segunda-feira, 3 de maio de 2021

Opinião: A LITERATURA GUINEENSE É UM VEÍCULO DE (RE)ESCRITA DA NAÇÃO

 

Este pequeno texto, não pretende aprofundar as discussões sobre a literatura guineense, é uma breve reflexão sobre a influência da literatura na narração histórica da nação e sua importância para a construção de uma “identidade nacional”.

Desde as primeiras letras, a Literatura Guineense emergiu como voz de protesto e de reivindicação. Ela ocupa um movimento que entrelaça a vida social com a ficção, ou melhor, esta literatura ficcionaliza a realidade, sem deixar de perder a estética da criação literária e seus encantamentos poéticos.

O valor da história é inegociável, por isso é válido ressaltar que a literatura não pretende ocupar o lugar da história. No âmbito da historiografia da Guiné-Bissau, a literatura, desde o período colonial, ocupou um lugar de (re)escrita da memória coletiva de seu povo, avançando, para o que chamamos período pós-colonial – lido aqui como após a colonização portuguesa – ela continua a tecer registros historiográficos do país, contribuindo para a ressignificação da Guiné pós-independência e a construção de uma identidade nacional, a partir do hibridismo cultural.

Se olharmos brevemente alguns poemas de Tony Tcheca, Vasco Cabral, Odete Semedo, José Carlos Schwarz, Carlos Vaz, Helder Proença, Agnelo Regala, o próprio Amílcar Cabral, notar-se-á um eu lírico potente na manifestação contra a colonização e suas intempéries, e registros de eventos históricos da GB.

Na prosa, destacam-se Abdulai Sila e Filinto de Barros, com romances que são importantes para compreendermos a Guiné-Bissau ontem, hoje e “prever” o amanhã. Todos os autores supracitados tem sido objeto de estudo no Brasil, dada a popularização das literaturas de língua portuguesa e por conta das relações no eixo sul-sul, o que é significativo, sobretudo para a cristalização de uma crítica literária guineense e aproximação entre as literaturas do sul global.

Um ponto intrigante é a dificuldade de acesso às produções literárias, por parte dos próprios guineenses, isto, devido a uma baixa difusão material da literatura e obviamente, aos fatores socioeconômicos que impedem o acesso a tais produções e dificultam a disponibilização em massa. 

Mas como subverter essa lógica? Se compararmos a atualidade com duas décadas atrás, veremos que houveram significativos avanços no âmbito, e ainda estão acontecendo. Os guineenses, por meio da tecnologia, têm conseguido, em menor escala (ainda) acessar algumas obras de escritores nacionais, sobretudo no que tange a digitalização desses documentos. 

A literatura produzida na Guiné-Bissau está conectada com a história e a sociologia, sem que ambas percam o seu lugar. É através desta intersecção de áreas que se tem realizado o movimento de (re)escrita da nação por meio da arte. E mais uma vez, é necessário elucidar que a literatura existe por si própria, as relações que estabelece com outras formas do pensamento crítico, não elide o seu papel e a sua subjetividade.

Quando se analisa uma obra literária e percebe-se que ela está relacionada com a história e cultura de uma dada sociedade, não podemos perder de vista que a ficção pode fazer a mimese da sociedade, mas continua sendo arte, na medida em que o escritor pode transpor a realidade ou modificá-la.

Para finalizar este nosso breve diálogo, penso ser urgentemente necessário que o Estado guineense comece a pensar melhor na educação nacional e na implantação de projetos políticos-educacionais, visando uma promoção da cultura e da literatura local.

Aqui no Brasil e em Portugal, há muitos pesquisadores guineenses, no âmbito educacional e literário, então, não faltará quadros capacitados para a construção de um projeto socioeducacional que respeite as culturas locais e suas pluralidades. A GB precisa valorizar as potências do próprio país. Enquanto brasileiro, que tanto apreço tenho pelo país, estou dando a minha contribuição, mas o meu maior desejo quanto ao progresso nacional, é que o país valorize e aposte nos quadros da terra. Nô djunta mon pa bem di terra!


Por: Marcos Vinicius Silva (Mallick)

Licenciado em Letras – Língua Portuguesa

Especialista em Psicopedagogia

Mestrando em Estudos Literários

odemocratagb

Sem comentários:

Enviar um comentário