússia vir a entrar em choque com o posicionamento da IDC-África de que faz parte a ADI, partido no poder no arquipélago, o primeiro ministro são-tomense Patrice Trovoada estima que tal não é o caso. "Nós somos democratas, somos de centro direita. Não choca porque como eu disse - e temos durante esses dias a visita do Almirante Gouveia Melo, que reafirmou os laços muito estreitos que nós temos com Portugal de uma maneira geral, com todos os países do Atlântico na defesa daquilo que é o nosso bem comum. É evidente que cooperar no domínio da formação, no domínio de trocas de informações ligadas aos tráficos, ao terrorismo com a Rússia não constitui problema nenhum", defendeu.

O primeiro-ministro são-tomense lembra, ainda, que no domínio da segurança, "quando existe ameaças comuns, os países mais, teoricamente, antagonistas, conseguem cooperar. Nós não temos um conflito com a Rússia. Nós condenamos a Rússia por ter violado o direito internacional ao invadir a Ucrânia. Vamos estar presentes na conferência agora na Suíça, para onde enviei o ministro dos Negócios Estrangeiros, representar São Tomé e Príncipe, embora a Rússia não esteja presente. Entendemos que era preciso estarmos presentes para marcar a nossa solidariedade com a Ucrânia nesse conflito. Embora pensemos que a via negocial seja a melhor solução e não continuar com o conflito armado", concluiu.

Líder do MDM, Lutero Simango, no Senado francês, 14 de Junho 2024. © RFI/Lígia Anjos

O líder do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), Lutero Simango, participou no mesmo painel sobre "desafios da democracia. Estado de Direito. Eleições transparentes". Questionado sobre a possibilidade de alternância para Moçambique, o líder da terceira força do país respondeu que "em Moçambique existe um partido-Estado dominante, desde a independência em 1975. Esse partido actua como se fosse o Estado". O líder do MDM denuncia a "falta de qualidade de serviços públicos, educação, transportes, num país capaz de desenvolver a produção agrícola e onde existe fome".

Relativamente ao tópico das eleições transparentes, Lutero Simango, defende que todos sabem que "em todos os nossos processos eleitorais tem havido manipulações. Para este ano é bem sabido que vamos ter as nossas eleições gerais que se vão realizar numa característica muito especial, numa situação em que todo o povo moçambicano está totalmente saturado do regime. Existe uma vontade popular para que haja mudanças em Moçambique".

Lutero Simango acredita que no dia 9 de Outubro, data das eleições gerais em Moçambique, só dois caminhos são possíveis: "o caminho da continuidade que o povo moçambicano já não quer, uma vez que o povo deseja mudanças. Não acontecendo mudanças vai criar uma situação muito difícil de gerir e isso pode desaguar para uma violência a pós eleitoral", sublinhou o líder do MDM.

Presidente do Internacional Democrática do Centro-África e primeiro-ministro cabo-verdiano, Ulisses Correia e Silva, no Senado francês, 14 de Junho 2024. © RFI/Lígia Anjos

O presidente da Internacional Democrata do Centro África discursou no painel da tarde sobre "Desenvolvimento. A dívida, um desafio para África". Ulisses Correia e Silva começou por lembra que "o endividamento excessivo é um problema sério" e que o desenvolvimento só se alcança "se as lideranças se comprometerem em actuar para uma boa governação política".

"Na IDC-África somos muito claros relativamente às questões do contexto global, de que a melhor resposta aos ataques à democracia é haver mais e melhor democracia e boa governança. Haver liberdade, fazer com que as instituições funcionem, que não seja apenas realizar eleições, mas que essas eleições reflictam aquilo que é a vontade popular", afirmou o primeiro-ministro cabo-verdiano.

Para Ulisses Correia e Silva é necessário existirem "sistemas credíveis e que a justiça funcione como um instrumento de recurso a eventuais conflitos. Muitas vezes esses problemas de conflitos internos, que depois desembocam em conflitos mais graves e, às vezes, em golpes de Estado, acontecem porque não há confiança no sistema e confiança nas instituições", lamentou.

Por: Lígia ANJOS
Conosaba/rfi.fr/pt

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