À medida que se aproximam as negociações decisivas para o processo de paz na Síria, com a segunda ronda de conversações prestes a terem início em Genebra, começa a ganhar forma a possibilidade de a Rússia vir a aceitar a partida de Bashar al Assad do poder.
Observadores próximos do processo de paz têm vindo a falar cada vez com mais insistência na existência de um alegado acordo secreto firmado entre Washington e Moscovo que deixa cair Assad e prevê uma nova Constituição e um novo governo eleito.
As declarações públicas, proferidas no início desta semana, por um alto dirigente iraniano, Ali-Akbar Velayati, que é conselheiro sénior do “Guia Supremo” Ali Khamenei, de acordo com as quais: “a manutenção de Bahar al Assad é uma linha vermelha para o Irão”, denotam que o Irão poderá já estar neste momento isolado no que diz respeito ao futuro de uma solução negociada para o conflito sírio.
Esta semana surgiram, aliás, sinais claros de uma crescente divergência e até mesmo acrimónia entre Teerão e Moscovo, refletidos no diário iraniano Kayhan, que no editorial da sua edição da última segunda-feira, afiram sobre esta questão que: “embora a Russia tenha grande peso na estratégia nacional síria, não está em condições de impôr unilateralmente a sua vontade. Durante mais de 50 anos, a Síria esteve sempre próxima da União Soviética e depois da Rússia, mas nunca pertenceu ao bloco soviético.”
O editorial cita também a guerra de 33 dias entre Israel e o Hezbollah, em 2006, para ilustrar a capacidade da Síria para desafiar a influência da Rússia, uma vez que, durante essa guerra, a Rússia instruiu Bashar al Assad para não fornecer armas russas ao Hezbollah e Assad, a pedido do Irão, ignorou essa solicitação.
O editorial do Kayan continua depois no mesmo tom, especificando que durante a guerra entre Israel e o Hezbollah, Putin autorizou que os judeus russos combatessem ao lado de Israel em determinadas regiões, como foi o caso da localidade de Bint-Jubail, e ao mesmo tempo oficiais e peritos militares sírios operavam lado a lado, diariamente, com os militares do Hezbollah.
“Ainda que existam algumas divergências estratégicas entre Damasco e Moscovo, entre Damasco e Teerão o alinhamento é completo”, pode ainda ler-se no referido editorial. “A dependência da Síria da Rússia não é absoluta. O Irão tem vindo a fornecer toda a gama de armamento que a Síria precisa para o médio-prazo.”
O jornal assume depois, no mesmo editorial, uma linguagem ainda mais dura face a Mosocovo: “A influência da Rússia na Síria deve-se ao facto de ter alinhado ao lado do Irão, do governo sírio e da frente de resistência em geral. Se a Rússia deixar este lado, torna-se um ‘player’ marginal no conflito.”
A este propósito, referido jornal detalha ainda que “a Rússia entrou no conflito em outubro último de acordo com um plano preparado pela Guarda Revolucionária Iraniana em Teerão que foi apresentado ostensivamente a Putin pelo comandante-geral da Quds Corps (a força especial da Guarda Revolucionária responsável por operações extra-territoriais), general Qassem Soleimani, durante a sua visita a Moscovo. De acordo com este plano, a participação militar russa deveria durar 5 meses, período que terminou justamente no mês passado, quando Putin ordenou a retração das forças russas na Síria.” E acrescenta ainda: “o Irão avalia positivamente o início do afastamento da Rússia do conflito e considera ser melhor para a Síria que todas as forças russas abandonem o teatro de operações.”
A finalizar, o jornal Kayan diz ainda que “o Irão não teria feito tantos sacrifícios e oferecido tantos mártires na Síria durante 5 anos para agora os trair por um acordo entre Moscovo e Washington. Os últimos 30 anos provam que seja qual for o acordo que façam excluindo o Irão, relativamente às nações da linha da frente da Revolução, (Líbano, Síria e Iraque), está condenado ao fracasso”.
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