terça-feira, 2 de março de 2021

POLÍTICA VERSUS TRAPAÇA: MORALIDADE OU IMORALIDADE?

 

O presente contributo não pretende trazer um olhar axiomático sobre a realidade política guineense. Por esse motivo, é necessário esclarecer desde logo em que sentido vai recair a minha abordagem neste ensaio teórico e reflexivo. Não se trata de trazer uma abordagem irrefutável e nem tampouco, trazer uma racionalidade única para o problema proposto. Trata-se, mais simplesmente, de um empreendimento de dar uma ideia precisa, que facilite a compreensão do assunto em análise, podendo abrir as possibilidades para uma análise com outros prismas interpretativos sobre o mesmo assunto.

Para tal, urge procurar a etimologia da palavra “política” para sustentar o meu silogismo. A palavra “política” vem sendo utilizada há séculos, com concepções diversificadas. A concepção do termo possui uma complexidade, com explicações variantes e esperando por uma síntese da Ciência Política, dentro e fora das universidades. Quanto ao objeto, o conteúdo e a finalidade, mesmos entre os especialistas, não se conseguiu ainda um acordo concludente, e para muitos permanece mais ou menos incógnita (AZAMBUJA, 1969; DALLARI, 1984).

A origem da palavra pode ser relevante para entender o sentido atribuído à palavra política. As verificações demonstram que a palavra tem origem grega e foi usada por vários filósofos e escritores da Grécia Antiga, sendo importante para depreender o seu sentido exordial. A obra de Aristóteles cognominada “POLÍTICA” pode ser importante para entender o seu sentido inaugural. Assim, os gregos davam o nome de polis à cidade, e Aristóteles diz que o homem é um animal político, porque todos os seres humanos vivem numa relação de interdependência, ou seja, relações que Norbert Elias intitulada de configuração, assim, a “política” se refere à vida na polis (DALLARI, 1984).Partindo dos elementos supracitados, apresento algumas reflexões e conceitos de alguns estudiosos no campo das Ciências Políticas conforme pontos de vista doutrinários ou empíricos: a) no uso trivial, a política compreende as ações, comportamentos, intuitos, manobras, entendimentos e desentendimentos dos políticos para conquistar o poder, ou uma parcela dele, ou um lugar nele: eleições, campanhas eleitorais, comícios, lutas de partidos, interesses pessoais ou grupelho para atender às suas demandas; b) é a arte de conquistar, manter e exercer o poder, o governo; c) é uma orientação ou atitude de um governo em relação a certos assuntos e problemas de interesse público; d) é a ciência da moral normativa do governo da sociedade civil; e) é o estudo das relações de regularidade e concordância dos fatos com os motivos que inspiram as lutas em torno do poder do Estado e entre os Estados (AZAMBUJA, 1969), para alguns é a arte e a ciência do governo; é o estudo do poder; e para os outros é a ciência do Estado (DALLARI, 1984). Com base em todas as definições dadas adoto a seguinte definição no contexto guineense: política é um conjunto das ações individuais e de um grupelho que dirigem as suas ações para alcançar os seus objetivos e, consequentemente, contam com apoios internos e externos para materializar os seus prediletos no Estado. Posto isto, Kussas di Bissau tá dá pena. Talvez si no scribi no leis na kriol politiqueiros pudi intindi sintido di ke ki na lei. Muitas extravagâncias naquele país. Em pleno dia, assistimos às aberrações de um lado por outro. Há uma necessidade talvez, de repensar a forma como a política está sendo feita no solo de Amílcar Lopes Cabral.

Depois da abertura multipartidária em 1991 que culminou com as eleições gerais de 1994, o país vem sendo governado de forma “irresponsável”. Abertura multipartidária trouxe a liberdade e outorga a criação de outros partidos políticos para disputar ao nível político e ideológico como o Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo-Verde (PAIGC). Mesmo com a adoção ao multipartidarismo, ainda, continuamos assistindo as cíclicas instabilidades governativas, econômicas, sociais e, sobretudo, às instabilidades políticas que obstam a construção de um Estado forte capaz de enfrentar os desafios do século XXI. Os argumentos que sustentam ou não a legalidade e a legitimidade da queda dos sucessivos governos foram e são sempre interpretadas inconvenientemente.

