[ENTREVISTA] O líder do Partido Republicano para a Independência e Desenvolvimento (PRID), António Afonso Té, exortou a classe política guineense a despolitizar a reforma das forças armadas e que o governo deve esclarecer os conceitos da reforma que, segundo a sua explicação, “não é só tirar alguém e pôr outra pessoa, não” .
“A Guiné-Bissau precisa de sangue novo, de jovens, para dar dinamismo ao país.
A reforma nesse sentido foi o que eu disse logo no início. A cooperação com os parceiros deve orientar-se nosentido de criarmos escolas militares no país. Para criar escolas militares no país, precisamos de preparar militares novos e capacitados para que amanhã estejam à altura de instruir e dar aulas nessas escolas. É preciso que tudo se crie, que essas reformas sejam feitas e que a legislação, que penso já existir, seja respeitada e que as forças armadas se subordinem ao poder político, mas isso é possível apenas com as reformas”, assegurou o antigo vice-chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas da Guiné-Bissau, durante uma entrevista [agosto de 2022] ao semanário O Democrata para falar das áreas que devem ser priorizadas na cooperação a nível da defesa com a França ou com qualquer país que queira apoiar a Guiné-Bissau nessa matéria.
O coronel na reserva e atualmente líder de uma das formações políticas do xadrez político guineense defendeu que a cooperação com o governo francês no setor da defesa ou qualquer outro país deve basear-se primeiramente na formação do pessoal, mas já com escolas militares e instituições militares de ensino.
“Não existe a possibilidade de se desenvolver as forças armadas sem ser baseada na formação do pessoal: formação técnica e académica para que os militares estejam em posição de resolver osproblemas do país”, defendeu, acrescentando que a Guiné-Bissau deve apresentar à França o quadro geral das áreas em que quer que este país apoie o nosso.
Avançou que o país deve continuar a trabalhar, estar de pés firmes no chão e apresentar projetos do interesse do país, que não sejam aceites projetos que não sejam favoráveis à Guiné-Bissau.
O Democrata (OD): António Afonso Té, a França acaba de anunciar um acordo de cooperação no domínio militar com as Forças Armadas da Guiné-Bissau. A Guiné-Bissau vista como “parente pobre” em termos das minas e dos interesses geopolíticos, o que motiva a França a retomar a cooperar com o nosso país e particularmente a nível da defesa?
António Afonso Té (AAT): A França já vinha apoiando a Guiné-Bissau. Quando eu dirigia o departamento de cooperação técnico-militar, já havia enviado para a França alguns militares guineenses para formação e voltaram. Houve até tentativa de dar-me bolsa. A França queria que eu fosse estudar, mas a nível das forças armadas quase tudo já estava consumado, por um lado, por outro, devido à guerra não tive tempo de selecionar outra pessoa que fosse fazer o curso de Estado-Maior.
Essa cooperação já durava há muito tempo. Não veio à tona apenas com a visita do Presidente francês, já existia cooperação técnico-militar entre as forças armadas da Guiné-Bissau e da França, também a nível das forças de segurança.
A França preparou a primeira Polícia da Intervenção Rápida (PIR) do Comissariado da Polícia de Ordem Pública e equipou-a. Portanto, já havia cooperação técnico-militar com a França do ponto de vista operacional, da saúde e da formação. Já estávamos preocupados com a profissionalização, a formação técnico-profissional das forças armadas, para que pudessem estar à altura de executar as missões que lhes são conferidas pela Constituição da República. A nossa cooperação era essencialmente com os países do leste, mas com a intensificação das ações da “Perestroika”, eu estava na União Soviética, vi que o que se estava a passar poderiacair sobre nós e que se não estivéssemos preparados poderíamos ter algumas dificuldades antes de recuperarmos do que estava acontecer.
Tínhamos uma organização em termos de cooperação técnico-militar com os países do leste e Cuba, e com as reformas na Rússia, então União Soviética, nós já víamos que haveria alterações dos elementos basilares na cooperação técnico-militar. Por outro lado, era necessário que fossemos proativos no sentido de recuperarmosa confiança de todos os países que quisessem cooperar connosco, desde que respeitassem aquilo que nós professamos. Tivemos que diversificar as coisas e essa diversificação levou-nos a recuperar Portugal, continuar com a Cuba e os países da Europa do Leste que quisessem continuar a cooperar com a Guiné-Bissau. Mas era necessário ver do lado de Portugal e da França.
