segunda-feira, 19 de fevereiro de 2024

REPORTAGENS Setor de Empada: ALUNOS ATRIBUÍDOS NOTAS ADMINISTRATIVAMENTE POR FALTA DE PROFESSORES

O inspetor escolar, Cesário Quartel da Silva, revelou que devido à falta de professores, algumas escolas no setor de Empada, região de Quínara, no sul da Guiné-Bissau, têm funcionado sem professores para algumas disciplinas, nomeadamente a Matemática, e as notas a essas disciplinas são atribuídas administrativamente e afirmou que o maior problema que essas escolas enfrentam tem a ver com a insuficiência de salas de aulas e condições físicas dos próprios edifícios, falta de carteiras, de quadros, de armários e algumas escolas não têm bancos, bem como a situação económica dos pais e encarregados de educação para matricular os seus educandos.

“Nessas condições, é difícil falar da qualidade de ensino. A qualidade do ensino não se resume apenas em pagar salários aos professores, mas também começa em garantir que as crianças tenham acesso à escola, que os pais e encarregadosde educação tenham consciência que as matrículas das crianças têm um período em que ocorrem terminam e que se não forem efetuadas neste período, complicam aorganização da escola e o início das aulas”.

O inspetor defendeu que é urgente resolver os problemas das escolas públicas no Sul do país.

O setor de Empada, de acordo com os dados da inspeção da educação, conta com 04 formatos de escolas, designadamente: públicas, privadas, madrastas e comunitárias. A nível de instituições públicas, o setor tem 33 escolas, 04 madrastas, 02 privadas e 06 escolas comunitárias, para 182 professores, um inspetor setorial e um escolar. Para este ano escolar de 2023/2024, tem um total de 8336 alunos, dos quais, 3895 são do sexo feminino.

INSPETOR REVELA QUE GRAVIDEZ E CASAMENTO PRECOCE LEVAM MENINAS A ABANDONAR ESCOLA

O responsável informou que outro fator associado tem a ver com as atividades agrícolas que fazem com que os pais e encarregados de educação obriguem os seus educandos a não iniciarem as aulas para se ocuparem dos trabalhos agrícolas, dos campos da lavoura e vigiarem o arroz.
“Esse comportamento influencia negativamente no desempenho dos alunos e leva a muitas reprovações das crianças, que durante o ano letivo não conseguem tomar todas as matérias. O primeiro período tem entre 58 a 60 dias úteis e se perder dois meses automaticamente não pode fazer nada. Também a distância entre as escolas e as tabancas tem contribuído também negativamente na aprendizagem das crianças”, indicou.

Defendeu que é preciso que o executivo crie escolas de pequena infância e pré-escolar, que permitirão às crianças terem noções básicas da educação antes de iniciar o primeiro ciclo, caso contrário “vamos continuar a ter crianças com idade elevada a estudarem no primeiro ano com muitas dificuldades”.

“O setor de Empada tem cerca de 9 mil alunos, da pré-escolar até ao ensino secundário em seis secções do setor de Empada. O número de professores que temos neste momento não corresponde às necessidades. Por exemplo, a escola da tabanca de Gã-Djimba tem de pré-escolar ao quarto ano de escolaridade, apenas um professor, mesmo trabalhando com bi-classe ou tri que significa juntar alunos de diferentes níveis, não vai conseguir fazer a cobertura completa dos alunos. É preciso colocar professores para que possam fazer face às necessidades. Os pais e encarregados de educação enviaram os seus filhos para aquela escola porque querem que sejam educados e formados, caso contrário continuaremos a ter dificuldades no setor educativo”, sublinhou.

Explicou que mesmo na cidade de Empada, algumas escolas estão com problemas de professores e que existem turmas em que os alunos estudam um ano letivo sem professor a algumas disciplinas, sobretudo os da matemática e física e no final do ano escolar é atribuído aos alunos notas administrativas.

“O governo, através do ministério da educação, entidade responsável pela política nacional da educação, deve dar prioridade à educação, porque é a chave para abrir qualquer porta no mundo atual em que nos encontramos”, aconselhou.

“Quando um jovem não tem escola nem conhecimento, fica muito complicado para a sociedade que queremos ter amanhã, para assumir os destinos do país. O Ministério da Educação Nacional, Ensino Superior e Investigação Científica deve criar as condições para que os alunos possam frequentar as aulas. Já se passaram muitos anos que os alunos não recebem os materiais didáticos e a consequência disso, temos alunos da primeira classe que não sabem nem sequer ler bem, não conhecem as consoantes e as vogais, porque não têm livros. É urgente criar essas condições, porque é dever do Estado dar educação a todos os seus cidadãos”, advertiu.

Sobre a participação das meninas nas escolas, Cesário da Silva disse que as meninas inicialmente matriculavam-se em grande escala, mas com o decorrer do tempo, abandonam a escola devido a vários fatores, nomeadamente, a gravidez precoce, o casamento precoce e outros motivos culturais das diferentes etnias que fazem parte daquela zona.