Assim sendo, as hermenêuticas das leis que norteiam o Estado Democrático de Direito (EDD) são interpretadas de forma contrafazes, multifárias e multiformes na classe dos juristas, analistas, politiqueiros, militantes, adeptos, académicos, os “constitucionalistas”, etc. e deixam as dubiedades nas suas interpretações e, ainda, criando muitas perplexidades no que concerne a genuinidade e o espírito das leis.

Não adianta estudar para dizer " na studa pa sirbi país" se depois disso você cria problema ao país para atender às suas demandas e dos seus correligionários. Em vista disso, estamos ensinando a todos a não “reconhecer” o papel que a formação superior pode proporcionar para o desenvolvimento do país. Muitos dos “intelectuais e dos políticos” tidos como referências” perderem estes atributos devido às suas posições que não espelham a realidade. De outra maneira, estes adotam postura que outrora não espelham o espírito democrático ou como me disse o meu grande amigo que estes “intelectuais” perderam a nacionalidade académica e os politiqueiros perderam a nacionalidade política.

A realidade política ku no vivi na país até aos obriga-me a ser um prosélito da doutrina do pensador grego Pirro de Élida chamada de PIRRONISMO ou CETICISMO PIRRÔNICO - hábito de duvidar de tudo - isso leva-me a duvidar se, na verdade, aprendemos ou vamos aprender com os nossos erros desde a independência até aos dias atuais no cenário político. Mais de 40 anos de independência seria talvez, suficiente para superarmos algumas coisas básicas, mas ainda continuamos a discutir “si governo na kai ou não”. Com isso, coloca as seguintes indagações: até quando vamos discutir as políticas públicas do país? Até quando vamos criar as condições necessárias para o funcionamento do Estado? Que democracia? Quais os fatores que estão na base da fragilidade do processo da consolidação democrática? A quem interessa a proliferação dos partidos políticos, ou é uma mera estratégia de ascensão social e política dos seus líderes? Trata-se doutro olhar para entender os interesses umbrosos no que concerne às questões colocadas.

Com isso, torna-se salutar buscar um conceito do que seria o partido político. Existem várias teorias expressivas das definições de partido político que são as de Jellinek (1914), Weber (2015), Bobbio (2015), Hasbach (1912) e entre outros teóricos. O partido político pode ser definido, na sua essência, como grupos de indivíduos unidos por convicções comuns, dirigidas a determinados fins estatais, que buscam realizar os seus fins (JELLINEK, 1914 apud BONAVIDES, 2000), ou seja, refere-se a “uma reunião de pessoas, com as mesmas convicções e os mesmos propósitos políticos, e que intentam apoderar-se do poder estatal para fins de atendimento das suas reivindicações” (HASBACH, 1912 apud BONAVIDES, 2000, p. 450).

Nas palavras de Bonavides (2000), o partido político pode ser entendido como uma organização de pessoas que se inspiram em ideias ou são movidas de meios legais, e naquele se conservam para a realidade dos fins propugnados. Noutros termos, pode ser entendido como uma associação (in) voluntária de pessoas com o intuito de galgar o poder político mediante os meios constitucionais. Com isto, torna-se importante introduzir a origem dos partidos políticos na África e, especificamente, na Guiné-Bissau.

Para Dimitri Lavroff (1970) os partidos políticos na África Negra foram, na sua generalidade, e, antes de tudo, movimentos emancipalistas que lutaram pela libertação dos seus países. Os primeiros movimentos-partidos na África nasceram com o intuito de reivindicar a soberania e os direitos fundamentais humanos, como a liberdade, a igualdade e autonomia dos povos subjugados pela invasão colonial. O Estado colonial contribuiu significativamente para a gênese dos partidos políticos africanos e na definição do seu perfil enquanto partidos (movimentos) nacionalistas e anticoloniais em busca da liberdade, da autonomia política, econômica e cultural. Ainda o autor frisa que foi o Estado colonial que introduziu a ideia do nacionalismo na África (embora, sendo uma visão passível a outros olhares), forçando, assim, os africanos a criarem os partidos para a contestação da independência com a ideia da construção de uma nação independente e livre.

