Sobreviventes da repressão à alegada tentativa de golpe de Estado de 27 de Maio de 1977 em Angola escreveram uma carta aberta ao Presidente João Lourenço em que pedem justiça e a entrega dos restos mortais das vítimas.
Na carta, os sobreviventes elogiaram as declarações de João Lourenço, sobre a necessidade de uma reconciliação com a História, considerando "um sinal de boa vontade" a intenção de devolver os restos mortais das vítimas.
Os sobreviventes pedem ainda a João Lourenço, que efetua uma visita de Estado a Portugal entre quinta-feira e sábado, que "seja elaborado e divulgado o registo de todos os detidos e dos depois desaparecidos" e em relação a estes que "seja dada nota às famílias da razão do seu desaparecimento".
Os signatários consideram que esta listagem é possível de fazer recorrendo a arquivos, nomeadamente do ex-Tribunal Militar, ex-Tribunal Popular Revolucionário, ex-DISA (polícia política) e do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), "e dos não menos relevantes interventores do Estado Angolano ainda vivos" para esclarecer "este processo que deixou marcas tão profundas na sociedade angolana".
"A sua chegada ao poder em Angola reanimou a esperança perdida, depois de o ouvirmos manifestar a necessidade de uma reconciliação com a História", escreveram, lamentando nunca terem recebido uma resposta às cartas enviadas sobre assunto ao ex-Presidente José Eduardo dos Santos.
"Há mais de 40 anos que temos vindo a apresentar, em uníssono com as suas famílias, junto das autoridades angolanas, em particular do ex-presidente da República e do MPLA -- Partido do Trabalho, José Eduardo dos Santos, aquilo que se pode considerar o mínimo dos mínimos de reposição de justiça na memória coletiva", referem.
Os primeiros signatários, luso-angolanos, lembram a João Lourenço que nasceram durante o colonialismo e que se dedicaram à luta anti-colonial.
Alcançámos, com o sacrifício sabido, a independência de Angola a 11 de Novembro de 1975, mas, chegados a 27 de Maio de 1977 fomos presos, enxovalhados, torturados e sobrevivemos à tragédia, ao contrário do que sucedeu com muitos "desaparecidos", homens e mulheres, na sua maioria jovens que se entregaram à revolução angolana.
A 27 de maio de 1977, uma alegada tentativa de golpe de Estado, numa operação aparentemente liderada por Nito Alves - ministro do Interior desde a independência (11 de novembro de 1975) até outubro de 1976 -, foi violentamente reprimida pelo regime do então Presidente angolano, Agostinho Neto.
Entre os 11 nomes dos responsáveis, divulgados então pelo Governo, estavam Nito Alves, José Van-Dúnem e a sua mulher Sita Valles, militante da União dos Estudantes Comunistas (UEC) em Portugal e que passou a militar no MPLA em meados de 1975. Os seus corpos, bem como os dos restantes, nunca foram entregues às famílias, nem emitidas certidões de óbito.
As tropas leais a Agostinho Neto, com o apoio de militares cubanos, acabaram por restabelecer a ordem e prenderam os revoltosos, seguindo-se, depois, o que ficou conhecido como "purga", com a eliminação das fações, tendo sido mortas cerca de 30 mil pessoas, na maior parte, sem qualquer ligação a Nito Alves, tal como afirma a Amnistia Internacional (AI) em vários relatórios sobre o assunto.
Os primeiros cinco signatários da carta aberta são José Reis, José Fuso, Jorge Fernandes, Jorge Marques "Big" e Egdar Valles, irmão de Sita Valles.
Conosaba/.rtp.pt
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