Em 1991 assinamos um memorando de cooperação técnica com a Argentina, porque já estávamos a tentar encontrar uma solução capaz de dar-nos essa oportunidade de criar as forças armadas repúblicas. Era esse o objetivo, porque as nossas forças armadas eram de um partido, partido libertador. Na altura em que nós começamos a movimentarmo-nos para ver se conseguíamos alterar as coisas, já estávamos nas vésperas da adoção do multipartidarismo, o que significaria que alguns elementos ou paradigmas das forças armadas deveriam ser mudados para que elas pudessem ser capacitadas e adaptadas ao novo contexto que seanunciava.
Foi nessa altura que um grupo de militares formados em diferentes escolas militares do Ocidente e do leste chegaram à conclusão que era necessário transmitir aos mais velhos a sua visão sobre a situação e o que entendiam que se deveria ser feito na fase em que estavam. Depois de elaborado o documento de base, foram ouvidos pela direção superior das forças armadas (Ministro da defesa, Chefe de Estado-Maior General, Comissário Político, etc) que aceitarama proposta que fizemos. Fomos para Bubaque para um retiro de quatro meses para concebermos as ideias necessárias para a modernização que queríamos imprimir, no quadro das forças armadas. Isso aconteceu. Trabalhámos e voltámos. Chegou-se à conclusão que devíamos continuar e que as coisas deveriam ser feitas e foi nesse quadro, de acordo aquilo que já tínhamos visto e a visão que já tínhamos da situação das forças armadas no mundo e provavelmente que a bipolarização seria prejudicial, decidimosencontrar soluções para sobreviver nesse oceano de mudanças.
O mundo estava a mudar de forma rápida e nós devíamos ser capazes de adaptarmo-nos a essas mudanças, tendo em conta a nossa realidade. Foi assim que trouxemos a cooperação com a França, Portugal, Estados Unidos de América, Brasil e váriospaíses africanos, nomeadamente o Senegal, a Argélia, Marrocos, embora nem tanto, e países do Leste que quisessem continuar connosco.
Mantivemos uma posição que nenhum dos países que cooperasse connosco venha a impor-nos condições para cooperar connosco. Porque a tendência era que se tivéssemos a cooperar com o Ocidente, não poderíamos fazê-lo com leste europeu, vice-versa. Mas conseguimos equilibrar as coisas e fazer com que eles fizessem coisas nessa ordem das forças armadas guineenses. Foi assim que criamos, com os portugueses uma grande escola deengenharia militar, serviço de manutenção militar, o parque automobilístico e o parque mecânico.
Trabalhamos também com os franceses e os americanos. Com os americanos e franceses, a incidência foi mais sobre a formação. E conseguimos estabelecer as pistas para diversificar a cooperação técnico-militar com vários países. A partir daí, continuamos a trabalhar na construção de umas forças armadas que pudessem evoluir de forma normal , com as mudanças que estavam a acontecer na sequência da abertura ao multipartidarismos, onde o PAIGC já não era força guia do nosso povo.
Por essa razão teríamos de acabar com o comissariado político naforma como ele estava, porque era apenas um apêndice do partido nas forças armadas, que tinha como um dos objetivos fundamentais a orientação e a garantia da fidelidade das forças armadas ao partido. A nossa gente não nos compreendeu e tivemos enormes dificuldades de compreender também como era possível que não nos compreendessem. Mas, de forma pacífica, tivemos que trabalhar para convencer a nossa gente.
Vou dizer-vos uma coisa: uma vez quando estávamos a tentar recuperar Brá, o Chefe de Estado-Maior das Forças Armadas na altura, Ansumane Mané, mandou colocar os militares do Paiol de Brá em estado de alerta, porque estávamos a levar uma delegação portuguesa para aquele espaço, onde depois criamos a grande escola da engenharia militar e dos serviço material. Estávamos a levar essa delegação para mostrar quais eram as dimensões das nossas necessidades, para podermos ver como é que podíamos satisfazer aquilo que tínhamos como propostas para o setor. Fê-lo porque não estava de acordo com o ministro da Defesa Iafai Camará, mas o medo que ele tinha acabou por não se justificar, porque graças ao trabalho que fizemos a nível de Brá, colocamos o país em segurança com meios tecnológicos bastante avançados, ou seja, ninguém podia entrar no paiol sem que o alarme fosse acionado. Na altura em que fizemos esse trabalho, a Guiné-Bissau estava a ser acusada de ser a fornecedora de equipamentos earmamentos aos rebeldes de Cassamance.