A década de 1950 foi um marco importante na Guiné-Bissau no que diz respeito à expansão ou à proliferação dos movimentos associativos com carácter partidário, outros com o enfoque na unidade entre a Guiné-Bissau e Cabo Verde e outros que defendiam Guiné-Bissau para os guineenses. Muitos destes movimentos lutaram para libertar o país do jugo colonial, isto é, estavam focados na luta pela independência e, posteriormente, acreditavam no desenvolvimento do país através da geração de novos quadros. Pós-independência o país foi liderado sob a égide do PAIGC como partido único até abertura política declarada em 1991.

O apedeutismo histórico dos movimentos-partidos e das funções dos partidos políticos na Guiné-Bissau levou os politiqueiros a entenderem a política como - djugu di interesse - para salvaguardar as suas predileções em detrimento da maioria, ou sejam, entendem a política como a arte do possível (MARTINEZ, 1991). Desse modo, indago: a política é possível para quem? E é impossível para quem? Resumir a política a este conceito (djugu di interesse), é a uma afirmação incompleta, camuflada, farsante, ilusória, quimérica, etc. As situações como essas levam os politiqueiros a usar a política como um mistério, um meio enigmático e meândrico o que não deixa a população depreender de forma diáfana a realidade política efetiva. É necessário a ética na política ou uma ética pública para a política guineense, enquanto não houver isso, estamos longe de alcançar um país que se anela.

Nas "campanhas" eleitorais, fora das eleições e no poder, os partidos políticos continuam exercendo funções ativas e não passivas na sociedade, situação não tangível na Guiné-Bissau. Os partidos políticos têm a função de organização de agendas políticas que devem guiar as suas agendas políticas. Quando a política é entendida como um enigma, os politiqueiros, fazem entre si tantas acusações de defeitos, dizem tantas coisas incompatíveis com as suas próprias ações, que a política se reveste de um véu de mistérios, segredos e trapaças (MARTINEZ, 1991). Em grande parte, estes equívocos devem-se aos posicionamentos dos politiqueiros, dos militantes, do fanatismo, do sectarismo, de analistas e críticos que, por imperícia ou doblez, fazem análises e pronunciamento adversos à verdade, por vezes, fazem-nos (penso eu, pabia di barriga) para receber, em contrapartida, uma indicação política nos cargos “chaves” ou não no governo. Fica insofismável que a política não é um mistério, mas sim, a arte de conquistar e manter o poder através de vários outros dispositivos que garantem o funcionamento do Estado de forma democrática.

Conhecendo as suas funções, todos os partidos devem pautar pelas discussões (de forma positiva) em diferentes meios. As redes sociais e as páginas de partidos políticos podem ser úteis para fomentar e promover os debates nas suas múltiplas óticas para procurar soluções que possam ser profícuas para o país. As páginas nas redes sociais dos partidos foram importantes no marketing político ou eleitoral dos candidatos nas eleições legislativas e presidenciais.

Os partidos políticos através das suas páginas podem contribuir e servir como um instrumento elogiável para o exercício de uma cidadania ativa e não passiva. É imperioso, a mudança das condutas políticas que colocam em causa a esperança dos bissau-guineenses. Deve-se abdicar da política como um espetáculo. Estes (politiqueiros) devem abster-se de pensar que os jovens devem ser colocados como “máquinas” nas campanhas eleitorais e, consequentemente, colocá-los fora do cenário político e das tomadas de decisões importantes do país. Quando ouço um jovem dizer que não se interessa pela política guineense, acreditando que pode cuidar unicamente dos seus interesses particulares e que este não tem nada a ver com a política, está revelando uma falta de consciência e os impactos das decisões políticas na sua vida, em outras palavras, está facilitando os politiqueiros a continuarem a governar o país sem planos estratégicos de médio e longo prazo.

