sexta-feira, 5 de novembro de 2021

Ministro da Saúde desconhece a figura do Alto Comissariado no seu pelouro

 

O ministro da Saúde Pública reconheceu a existência de dificuldade na interpretação da figura do Alto Comissariado para Covid-19 em relação ao Ministério da Saúde Pública, tendo em conta as circunstâncias da sua institucionalização.

Em entrevista ao Nô pintcha, Dionísio Cumba explicou, por outro lado, que o processo da instalação da fábrica de oxigénio está num bom ritmo, devendo deslocar-se brevemente a Portugal para assistir a fase de montagem.

Eis o conteúdo da entrevista.

Numa das suas entrevista à imprensa nacional, o ministro disse que há dificuldade de relacionamento com o Alto Comissariado. A que se deve essa dificuldade?

Há dificuldade de relacionamento com o Alto Comissariado desde o início, mesmo com o meu antecessor, porque existe dificuldade de interpretação da figura do Alto Comissariado com a tutela a nível da Presidência da República, tendo em conta que essa figura foi nomeada pelo Chefe de Estado, num momento de transição, porque o Governo na altura não tinha reconhecimento internacional.

Perante isso, os parceiros da Guiné-Bissau, incluindo o Ministério da Saúde estavam acima do muro e ninguém fazia nada, havia uma Comissão Interministerial que assumia a gestão das finanças dos fundo destinados ao combate à pandemia da Covid-19.

O Presidente da República tinha este privilégio de poder dirigir o país, na altura com o reconhecimento que teve a nível internacional, tinha a autoridade e tomou a liberdade de criar o Alto Comissariado para dar resposta à situação da Covid-19 que estava a alastrar no país. Portanto, quando a figura de Alto Comissariado foi instituído tirou todos os poderes ao Centro de Operações de Emergência em Saúde(COES), dirigida pelo Primeiro-Ministro. Quanto à situação de emergência, quem decide para criar o Alto Comissariado é o Chefe do Governo, mas dada a situação de não reconhecimento dessa figura, o Presidente da República assumiu a responsabilidade de criar o Alto Comissariado.

Foi a partir desta data que se instalou algum problema a nível do sistema sanitário e na forma de interpretar o termo e a referência do Alto Comissariado na gestão da pandemia.

Até hoje, o Alto Comissariado está diretamente ligado à Presidência da República e não ao Ministério da Saúde como devia acontecer, e tudo que decide é da sua inteira responsabilidade, enquanto responsável e colaborador do Presidente da República na gestão da situação, enquanto o Ministério da Saúde fica à margem a espreitar as posições.

O Ministro disse que tem receio das vacinas que o país recebeu dos parceiros perderem a sua validade antes de ser utilizadas. Quais as medidas que o Ministério está empreender para precaver a situação?

Como estava a dizer a propósito de relacionamento com o Alto Comissariado, sobretudo entre a direção vocacionada que é o Programa Alargado de Vacinação (PAV).

E, também, ao Alto Comissariado, enquanto gestor de toda a política de vacinação e logística. Esta dificuldade existe, porque o PAV faz uma programação como habituava fazer com outros tipos de vacinas.

Outrossim, o Alto Comissariado tem a sua política também de vacinação, pois, às vezes há uma gestão de incongruência dos dois programas, daí que nasce esta situação de conflitos e, também, a dificuldade de podermos ter uma política única.

Acontece que o PAV disse que tem programado para fazer espécie de vacinação de rotina nas estruturas e o Alto Comissariado pensa que tem que ser de outra forma.

 A mais adiante, há sempre a parte técnica do Ministério de Saúde que são os recursos humanos que estão aí de braços cruzados, porque querem ser pagos para fazer atividades de vacinação.

Eles podiam continuar a fazer e não fizeram, porque acham que não é o Alto Comissariado que deve dar esta ordem deles poderem fazer a vacinação. Esta confusão toda faz com que, até então, ainda não temos assim uma capacidade de imunização elevada no país com a quantidade de vacinas que nós temos cá.

E, nesse momento, tinham 26 mil doses que infelizmente iam expirar no final do mês de Outubro, que deviam ser utilizados há muito tempo. O processo começou e depois chegou a um momento e parou, porque os técnicos estavam a exigir pagamento, deixando de fazer a vacinação. Como sabem, algumas vacinas foram doadas pela cooperação portuguesa, Suécia, estando em risco de expirarem.

Estive na semana passada com o Alto Comissariado e o PAF também esteve presente, tentamos apertar o cerco para podermos criar um mecanismo que podia facilitar este processo de vacinação de massa, para consumarmos essas vacinas para não deixar que elas fossem atiradas ao lixo.

 Recebi a garantia tanto da parte do PAF como do Alto Comissariado, que a nível de todo o território nacional íamos conseguir consumar todas essas vacinas, a formação que faltava foi feita e o microplano concluído desde dia 25 de Outubro findo, teríamos já arrancamos a campanha de vacinação e, ao que tudo indicava, estávamos em condição de poder evitar esse desperdício de vacinas.

O Ministro tinha prometido a instalação da fábrica do oxigénio. Para quando a sua concretização?

A montagem da fábrica está a ser feita em Portugal, ainda no dia 3 de novembro vou estar no Porto, para verificar o nível da montagem, de forma a poder mandar dois técnicos de manutenção que vão participar na última fase dos trabalhos, assim quando voltarem cá poderem estar a altura fazer a manutenção da máquina.