Não importava a Guiné-Bissau entrar em conflito com países vizinhos imediatos, não. Segundo a carta da CEDEAO, nenhum Estado deve albergar uma rebelião ou alguma coisa que parecesse com uma rebelião para criar distúrbios no país vizinho. A partir desse momento, iniciamos o processo de modernização das forças armadas e as reformas que foram mal-aceites pelos políticos que pensaram que estávamos a tirar as forças armadas das mãos do PAIGC. Nasce assim a conspiração que consumou-se na guerra civil de 7 de junho de 1998. É verdade que muitas pessoas não aceitaram, mas algumas compreenderam a nossa intenção de que não era nada mais, nada menos do que adequar as forças armadas ao período que se avizinhava de forma a que se colocasse na devidaposição as forças armadas e respeitassem a Constituição da República e tudo que saísse daquele sistema que se ia montar.
OD: Afonso Té é militar de formação na reserva e chegou a ocupar cargo chave no exército guineense. Se tivesse que apontar áreas vitais para cooperação com a França, começaria por onde?
AAT: Começaria por tratar da formação do pessoal, mas já com escolas militares, instituições militares do ensino e instituições do ensino militar, porque não existe a possibilidade de se desenvolver as forças armadas sem ser com base na formação do pessoal: formação técnica e académica para que os militares estejam em posição de resolver os problemas do país. Naquela altura estávamos a preparar os militares a não reagirem aos diferentes momentos políticos, porque a nossa missão é efetivamente garantir a integridade territorial, a segurança externa e a calma do país. Infelizmente muitos não nos compreenderam. Alguns que pensávamos que não compreenderam, afinal compreenderam, mas não estavam de acordo, porque pensavam que, com o novo modelo e reformas nas forças armadas não poderiam satisfazer os seus intentos. E foi o que aconteceu.
Mas não estou a dizer isso para fundamentar algo, não. Na minha época, nós já havíamos diversificado a cooperação técnico-militar. Tínhamos com a França, UEA, Portugal, Cuba, a Rússia, embora latente, mas continuávamos. Porque depois começaram a cobrar-nos conselheiros nas forças armadas e tudo que nós quiséssemos, começaram a cobrar. Nós não tínhamos condições para sustentar essas exigências. Essa cooperação que agora o Macron anunciou com as forças armadas já existia.
OD: É a primeira vez que um Presidente francês visita a Guiné-Bissau. O que pode estar em jogo ou podemos admitir que estamos perante uma afirmação de uma França que está a perder alianças em África, particularmente na Costa. Por exemplo, no Mali e na Guiné-Conacri?
AAT: O que as pessoas talvez não saibam, o cidadão comum não saiba, a riqueza da Guiné não está apenas naquilo que ela pode ter no subsolo, mas também vem mais da sua posição geográfica, que vai expandir em direção à geopolítica e à geoestratégia. Portanto, podemos não ter a ideia concreta daquilo que somos, mas temos uma importância enorme no quadro da CEDEAO e da geopolítica na nossa sub-região. Talvez seja por força da psicose da pobreza. Não somos pobres. O que nos falta é trabalhar para atingir a riqueza que quisermos, mas temos tudo, terra, clima que nos é favorável à produção. O que temos que tentar fazer é ter uma liderança que esteja em condições de orientar o país para que produza e saia da psicose da pobreza.
OD: A visita de Macron à Guiné-Bissau pode ter a ver com a sua afirmação no bloco sub-regional?
AAT: Acho que sim. Porque seja como for, queiramos ou não, o peso da França na União Europeia acaba por impor. Nós gostávamos que ninguém tivesse peso na nossa organização sub-regional ou continental, mas se ainda precisarmos de apoios desses países para suportar as nossas operações, que são realizadas em função do processo de desenvolvimento dos nossos países, temos que tê-los em consideração, tanto mais que estamos numa situação de globalização. Cada um é membro e cada membro deve fazer esforços no sentido de trabalhar para o processo do desenvolvimento do seu país. O que eu quero dizer não significa de forma nenhuma que a Guiné-Bissau se deixe levar em duascantigas, não. Aliás, o povo guineense nunca aceitou isso. O guineense pode não saber liderar-se, mas ninguém manda nele. A Guiné precisa, é, de uma visão para sair da situação em que está. Mas qualquer fenómeno que se pareça um pouco com dependência o guineense é alérgico a isso. Muitos podem estar a pensar que o Macron veio à Guiné para tentar resolver os seus problemas e meter o nosso país na sua vassalagem, não. Só se os líderes atuais o aceitarem. Se não aceitarem, não pode acontecer. Não acho que devam aceitar, não. Porque estão lá para resolver os problemas dos interesses nacionais.