Na realidade, Dallari (1984, p.84) assevera que “não existe quem não sofre as consequências das decisões de governo, que são essencialmente políticas”. Assim, manter-se alheio às questões políticas é dar um apoio incondicional a todas as decisões do governo. Colocar os jovens como “máquinas” de propagandas eleitorais e nas passeatas é um mecanismo de abduzir o povo nas decisões relevantes e desestimulá-los na participação política e com isso, impedi-lo que exija o cumprimento dos princípios que norteiam um Estado Democrático de Direito (EDD). O que fica latente é que estes os politiqueiros forçam as mudanças das leis para concentrar nas suas mãos os poderes reais. Pois, percebem-se que, se o povo for bem informado saberá escolher os seus representantes, exigi-los para cumprirem as suas funções como políticos e, certamente, o povo saberá fazer a distinção daqueles que querem usar a política como empresa e daqueles que vão servir aos interesses da nação guineense, ou naquilo que Weber (2015) chama de viver “para” a política, bem como aqueles que vivem “da” política. Uma das condições para a sua efetivação, é a educação de qualidade que proporcione uma formação reflexiva de acordo com a realidade política do país.

O pior de tudo é que geralmente esses politiqueiros não são capazes de guiar todo o povo no rumo de novos destinos para o desenvolvimento do país. Geralmente, são dotados de uma visão do poder e da política de forma cerceada limitado a um segmento que eles pertencem, por isso, não são capazes de reproduzir na imaginação dos bissau-guineenses e, muito menos, mobilizar os quadros e das forças que poderiam contribuir da maneira significativa para transformar a Guiné-Bissau. Além de não incentivar os quadros, estes politiqueiros criam obstáculos que os impedem de regressarem “pa se terra”.

A política guineense ainda continua sendo impulsionada pelo grupo de pressão, ou melhor, pelos grupos de pressões endógenos e exógenos. Grupo de pressão/lobista é entendido na ciência política como qualquer grupo social, permanente ou transitória, que, para satisfazer os seus interesses próprios, procura obter determinadas medidas dos poderes do Estado e influenciar a opinião pública. Ainda procura obter poderes públicos através de leis, decretos, decisões, etc. que atendam os seus interesses, em outros termos, o grupo de pressão exerce influências sobre os que detêm o poder (AZAMBUJA, 1969), fato que demonstra pelejas entre os atores políticos guineenses. Enquanto não entendermos isso e adoptar estratégias para enfrentar diferentes grupos de pressões externos e internos vamos continuar nas lutas (des) necessárias e os nossos “inimigos” vão aproveitar da nossa astenia para fazer valer os seus interesses.

Subjacente a isto, para um olhar atento da realidade política percebe-se que existem vários grupos de pressões no Estado guineense. Talvez, este fato tem a ver com as fragilidades políticas, institucionais, jurídicas e do próprio Estado. O poder político como possibilidade efetiva que o Estado tem de "obrigar" os indivíduos a fazer ou não fazer algo, e o seu objetivo deve pautar sempre para o bem comum, mas respeitando os princípios que norteiam a sã convivência.

A visão acima referenciada é um olhar de um poder político na visão idealista e não materialista. Numa visão materialista o poder político na Guiné-Bissau no seu exercício, não visa o bem público, não é mais um poder do Estado, não é mais um direito, não obriga juridicamente e moralmente; é apenas o uso da força, a violência dos homens que estavam/estão no governo, porque perderam/perdem a credibilidade, a imparcialidade e a sua função nuclear de assegurar o direito de todos como está consagrado na lei magna do país. Aproveitavam/aproveitam e abusavam/abusam das sumptuosidades estatais para fazer valer os seus interesses.

