Ao
Presidente do Supremo Tribunal de Justiça
BISSAU
Venerandos
Juízes Conselheiros do
Supremo Tribunal de Justiça
LUÍS MANUEL CABRAL, casado, jurista, residente em Bissau e elegendo domicílio profissional na Praça dos Heróis Nacionais – Sede Nacional do PAIGC, mandatário nacional do Candidato Eng.º Domingos Simões Pereira às eleições presidenciais que decorreram, em segunda volta, no passado dia 29 de Dezembro de 2019, não se conformando com o apuramento nacional dos votos e com o documento assinado no pretérito dia 14 de Janeiro de 2020 na Sede da Comissão Nacional de Eleições, pretendendo a CNE e os demais signatários que o mesmo corporize a acta que suporta o pretenso apuramento nacional, vem desses actos apresentar o presente RECURSO, o que faz nos termos e com os fundamentos seguintes:
1.º
Com o n.º 1, junta-se convocatória para a Plenária da CNE cujo único ponto da ordem do dia consiste em “Aprovação de Acta de reunião anterior”.
2.º
Essa reunião do dia 14 de janeiro iniciou-se com a apresentação da ordem do dia pelo Presidente da CNE, quando pediu ao secretário para ler a acta da reunião anterior. Pedida a palavra pelo representante do ora recorrente junto da CNE, foi dito que deu entrada a um requerimento do ora recorrente na qual se requeria a inclusão dos seguintes pontos na ordem do trabalho:
1. Apresentação e análise da avaliação efectuada sobre a Actas Sínteses fornecidas pela CNE;
2. Informação relativa ao sequestro do Presidente da CNE (PCNE)
3. Realização de uma peritagem a sistema informático da CNE.
3.º
O Presidente da CNE, referindo já ter indeferido o requerimento supra, decidiu novamente pelo indeferimento, relegando para mais tarde a notificação de tal despacho.
4.º
Pelo mandatário do recorrente foi apresentada reclamação referindo que, a decisão do Acórdão n.º 1/2020 do STJ que ordena o cumprimento da formalidade essencial, não se cumpre com a mera assinatura da acta, mas sim com a prova de realização do apuramento nacional nos termos artigo 92.º da Lei Eleitoral.
5.º
Das questões prévias/reclamações acima descritas resultou apenas a inclusão do ponto Diversos na ordem do dia.
6.º
A CNE decidiu então levar a cabo a leitura da acta de apuramento Nacional pretensamente ocorrida no dia 1 de janeiro, mas teve que nela introduzir alterações, pelo que não pode proceder a alegação da existência de tal acta, com a justificação de que apenas por lapso do Secretário não foi assinada pelos presentes na reunião.
7.º
Mais do que a alteração do conteúdo da acta e assinatura, também a lista de presenças da pretensa reunião do dia 1 de janeiro foi entregue aos presentes na reunião do dia 14, que a assinaram com data do dia 1, o que constitui prova de que não foi apenas a assinatura da acta de apuramento nacional que se encontrava em falta.
8.º
Assim prova-se que todos estes actos praticados ontem dia 14, tornam a acta de apuramento nacional assinada, um documento falso, arguindo-se pois tal falsidade neste recurso para todos os legais efeitos.
9.º
Também os autores das rubricas contidas na acta assinada no dia 14, com data de 1 de janeiro de 2020, não podem ser identificados, pois não foi colocado o nome dos assinantes.
10.º
Essa impossibilidade de saber quem foram os subscritores da acta, reconduz-nos à figura de actos INEXISTENTES, prevista no artigo artigo 117.º n.º 1 al. a) do Código de procedimento administrativo conjugado com o artigo 108.º al. a) da mesma Lei.
11.º
Pelo acórdão n.º 01/2020, a Plenária do STJ declarou não estar em condições de apreciar o Recurso de Contencioso Eleitoral apresentado pela candidatura do Eng.º Domingos Simões Pereira, em virtude de não ter sido junta aos autos a acta de apuramento nacional dos resultados eleitorais pela CNE nem por qualquer das candidaturas presentes na 2.ª volta das eleições presidenciais.
