Paulo Gorjão, diretor do Instituto Português de Relações Internacionais e de Segurança (IPRIS)
O Presidente da Guiné-Bissau, José Mário Vaz, demitiu (13.05.) o Governo das suas funções. Longe de resolver o impasse político e institucional do país a decisão veio aprofundar a crise, afirma o analista Paulo Gorjão.
Na entrevista à DW África o analista Paulo Gorjão, director do Instituto Português de Relações Internacionais e de Segurança - IPRIS – fala das causas deste mais recente desenvolvimento na Guiné-Bissau, um país mergulhado numa grave crise política desde agosto de 2015.
DW África: A demissão do Governo da Guiné-Bissau era inevitável?
Paulo Gorjão (PG): A demissão era inevitável mas a solução encontrada pelo Presidente é que não era necessariamente a desejável . Parecia-me evidente que este Governo não tinha qualquer tipo de viabilidade, isto é um facto.
DW África: Pode-nos dizer porque é que a solução encontrada pelo Presidente José Mário Vaz não é a seu ver viável?
PG: O que temos vindo a assistir é um braço de ferro entre o PAIGC e o Presidente da República com evidentes implicações na relação do poder entre o PAIGC e o Presidente como é óbvio. O Presidente não quer eleições enquanto PAIGC quer eleições por razões opostas mas que vão ambas no mesmo sentido. Ou seja, o PAIGC quer eleições para renovar a sua legitimidade eleitoral e política. O Presidente percebeu isso. Sabendo que é essa a vontade do PAIGC, algo que lhe retira manobra e espaço político por isso o Presidente não quer essas eleições. O Presidente alegou que não existem condições financeiras. Evidentemente a Guiné-Bissau é um país muito pobre mas não é certamente o dinheiro a razão de ser para não haver eleições. O que se passa é que o Presidente percebeu que se houver eleições e como é natural que seja o PAIGC a ganhá-las, politicamente ele seria o grande derrotado. E é só por essa razão que não há eleições. Tendo optado por manter o Parlamento, numa primeira fase , e dar ao PAIGC a oportunidade de formar um novo Governo, na prática o que estamos a fazer é protelar a solução desta crise que está instalada desde agosto de 2015.
DW África: Mas a forma como descreve a situação deixa surgir a imagem de um Presidente que põe em risco a estabilidade instituticional e política de todo um país apenas para ganhar mais poder?
PG: Mas não é isso que tem estado a acontecer ? O que me parece desde o princípio é que o Presidente José Mário Vaz desde que foi eleito ou muito pouco tempo depois da sua eleição tem sido um foco permanente de instabilidade. Convém lembrar que este Presidente levou à demissão de Domingos Simões Pereira sem razões concretas, objetivas, palpáveis e convincentes nesse sentido. Portanto, na minha leitura este Presidente tem vindo permanentemente a querer dar às funções presidenciais poderes e uma intervenção política que ele de facto não tem. E por essa via ele tem sido um foco permanente de instabilidade como se tem visto.
DW África: Será que podemos agora esperar que haja, mesmo que seja nos bastidores e longe dos olhos do público, uma verdadeira pressão internacional dos doadores sobre a Guiné-Bissau para que se resolva esta crise?
PG: Não sei se se poderá esperar nesta altura essa posição concertada, mas certamente haverá alguma pressão. A questão é saber que instrumentos de pressão os doadores têm junto do Presidente da República. Não tenho a mais pequena dúvida que desde agosto do ano passado essas pressões têm sido exercidas de forma discreta, mas sem resultados aparentes. Convém lembrar que a própria CEDEAO (Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental) já por mais de uma vez enviou representantes seus a Bissau para tentar de algum modo resolver esta crise instalada, não tenho dúvidas que a CPLP (Comunidade de Países de Língua Portuguesa) terá feito o mesmo e de forma mais ou menos explícita a União Europeia também, até porque tem uma carta importante para jogar que é o dinheiro que foi alocado à Guiné-Bissau na mesa redonda do ano passado. Aparentemente, os atores políticos ou pelo menos um deles tem permanecido indiferente a tudo isso. Portanto não sei se a comunidade internacional de tem de facto nesta altura os instrumentos adequados para contribuir na solução do impasse. Julgo que em primeiro lugar o impasse terá que ser resolvido a partir do interior da Guiné-Bissau e aí sim, com o apoio da comunidade internacional tentar relançar a Guiné-Bissau num caminho de prosperidade tão distante nesta altura.
DW África: No passado situações similares na Guiné-Bissau levaram a intervenção do exército. Como avalia esta possibilidade atualmente?
PG: Não temos visto sinais de que isso possa acontecer, nem se tem visto sinais por parte parte dos próprios atores políticos a tentação de recorrer às forças armadas para de algum modo desequilibrar os pratos da balança. Mas é uma hipótese que também não excluo. Se me pergunta se é provável neste momento, não tenho razão nenhuma para crer que seja. Se excluo-a liminarmente, claro que não.
DW África: E como vê o futuro imediato da Guiné-Bissau?
PG: Com muita apreensão mas enfim com alguma tristeza de quem é amigo da Guiné- Bissau. Para já não vejo nenhuns indicadores de que esta crise tenha uma solução à vista. Vejo um impasse instalado e receio que a situação possa piorar antes de melhorar. Não vejo sinais para ser otimista nesta altura e o que me parece é que este impasse está para ficar pelo menos a curto e médio prazo e tudo isso com as repercussões inevitáveis na própria população em geral que em última instância é quem sempre sofre com toda esta instabilidade. Nada disto é amigo da prosperidade e esta crise política não contribui para que os doadores aloquem o dinheiro que prometeram e não contribui em nada para que empresários e os próprios cidadãos da Guiné-Bissau invistam o seu dinheiro num clima deste. Portanto vejo-o com muita apreensão e com muita tristeza.
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