A realidade política guineense está atrelada por um fenômeno chamado na ciência política como “poder difuso” caracterizada por uma pressão externa e [interna] sobre o indivíduo, e que se manifesta sob diferentes aspectos, desde a força material até a persuasão psicológica (AZAMBUJA, 1969). O uso da força como ação “legítima” do Estado pode ser caracterizada por temor das punições e represálias que faz com que a maioria obedeça, mas, para isso, exprobo a possibilidade de coação física alicerçada sob o uso das forças securitárias e das forças armadas para fazer valer os interesses de certas pessoas. A jactância e imoderação no exercício do poder podem ser fatais para quem almeja ser um bom político. As revoluções, as tundas e assassinatos de algumas figuras no país de forma nebulosa são em alguns casos epílogos dos regimes que se baseiam no uso da violência como a forma de resolver os conflitos que até agora não foram resolutos peremptoriamente no fórum judicial ou extrajudicial.

Nas sociedades e nas democracias modernas o uso da força, da coerção material e física para fazer valer a sua proposição, podem ser fatais na sua carreira política. O uso destas devem ser comutadas pela persuasão com as ações psicológicas através das várias dimensões “multi e pluri - estratégico” para fazer valer os princípios de um EDD. Para isso, é necessária uma liderança política, conceito muito polêmico e há um vasto trabalho sobre a liderança política.

A liderança Política com uma capacidade de se colocar à frente do país e dos processos políticos na base dos princípios democráticos, conforme postula as instituições democráticas, mas é importante salientar que uma liderança política deve possuir uma combinação trinária como afirma Azambuja (1969) EMOTIVO-ATIVO-PRIMÁRIO e EMOTIVO-PRIMÁRIO-SECUNDÁRIO ou segundo Weber (2015, p. 106-107), um bom político deve possuir três características fundamentais: “PAIXÃO, SENTIMENTO DE RESPONSABILIDADE E SENSO DE PROPORÇÃO” por isso, defende que “faz-se a política usando a cabeça e não as partes do corpo”, ou seja, a política se faz mobilizando através da paixão e não a força e da probabilidade de vitória. Quem não andar nesse caminho está se conectando a três pecados fatais da política: “não defender causa alguma; não ter sentido de responsabilidade e comporta-se de forma demagogo”. Este último refere-se a um comportamento interesseiro e ambicioso visando à obtenção de um bem pessoal, partidário ou político e não tomando ações concretas que visam levar ao processo e desenvolvimento do país com políticas públicas que atendam as demandas do país.

A maioria desses aventureiros ou politiqueiros” não têm nada útil para dizer ao povo, mas, além de se promover para as futuras eleições, negocia o tempo disponível para propagandas através de coligações com outros candidatos” (MARTINEZ, 1991, p.36). O assalto ao poder começa pela Mídia, explorando a falta da cultura política e/ou desinteresse político cativado pelos discursos que legitimam certas práticas como legítimos e legais e, consequentemente, são materializados através de vários aparatos de segurança ou não do país. Muitos destes aventureiros enganam o povo e promovem as suas personalidades para as próximas eleições e outros assessores por novas configurações criam um sistema de facilidade para muitos destes politiqueiros desonestos continuarem a engambelar o povo.

De acordo com o autor acima referenciada, estes politiqueiros são ignorantes da Ciência Política e incapazes de imaginar as implicações todas do poder, são também desprovidos de valores e princípios éticos, mas são dotados de uma intuição muito aguda das vantagens de se enriquecer no patrimônio público (MARTINEZ, 1991, grifo meu). Esta luta está presente desde a formação do Estado guineense até os dias atuais e, o que me parece, é que temos pessoas especialistas na conspiração e, à vista disso, temos pessoas que só se se gabam quando há uma crise política no país. Também, quando estes não conseguem atingir os seus objetivos que têm em mente, eles recorrem à trapaça, à fraude, à conspiração, a mentira, a demagogia à difamação, etc. e quando esses meios falham, eles recorrem à violência para destruir o que não sabem fazer ou não são capazes de controlar e, ainda utilizam as práticas viciosas na política, mas duma forma umbrífera para fazer o povo acreditar que fazem coisas certas.

Salienta-se que os partidos políticos têm uma história ligada com os golpes de Estados que sobrestá o processo da consolidação da democracia guineense. Isto posto, impede a concretização de planos e programas dos sucessivos governos que foram depostos sem, no entanto, concluírem os quatro (4) anos de mandatos. Desde os anos 1994 até hoje continuamos a assistir às hostilidades ininterruptas pelo poder e, quem não ganhar as eleições amanha o poder através dos outros dispositivos de força que, outrora não são constitucionais.