Os objetivos e os interesses são nacionais, mas deve ser estabelecida a cooperação. Eu tenho a minha opinião particular e pessoal em relação à França e o que ela provoca em África. Cooperar não significa meter-se debaixo de teto de alguém para que ele faça tudo e tu recebas Se assim for ficas de certo modo maniatado, não podendo reagir quando tiveres que reagir.
É verdade que a Guiné-Bissau não é um espaço francófono, é um espaço lusófono. Mas por várias razões e porque estamos enclavados entre países francófonos, temos que interagir. E essa convivência não tirou nada à Guiné-Bissau, embora tanto o português como outras pessoas pensem que o espaço francês está a engolir o espaço guineense, não. É bom que fique claro que a Guiné-Bissau deve apresentar à França o quadro geral das áreas em que quer que este país coopere. O nosso país deve continuar a trabalhar, estar de pés firmes no chão e apresentar projetos do interesse do país e que não sejam aceites projetos que não sejam favoráveis.
OD: Havia um acordo no domínio militar entre os dois países, que depois foi interrompido com o conflito civil de 7 de junho. O senhor estava em ativo. Pode falar-nos dos avanços e recuos deste acordo?
AAT: Acordo, não. Cooperação técnico-militar, sim. Avanços, nós já estávamos avançados. Estávamos ao nível onde o embrião das forças armadas já era visível. Os recuos: qualquer que seja guerra civil ou golpe de estado faz recuar o país. Mas não significa que a França ia trazer militares nessa cooperação, o que precisávamos era de paz para que a Guiné-Bissau se construísse, utilizando a cooperação técnico-militar e a cooperação em termos gerais com os outros países. Não vejo como a Guiné-Bissau poderá sair desse tipo de situação, mas ela precisa saber o que quer, defender os seus interesses e aquilo que pensa que sirva os seus interesses.
OD: Fala-se muito na reforma nos setores da defesa e segurança. Na sua opinião, que mecanismos devem ser usados para o sucesso desta reforma?
AAT: Primeiro, é preciso que os políticos despolitizem a reforma das forças armadas, esclareçam os conceitos, o que é a reforma. Não é só tirar alguém e pôr outra pessoa, não. Pode, sim, ser também isso, porque quer dentro das forças armadas ou em qualquer instituição do Estado haverá sempre pessoas que veem e que se vão, as que são substituídas por outras, mais jovens. O país precisa de sangue novo para dar dinamismo ao país. A reforma nesse sentido foi o que eu disse logo no início. A cooperação deve orientar-se no sentido de criarmos escolas militares . Para criar escolas militares, precisamos de preparar militares novos e capacitados para que amanhã estejam à altura de instruir e de dar aulas nessas escolas. É preciso que tudo se crie, que essas reformas sejam feitas e que a legislação, que penso já existir, que seja respeitada e que as forças armadas se subordinem ao poder político, mas isso é possível apenas com as reformas. Para mim, a reforma deve começar pela instituição de instituições do ensino militar e instituições militares do ensino, para poder satisfazer os interesses do desenvolvimento das forças armadas.
OD: Forças de defesa da Guiné-Bissau não vão às missões de manutenção de paz há anos. A última participação do país foi na Libéria. Mas nos últimos anos o país recebeu duas missões, a última acaba de ser acionada depois do caso de 1 de fevereiro. O que pode estar em causa e o que deve ser feito para retomar esse privilégio?
AAT: Acho que não devem procurar soluções apenas nas forças armadas. É uma situação global do país, em que é difícil o guineense aceitar a solução de consenso. Quando há choque de interesses, temos que encontrar um ponto de equilíbrio para poder ultrapassar esse conflito de interesses.
Na Guiné, é o que nós não temos. Os militares não são os únicos problemas, porque aquilo que o país quer é o que os militares devem fazer. Os políticos devem cultivar a sua disposição para o consenso. Se esse objetivo for atingido… não se pode esperar até que se atinja em pleno cem por cento, não. É uma coisa que se constrói e os políticos têm que ter capacidade para isso. Enquanto os políticos não tiverem a capacidade de chegar a um consenso diante de diferentes problemas que se apresentam ao país, não vamos sair desta. Por exemplo, o que é que impediu a estabilização e a governabilidade depois das eleições de 2019, com certeza não foram os militares. Fez-se eleições, houve dois partidos mais votados, um que ganhou com maioria relativa, outro com 27 e outro conseguiu 21, mas há um que era um partido “Chaveiro”, que tinha apenas cinco deputados e que todo o mundo precisava dele para resolver o problema. Mas não se chegou a um consenso.