12.º
Tal como ficou demonstrado no requerimento que a candidatura do Eng.º Domingos Simões Pereira deu entrada nesta Suprema Corte no passado dia 14/01/2020, tal acta de apuramento nacional não foi junta aos autos do processo n.º 01/2020 porque, de facto, ela não existe, pela simples razão de não ter havido lugar ao apuramento nacional dos resultados nos termos que a lei determina.
13.º
Sucede porém que, após a notificação do acórdão supra referido às partes, o Presidente da Comissão Nacional de Eleições convocou para ontem, dia 14/01/2020, uma reunião da plenária, tendo como ordem do dia, ponto único, assinatura daquilo que ele chamou de acta de apuramento nacional. Em anexo junta-se o tal documento (doc. 1).
14.º
O documento referido no articulado anterior não pode servir de base à validação da comunicação feita aos órgãos de comunicação social pelo Presidente da CNE no passado dia 01/01/2020 como sendo anúncio de resultados provisórios da 2.ª volta das eleições presidenciais. Por vários motivos, que agora passamos a expor.
15.º
A acta de apuramento nacional cuja ausência o STJ tão doutamente fez notar no acórdão n.º 01/2020 é fruto e constitui suporte probatório das deliberações da plenária da CNE, reunida para praticar um acto de administração eleitoral, que é o apuramento nacional.
16.º
Estabelece o artigo 97.º, n.º 1 da Lei Eleitoral que “das operações de apuramento nacional é IMEDIATAMENTE lavrada acta onde constem os resultados apurados, as reclamações, os protestos e os contraprotestos apresentados e as decisões que sobre elas tenham sido tomadas”.
17.º
Ora, como é do conhecimento geral, aliás pela ampla cobertura mediática que foi reservada ao acto, o documento aqui em crise foi assinado ontem, dia 14/01/2020, mas, de forma FALSA, consta que foi elaborado no dia 01/01/2020.
18.º
Mas a verdade é que não é possível fazer validamente apuramento nacional de resultados eleitorais sem que no final do mesmo acto se assine a respectiva acta.
19.º
Desde logo, porque o artigo 97.º, n.º 1 da Lei Eleitoral diz que desse apuramento tem que se lavrar imediatamente a competente acta. Significa, pois, que a elaboração da acta é um elemento essencial do próprio acto de apuramento nacional e a sua ausência consubstancia um vício de forma, na modalidade preterição de formalidade essencial , cuja sanção é a anulabilidade do próprio acto (artigo 119.º, n.º 1 do Código de Procedimento Administrativo – Lei n.º 17/2011, de 12 de Outubro).
20.º
E compreende-se que assim seja, porquanto a exigência de tal formalidade essencial é relativa à prática do próprio acto e está alinhada com o princípio da continuidade dos trabalhos do apuramento nacional, consagrado no n.º 3 do artigo 95.º da Lei Eleitoral.
21.º
Com efeito, este preceito estabelece que “os trabalhos do apuramento iniciam-se imediatamente após a recepção de actas dos apuramentos regionais, devendo efectuar-se ininterruptamente até à sua conclusão”.
22.º
Não havendo uma acta lavrada e assinada no dia 01/01/2020, no culminar de um processo de apuramento nacional, não se pode considerar que uma qualquer reunião que eventualmente tenha sido realizada nesse período pelos membros da CNE tenha a natureza de trabalhos de apuramento nacional dos resultados eleitorais.
23.º
Sem uma acta imediatamente lavrada e assinada pelos membros da plenária e que contenha informações sobre os resultados apurados, as reclamações, os protestos e os contraprotestos apresentados e as decisões que sobre elas tenham sido tomadas, não se pode dizer que houve apuramento nacional dos resultados eleitorais e, consequentemente, não poderia ter havido lugar à divulgação de resultados provisórios do pleito eleitoral.
24.º
Por outras palavras, a recolha de assinaturas no dia 14/01/2020 para a lista de presenças na tentativa de validação” da acta da conferência plenária do dia 01/01/2020, para além dos incontáveis vícios de que padece, conflitua de forma irremediável com o princípio da continuidade e interruptibilidade das operações de apuramento nacional, acolhido pelo nosso sistema de administração eleitoral.