É importante salientar que, equilíbrio entre os poderes é importante para o sistema vigente no país, e através disso acomodar mecanismos para minorar os conflitos que vêm destroçando o país de um Estado de mal para pior. Mesmo adoptando uma postura democrática, o país não está imune de procedimentos ilegais e ilegítimas, que deturparam e ainda deturpam muitas verdades, desvirtuando a essência da política, caiando os interesses caliginosos através da defesa das ideais enganadoras. O ilegal e ilegítimo tornara-se “legais e legítimos”. A obscenidade não deve ser um dos adjetivos que ainda continua sobrestando a política guineense, porque a política se faz com a moralidade.

Portanto, fica patente que os politiqueiros que estão na organização política, social e econômica do país, não querem mudar esse sistema, por isso, não podemos criticá-lo e uma análise pública. Posto isto, Martinez (1991) afirma que esse é o motivo por que os politiqueiros do sistema atual baseiam as suas campanhas, os seus discursos nas necessidades básicas de grande maioria empobrecida, que apesar de sofrer com as desonestidades destes, eles devem continuar acreditando que o sistema vigente pode resolver os seus problemas, bastando para isso ouvir e aceitar sem, no entanto, uma reflexão crítica dos discursos políticos, ou seja, sem fazer uma análise do discurso para entender dos interesses destes politiqueiros.

O entendimento profícuo do que se vive no país passa necessariamente na ampliação dos conhecimentos a respeito do poder e na participação positiva que a população guineense tem em defesa do BEM MAIOR. Deve haver uma educação política centralizada na educação participativa dos bissau-guineense.

É importante dizer que a democracia implica um conjunto de elementos não só as instituições com o fito de tomar as decisões sobre as demandas da coletividade. Dar-se, mais de uma eleição, mais do que um meato, mas ela [DEMOCRACIA] envolve um conjunto de princípios morais e éticos, e concepções jurídicas que guiam os condutos democráticos. Nesse sentido, quem quiser dirigir os homens e as mulheres deve atender mais aos desejos deles ou delas do que aos próprios (SPROTT, s/d apud AZAMBUJA, 1969).

A Guiné-Bissau é um país onde a corrupção tornou-se sinónimo de política, subsequentemente, da "honestidade, do rei e do imperador" sobre todos os processos que regem a nossa vida, enquanto povo. Entregamos, aliás, não sei se se entregamos os nossos destinos nas mãos destes politiqueiros ou dos desonestos, ou dos 𝑭𝒖𝒓𝒕𝒂𝒅𝒖𝒓𝒊𝒔 das coisas públicas, mas o certo é que dizem ser os nossos representantes.

Escândalos políticos fazem parte do nosso quotidiano político, enquanto bissau-guineense e, lamentavelmente, o povo parece já ter se familiarizado e/ou acostumado a isto. Ouvir no noticiário, nos jornais, nas redes sociais que algum governante andou a burlar leis, roubou, subordinou e usou a venalidade, nepotismo, ou outras práticas contra o bom funcionamento das instituições públicas, já não nos chama mais atenção, porque isso de alguma maneira foi naturalizado e ninguém é responsabilizado. Não choca mais o ouvido de qualquer pessoa, porque mesmo o povo, vendo de forma clara, aparecerá alguém que vai dizê-lo que isso não é a verdade. Simplificando isso, por exemplo, mesmo o povo vendo “𝒅𝒊 𝒌𝒖𝒎𝒂 𝒊 𝒎𝒂𝒏𝒈𝒐 𝒊 𝒏𝒂 𝒕𝒆𝒎 𝒖𝒎 𝒑𝒐𝒍í𝒕𝒊𝒄𝒐 𝒌𝒊 𝒏𝒂 𝒇𝒂𝒍𝒂𝒍 𝒊 𝒃𝒂𝒕𝒂𝒕𝒂". Triste realidade.

