Estamos à beira de mais uma eleição, mais
um momento que muitos de nós vão exercer seus direitos cívicos de voto, sendo
cidadãos guineenses à altura de exercício de tal prerrogativa, que constitui
uma das principais características da democracia desde seus primórdios na
Grécia antiga, a pesar de algumas reinvenções e novas configurações ao longo do
tempo, o quesito voto continua permeando a prática democrática na contemporaneidade.
Este artigo analisa as noções de padrão de
comportamento eleitoral, visando proporcionar a compreensão holística sobre
quais os condicionantes do voto, isto é, como fatores socioculturais, psicológico,
territoriais e apreciação racional de custo-benefício influenciam senão determinam
o voto dos eleitorados, ou seja, como votar e em que partido político ou
candidato votar. Assim sendo, com base nesta elucidação pretende-se descontruir
as falácias grafocêntricas desprovidas de cientificismo e movidas pelo
preconceito contra os moradores de zona rural, caracterizada por precariedade de
vários níveis.
É um
axioma, aliás, é indubitavelmente visível o rotulo que a nossa elite política, intelectual
e econômica, bem como a maioria dos moradores da capital Bissau principalmente,
fazem sobre os eleitorados menos
escolarizados e que vivem em regiões que compõem a divisão administrativa do
território guineense e partir disso criou-se no imaginário coletivo uma
narrativa simplista, incongruente, preconceituosa e de arrogância grotesca
advinda, evidentemente de um nanico repertório conceitual e analítica sobre
comportamento eleitoral, vide a repercussão dos discursos proferidos por algumas
personalidades políticas nas últimas eleições legislativas deste ano e a
discussão que se faz no meio acadêmico e social sobre a temática em questão.
Com
isso, considera-se que os eleitores menos escolarizados e das zonas rurais “não
sabem votar, são facilmente enganados”, em outras palavras, é fácil manipulá-los
e comprar seus votos, haja vista o nível de precariedade socioeconômica e
material que permeia o cotidiano destes indivíduos, por exemplo, se diz basta
só “oferecer-lhes” gêneros alimentícios ou construir uma pequena infraestrutura
escolar, isso se for fazer muito, em
suma, é só resolver de ponto de vista material mesmo que seja sazonalmente
alguns problemas sociais básicos duma determinada comunidade (aldeia) que
o Estado guineense não consegue dar conta há muito tempo.
Agora
adentramos na questão principal deste artigo que é a falácia do “votar errado”,
ou não saber votar. Primeiramente vale lembrar que comportamento eleitoral é um dos campos mais antigo
e importante da ciência política, a partir do qual se versa sobre fatores que
explicam o comportamento dos eleitores, isto é, por que votam e como votam. Daí
que, se considera que nenhum voto é irracional, Key Jr. (1966) adverte que os
eleitores “não são tolos”. Demonstrando deste modo que, a maior parte dos
eleitorados comportam de forma racional e responsável do que prevê o senso
comum, eles são influenciados por fatores como: escolhas que lhes são
oferecidas e as informações que estão disponíveis.
Por seu turno, Telles e Mundim (2018, p.350), a
partir das principais abordagens sobre os eleitores avaliam e classificam a
decisão de voto em: macroprocessos e microprocessos. O primeiro é entendido a
partir de dois paradigmas principais: o
histórico cultural e político institucional. A dimensão do microprocessos
avalia a participação política e o comportamento eleitoral dos atores numa
perspectiva individual, particular. Por outro lado, Figueiredo (1991) e Bartels
(2008), falam das teorias sobre a decisão de voto e as classificam em:
sociologia de voto, psicologia do voto e a escolha racional.
Resumidamente a sociologia do
voto, ou voto sociológico, sustenta que “as pessoas votam em grupo” e “uma pessoa pensa politicamente, como ela
é, socialmente” em suma, esta corrente busca entender a maneira como processos
socioeconômicos e culturais interferem na conduta política dos eleitores. A
psicologia do voto ou voto psicológico, demonstra a proeminência dos valores
adquiridos no processo de socialização que podem ser determinantes para
decisões políticas, na qual o voto é direcionado ao partido ou candidato que
melhor represente esses valores, ou seja, esta corrente enfatiza mais a relevância que os valores (morais,
sociais e políticos.) adquiridos durante os processos de socialização podem
exercer na decisão política de votar.
Finalmente analisa-se a escolha
ou voto racional desenvolvida grandemente pelo Anthony Downs (1999 [1967]), na
perspectiva deste autor “os eleitores são indivíduos racionais, entendendo-se
por isso autointeressados, seja no próprio bem-estar (egoísta) ou no bem-estar
alheio(altruísta)”. Ou seja, os eleitores dispõem de competência de classificar
suas preferências baseadas nos benefícios esperados de cada uma das suas
escolhas e opções que lhes são oferecidos, bem como de propor ação mais
acertada para alcançar seus objetivos ou metas. Em outras palavras, para este
autor, a ação de votar é resultante de uma avaliação baseada na relação custo-benefício
de certa atitude ou decisão participativa. Por conseguinte, salienta que “ao
atuar de modo racional, o eleitor busca diminuir os custos de sua participação
e aumentar suas vantagens pessoais”.
Com base nestas abordagens sobre
elementos que constituem a dinâmica de decisão política, mormente a de como os
eleitores votam e por que preferem um candidato/a em detrimento de outro/a,
pretendo chamar atenção à nossa sociedade em geral, especialmente aquelas
pessoas que tiveram oportunidade de serem mais escolarizadas, e obviamente as
que vivem no centro urbano (capital Bissau), que incontestavelmente têm mais
vantagens de acessos às informações e melhores condições de vida, precisamos entender
que nossas necessidades de ponto de vista material são quase que totalmente
adversas e que votamos em um candidato ou partido político a partir duma
reflexão lógica acerca das nossas necessidades e questões matérias prementes
que permeiam nosso dia a dia, a mesmíssima lógica funciona com indivíduos menos
escolarizados, de classe baixa e que vivem distante da capital.
Portanto a minha intenção aqui é admoestar
e lembrar aos meus compatriotas que, primeiro: não existe voto errado ou voto
inconsciente; segundo: os votos ou as escolhas no campo eleitoral não têm uma
relação intrínseca e verossímil com o nível de escolarização ou com a dicotomia
territorial urbano/rural, quer dizer que, o fato de ter mais nível acadêmico,
morar na capital e ter mais acesso às
informações não torna automaticamente seu voto melhor, certo ou mais racional
que o de qualquer pessoa desprovida destes atributos.
Para finalizar, exorto a todos/as
que abstenhamos deste preconceito farsante que considera o voto certo só quando
é conveniente, e errado quando não, e que saibamos respeitar a liberdade de
pensamento e escolha de cada cidadão pautada geralmente nas demandas básicas
individual a priori, e posteriormente na coletividade republicana.
Nha mantenhas, pa Deus abenssua
nô Guiné-Bissau!
Por: Nando Paulo Suma
Bacharel em Humanidades e
Licenciando em Ciências Sociais na UNILAB
São Francisco do Conde, Bahia,
Brasil. 11/11/2019
Referência:
TELLES, H.S.; MUNDIM, P. S. Comportamento
eleitoral e comunicação política. In: MENDONÇA, R. F.; CUNHA, E. S. M.
(org.). Introdução a teoria democrática: conceitos, histórias, instituições e
questões transversais. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2018.
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