“O ano letivo está em curso, mas criaram barracas de fanado, obrigando várias crianças a abandonarem a escola para entrarem nas barracas de fanado”, denunciou e lembrou que investir na educação é garantir o futuro do país, como também criar escolas de formação técnico profissionais para desenvolver a Guiné-Bissau.

PROFESSORES SACRIFICAM-SE PARA GARANTIR O ACESSO À ESCOLA EM FARANCUNDA

O presidente do Conselho Técnico e da Estatística da Escola de Farancunda, Quintino Quadé, revelou que os professores colocados na escola local trabalham excessivamente e em algumas circunstâncias, sacrificam-se para garantir que as crianças tenham o acesso à escola.

“A escola tem no primeiro ciclo, de pré-escolar ao quarto ano de escolaridade, 150 alunos. No segundo, do quinto ao sexto ano, 105 alunos e no terceiro dispõe de 124 alunos para 9 professores colocados pelo Ministério da Educação Nacional e quatro professores da comunidade, totalizando 13 professores”, informou e disse que os professores colocados pela comunidade recebem de acordo com os incentivos pagos pelos alunos.

Quintino Quadé disse que a escola funcionava do primeiro ao sexto ano de solidariedade, mas devido à distância entre a tabanca e o setor de Empada, a comunidade decidiu aumentar os níveis para o oitavo ano, com o aval da delegacia regional do ministério da educação, razão pela qual os professores são obrigados a sacrificarem-se diariamente para fazer a cobertura dos dois níveis acrescentados.

O presidente do Conselho Técnico e da Estatística da Escola de Farancunda informou que a escola tem sete salas de aulas, não tem iluminação, as carteiras são precárias e incompletas, porque algumas estão estragadas, sem água potável e funciona em dois períodos, de manhã e à tarde.

“De acordo com o Ministério, as matrículas das crianças a partir do primeiro ao sexto ano de escolaridades não são grátis, mas as dificuldades em conseguir os professores, a comunidade aceitou a proposta para a introdução do regime de autogestão e cada aluno do ensino primário, da pré-escolar ao sexto ano, paga 400 francos CFA por mês. Os alunos da sétima e a oitava classe pagam 800 francos CFA, para evitar as paralisações no setor educativo”, sublinhou.

O responsável do conselho técnico assegurou que na tabanca de Farancunda tem havido uma participação massiva das meninas na escola e os dados estatísticos revelam que este ano, do primeiro ao sétimo ano de escolaridade, as meninas constituem o maior número de alunos, o que mostra que há uma evolução relativamente à participação feminina na escola.

“Em termos de desistências, acontece mais no primeiro ciclo, pré-escolar ao quarto ano, devido à falta de acompanhamento dos pais e encarregados de educação e no momento da comercialização da castanha de cajú”, indicou.

Questionado sobre se as sete salas de aulas que a escola tem são suficientes para albergar todos os alunos que fazem da tabanca, Quintino Quadé disse que não são suficientes, tendo em conta a procura dos alunos.

“No ano passado, trabalhamos em três períodos. Essa engenharia sobrecarregou muito os professores e também o horário não é ideal para o processo de aprendizagem, se tomarmos em consideração as precariedades que a tabanca tem, a falta da energia e outros condicionalismos sociais e culturais. Outra preocupação tem a ver com a distância que alguns alunos percorrem de quatro quilómetros para chegar à escola, devido à falta de escolas nas tabancas arredores”, frisou.

“Deparamo-nos com dificuldades desde a falta de giz, falta de armários para arquivo, falta de cadeiras para os professores; as portas estão danificadas e sem fechaduras. Se sairmos da escola, no dia seguinte encontramo-la em péssimas condições, porque os animais domésticos tomam conta dela à noite. A única coisa boa que conseguimos aqui são os géneros alimentícios disponibilizados pelo governo,em parceria com o Programa Alimentar Mundial (PAM), nomeadamente peixe enlatado mais nada. Essa política consegue reter e motivar os alunos a continuarem a vir à escola e a estudarem sem interrupções”, sublinhou.

Quintino Quadé defendeu que aquela tabanca tem necessidade de ter uma escola em condições, com capacidade para albergar mais alunos e colocação deprofessores para colmatar as vagas existentes, lembrando que, segundo o regulamento do ministério da educação nacional, cada sala de aulas deve ter, no máximo, 36 alunos, mas devido à insuficiência de salas de aulas “somos obrigados a não cumprir esse critério, o que não é bom para a aprendizagem das crianças”.

Denunciou que devido à falta de água na escola, os alunos abandonam as salas de aulas para fazer necessidades nas casas de banho das casas mais próximas da escola, isso tem dificultado o cumprimento dos planos de aulas diários dos professores.

“É necessário um levantamento sério das necessidades que os setores e as secções das diferentes regiões do país têm no setor da educação, porque só assim será possível ultrapassar a situação da precariedade do ensino em todo território nacional”, defendeu.

Por: Epifânia Mendonça
Foto: EP
Conosaba/odemocratagb

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