A fábrica foi adquirida pelo Governo, porque dada a situação de dificuldade que nós assistimos durante a segunda vaga de coronavírus, assim como nesta terceira por falta do oxigénio, fazendo, a última hora, recurso a Dakar para buscar garrafas do oxigénio.

O Governo achou por bem que tinha que fazer ação deste tipo, em tempo record, para instalar uma fábrica de produção do oxigénio no Hospital Nacional Simão Mendes.

Há outros projetos que são de reforço de sistema, que foram elaborados durante a conceção do Plano de Emergência da Covid, que ainda está a ser discutido e, como é natural, há todo um aspeto burocrático, e isso leva muito tempo. Não podíamos estar a perder o tempo com garrafas, aquilo que nós gastamos até hoje na compra de garrafas em Dakar, podíamos construir uma fábrica aqui em Bissau.

Sei que a OMS está a trabalhar nesse sentido, aliás, mandou uma equipa a fazer o levantamento em março, depois outra equipa veio cá recentemente e estão neste momento no processo de elaboração de um plano para a construção de fábricas de produção de oxigénio em cinco hospitais do país.

Este é um processo que leva muito tempo, e nós não vamos poder estar a espera esse tempo todo, porque há uma necessidade, nesse momento em que estamos viver numa fase em que a Covid parece estar mais ou menos com os números muito baixo, temos que redobrar esforços para garantirmos as condições básicas na eventualidade de viermos a ter mais outra vaga, evitar as perdas de vidas por falta de oxigénio.

Vou a Portugal para inteirar-me dessa situação e quando voltar vou poder pronunciar em que nível está a montagem da fábrica. Ao que tudo indica que no final de novembro vamos ter fábrica a produzir o oxigénio no país e limitando assim esta dependência externa.

Qual é a conclusão que o ministro tira da sua visita às regiões sanitárias?

Foi uma missão muito vantajosa, porque permitiu-nos fazer um diagnóstico no terreno, a perceber melhor as infraestruras sanitárias que temos, como estão em termos de equipamentos, de abastecimento de água, da energia elétrica, também de acesso aos centros de saúde.

De igual modo, saber como estão as estruturas sanitárias primárias em todo território nacional. Já percebemos também a dimensão e a capacidade das estruturas em termos de densidade populacional, sobretudo nos hospitais regionais. Gabu, por exemplo, a população aumentou muito em relação ao passado, ou seja, quando fora projetado a construção daquele hospital. Portanto, percorremos dez regiões sanitárias, faltando só de Farim, mas temos, pelo menos, uma ideia global, vimos o centro de saúde tipo A, B e C, condições que eles estão, isso permite-nos agora fazer um plano de ação muito abrangente e que vai permitir melhorar a qualidade de assistência da nossa população. Foi uma visita muito boa que permitiu ao Ministério da Saúde ter a ideia da fragilidade que existe a nível do nosso sistema no seu todo, e vai-nos possibilitar ter uma politica muito mais eficaz para dar resposta aos variadíssimos problemas que a nossa população tem, sobretudo a nível das comunidades.

Constatamos a situação das ilhas que merece ter a sua politica especial, dada a especificidade e a dificuldade que tem em termos de navegação e de comunicação entre as ilhas. Vimos alguns centros de saúde que merecem ser requalificados, porque não têm condições mínimas para poder responder e vimos que há uma necessidade de criar verdadeiros hospitais de referências mais modernos com especialidades que vão poder dar resposta para evitar a constante evacuação dos nossos pacientes para os outros países, dado que a saúde é uma coisa soberana. Sem este diagnóstico não íamos ter ideia daquilo que nós vamos incluir nesse plano, que vai ser orçamentado envolvendo também vários outros ministérios chaves, neste caso, Obras Públicas, Energia, Administração Territorial, Turismo, Ambiente. Eles têm que participar neste processo para dar opinião técnica daquilo que é necessário fazer, para podermos ter um sistema sanitária muito robusta com capacidade também de poder fazer qualquer tipo de diagnóstico e o tratamento interno de pacientes.

Quais são as medidas administrativas que o Ministro vai adotar para acabar com o boicote dos técnicos nos hospitais?

O boicote é um crime, porque não está na lei, quem o fazer está a cometer um delito.

O Governo está a fazer a avaliação da situação e o Ministério da Saúde fez o trabalho de base para identificar novos ingressos que não estão a receber salários, e descobrimos que alguns já estão receber, embora uma parte continua a aguardar as tramitações normais, que não dependem apenas do Ministério da Saúde.

A verdade é que eles estão com pressa de ver resolvido o problema, desconhecendo as regras administrativas que assistem o processo de enquadramento do pessoal na Função Pública.

Relativamente ao estatuto da carreira, o documento foi aprovado em 1992, mas precisa de ser adaptado para depois enquadrá-lo. Estamos a trabalhar com o próprio sindicato para encontrar o enquadramento deste dois diplomas, para que não haja conflito, embora haja uma certa morosidade no processo, mas com a pressão desta forma não vai facilitar a situação.

Adelina Pereira de Barros

Conosaba/jornalnopintcha.

Sem comentários:

Enviar um comentário