25.º
Um apuramento dos resultados eleitorais, nos termos prescritos no artigo 95.º, n.º 1 da Lei Eleitoral, teria feito constar dessa putativa acta informações sobre as decisões tomadas em plenária e a forma como foram tomadas, nomeadamente a menção em como houve consenso ou não na sua aprovação e, na falta de consenso, quais as matérias que tiveram de ser decididas por deliberação do Secretariado Executivo da CNE, nos termos do artigo 13.º da Lei n.º 12/2013, de 27 de Dezembro.
26.º
Teria sido igualmente uma oportunidade para se confrontar os dados lançados pela Comissão Nacional de Eleições e as próprias actas de apuramentos regionais, cuja discrepância é notória, tal como se vê demonstrado nos documentos que se juntam aos presentes autos.
27.º
Constate-se que nem a ANP nem o Governo, enquanto órgãos de soberania, nem o PAIGC, enquanto partido político que suporta a candidatura do Eng.º Domingos Simões Pereira, foram notificados da acta de apuramento nacional, nos termos do artigo 95.º, n.º 2 da Lei Eleitoral. Ou seja, se tivesse havido realmente apuramento nacional, a CNE teria notificado aos órgãos de soberania e aos partidos políticos das respectivas deliberações.
28.º
O recorrente considera que a pretensa acta de apuramento nacional que foi lida, alterada e rubricada no dia 14 de janeiro, conforme documento a que se teve acesso através das redes sociais e que se anexa como doc. 3 não pode salvar o vício verificado com a divulgação de resultados provisórios sem a sua existência, uma vez que não só não houve apuramento nacional dos resultados, como nos termos do artigo 94.º da Lei eleitoral, o apuramento nacional deveria ter sido feito, impreterivelmente, dentro de um prazo de 7 a 10 dias, a contar da data de encerramento da votação (artigo 96.º da Lei Eleitoral).
29.º
Na verdade, o prazo estabelecido no artigo 94.º é peremptório, significando que o seu esgotamento sem que se mostre praticado o acto, constitui, de per si, um impedimento legal a que o mesmo acto se venha a praticar validamente (artigo 145.º, n.º 3 do Código de Processo Civil).
30.º
Quer isto significar que, sendo inválida a divulgação dos resultados provisórios feita no passado dia 01/01/2020, por não ter havido um apuramento nacional válido, tal acto não pode ser praticado após o decurso do prazo de 7 a 10 dias após o encerramento da votação.
31.º
Por último, tomou o recorrente conhecimento de que a CNE pretende divulgar os resultados definitivos hoje, dia 15/01/2020, sendo que a acta que deveria anteceder a divulgação dos resultados provisórios ainda não foi notificado aos interessados supra referidos, estando estes portanto em prazo para o recurso da mesma nos termos do artigo 144.º da Lei Eleitoral.
Nestes termos e nos melhores de direito e, sem prescindir do douto suprimento dos Venerandos Conselheiros, o recorrente pede:
a) Declaração da falsidade da acta de apuramento nacional assinada no dia 14, bem como a respectiva lista de presenças, com data de 1 de janeiro de 2020;
b) A anulação do apuramento nacional dos resultados da 2.ª volta das eleições presidenciais que a CNE pretende ter sido feito no dia 01/01/2020;
c) Declaração da Inexistência do apuramento eleitoral porquanto a acta que o pretende substanciar não tem autoria definida, pois os seus autores, não estão identificados, facto que impede pois ela apenas contém rubricas nos termos da al. a) do artigo 108.º, combinado com o 117.º n.º1 al.a) do CPA;
d) Em consequência da anulação requerida nos pontos a) e b), deve ser declarada a invalidade dos resultados provisórios divulgados pela CNE no dia 1 de janeiro de 2020;
e) Em cumprimento dos princípios da ininterruptabilidade e continuidade das operações eleitorais, mostra-se prejudicado uma recontagem de votos ou repetição de apuramento nacional, pelo que deve declarado a nulidade do acto eleitoral.
f) A anulação de todo o processo de votação, porquanto já se mostra precludido o prazo em que a CNE deveria ter feito o apuramento nacional provisório
Os Advogados
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