Questionam-se os bissau-guineenses: "em meio a tanta impunidade dos desonestos que pintam e bordam na sociedade do nosso país, até quando a massa aceitará em silêncio tanta desonestidade e falta de punição? Até quando o povo aguentará sustentar uma corja de marajás que não sequer tem noção das dificuldades pelos quais o país passa?", questiona (Kathlen Heloise Pfeiffer).

As respostas para estas perguntas são multidimensionais, mas aqui quero afirmar o seguinte: o povo aguentará enquanto não tiver a oportunidade de ter um sistema educacional que o inclua, ele (povo) será sempre excluído;

- o povo aguentará enquanto não tiver a formação e conhecimento para desmistificar as mentiras dos politiqueiros;

- o povo aguentará enquanto não tiver arcabouços científicos (ou não) para da maneira correta e participativa intervir e provocar mudanças positivas no quadro político guineense;

-o povo aguentará enquanto não tiver quem o represente de forma condigna e que coloque os interesses do povo em primeiro plano, em detrimento dos seus;

- o povo aguentará enquanto não tiver atitude ativo na política; e

- o povo aguentará enquanto tiver um político desprovido da capacidade intelectual, humana e técnica para dirigir os interesses nacionais.

Alguém já ouviu os ditos políticos a discutirem a questão do funcionamento de uma universidade pública no país e/ou a criação de uma universidade para receber os/as discentes? Não estão interessados, porque sabem muito bem de que não dar uma educação aos bissau-guineenses é escravizá-los económica, social, histórica, cultural e politicamente.

Com a ausência dos pressupostos basilares que permitem uma fiscalização que o povo poder vir a fazer, isto é, praticamente impossível exigir o cumprimento da lei, e se for, de um lado, estar-nos-emos perante uma situação de novidade, por outro, estar-nos-emos à frente da realidade nacional que exige a intervenção de todos para o BEM MAIOR. Com um setor de educação deficiente, ou melhor, inexistente, a base educacional bissau-guineense vem formando indivíduos que só sabem abaixar a cabeça e contribuir, na maior parte das vezes inconscientemente, com a corrupção crescente, sendo coniventes e esperando que alguma solução divina caia do céu. 𝑵𝒉𝒂 𝒅𝒋𝒊𝒏𝒕𝒊𝒔 𝒏𝒂𝒅𝒂 𝒌𝒂 𝒏𝒂 𝒌𝒂𝒊 𝒅𝒊 𝒄é𝒖 𝒔𝒊 𝒏𝒐 𝒄𝒐𝒎𝒑𝒐𝒓𝒕𝒂𝒎𝒆𝒏𝒕𝒐 𝒌𝒂 𝒎𝒖𝒅𝒂.

Em sinopse, o país continuará sendo palco de corrupção, nepotismo, venalidade, escândalos políticos, traição, discussões sem pleitos para o desenvolvimento do país por muito tempo. Enquanto cidadãos não possuírem base educacional suficiente para terem consciência da sociedade em que vivem e assim estarem condicionados para contestá-la, restará ao povo guineense a esperança de dias melhores, e a crença no dito popular de que a justiça tarda, mas não falha. O que no caso guineense parece ser uma coisa utópica.

Estamos perante uma sociedade política desgovernada pelos próprios 𝒇𝒊𝒅𝒋𝒖𝒔 𝒅𝒊 𝒅𝒋𝒐𝒏! Por isso, há uma necessidade urgente da mudança de conduta. Políticos que não dão exemplos não merecem ser os nossos representantes, por simples razão "eles não nos representam".

Paulo Anós Té (N’Dermei)

Bacharel em Humanidades e licenciando em Sociologia pela Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB/CE).

Referências bibliográficas

AZAMBUJA, Darcy. Introdução à ciência política. Globo Livros, 1969.

BONAVIDES, Paulo. Ciência política. Malheiras Editores, 2000.

MARTINEZ, Paulo. Política: ciência, vivência e trapaça. Moderna, 1991.

WEBER, Max. Ciência e política: duas vocações. Editora Cultrix, 2015.

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