Há que se negociar para chegarmos a um consenso, porque a arte de negociar vai ser a tábua de salvação e permitir ao país voltar a participar nas missões internacionais de manutenção de paz. Se continuarmos nesse ritmo, as comunidades a que pertencemos estarão sempre com as suas forças no nosso país. O que é que justificou o primeiro de fevereiro? A liderança guineense deve voltar a calma e organizar um encontro de toda gente à volta de uma mesa, que os problemas cruciais sejam postos à mesa e que um acordo de consenso seja alcançado. Que se diga a verdade, doa a quem doer. Você tem verdade para me dizer que me diga. Se essa verdade me doer, tenho que pensar sobre a utilidade dessa verdade e dar prioridade a essa utilidade. Porque a reação ao meu ferimento vai prejudicar todos os guineenses. Tem que haver um mecanismo de regulação que esteja em condições de levar-nos, cada vez que há um problema, à volta de uma mesa. Numa crise, todos os momentos são válidos para a negociação e discussão, seja no início, no meio e no fim.
OD: Senhor Afonso Té, o critério de recrutamento era por via das escolas, mas depois de 7 de junho, o formato foi alterado?
AAT: Não sei dizer se foi ou não alterado. O que eu quero dizer é que nós estávamos a contar com a criação ou insuflar ao oficialato e à classe de praça de sargentos porque os antigos combatentes não tiveram tempo de ir à escola para ter um nível aceitável. Precisávamos de novos jovens, por isso fomos recrutar nas escolas. Na altura, criamos duas bases de orientações e duas bases degestão.
O que eu exijo àquele que recrutei numa escola e mandei estudar numa escola militar, não posso fazê-lo com quem não teve tempo, estava no mato a lutar. Eu era mais rigoroso com aqueles que foram recrutados nas escolas e foram formados do que quem estava todo tempo no mato. Se tivéssemos que fazer a justiça, não podíamos colocar uma pessoa que não teve tempo de estudar, porque estava a lutar, a concorrer com quem tem habilitações literárias. Caso contrário, estaríamos a criar uma situação de desequilíbrio, porque o outro, de acordo com os critérios, estaria a ganhar e o antigo combatente ficaria prejudicado. Para elevar o nível dos nossos militares, tínhamos que recrutar nas escolas, embora a lei, o serviço militar seja obrigatório.
OD: O atual Chefe de Estado-Maior das Forças Armadas da Guiné-Bissau, Biaguê Na N´Tan, tem falado na recuperação do Centro de Instrução Militar de Cumeré para a formação de oficiais subalternos e superiores. É possível, na sua opinião, que isso aconteça, num contexto onde a tecnologia dita as regras?
AAT: Sim. A recuperação do centro de Cumeré e diferentes centros militares existentes é mesmo desejável. Também é desejável a construção de novas escolas militares, tendo em conta os novos elementos, porque a natureza das ameaças no mundo de hoje édiferente da natureza das ameaças antes. É preciso que os militares sejam ensinados a pensar nessas ameaças e como lidar com elas. O que não compreendo é quando se recruta sem formar.
Os militares são recrutados e formados tendo em conta os objetivos da instituição. Quando começamos a participar nas operações da manutenção da paz, os oficiais que mandávamos, porque algunstinham um nível de habilitações literárias baixo acabaram por transformar-se em cozinheiros dos outros. Tivemos que parar para organizar essa gente para que pudessem resolver o problema e o que aconteceu, passamos de zero para oitenta do ponto de vista da nossa prestação. Tivemos excelente prestação em Angola, em Moçambique e na Libéria. Havia dois elementos nessas missões: dinheiro e o cumprimento da missão. Como o Estado guineense pagava mal aos militares, então as pessoas transformaram as missões em lugares para ganhar dinheiro. Até porque é bom ganhar dinheiro, mas era necessário fazer uma composição que integrasse toda a gente. Quando chegar a altura de ganha dinheiro, todos ganham e quando chega a altura de estar a nível da missão que lhe é apresentada uns cumprem, porque podem e sabem, e outros podem ir a reboque.
Por: Filomeno SambúFoto: F.S
Conosaba/odemocratagb
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