O Presidente da República Portuguesa iniciará na próxima segunda-feira uma visita à Guiné-Bissau, um país cujo povo mantém uma singular amizade com Portugal. Para compreender a Guiné-Bissau é necessário olhar para a guerra civil de 1998, que opôs o general Ansumane Mané ao lendário Presidente Nino Vieira com consequências catastróficas, tendo provocado milhares de mortos, a fuga para o estrangeiro dos quadros e profissionais mais capacitados, o colapso da Administração Pública, a erosão da autoridade do Estado e a multiplicação da conflitualidade e de fatores fraturantes em todos os quadrantes da sociedade.
Nos 20 anos após o conflito de 1998, o PAIGC, que até aí era o "dono" das Forças Armadas, perdeu preponderância no setor castrense, mas nunca perdeu o controlo efetivo do aparelho do Estado, dos sindicatos e das organizações da sociedade civil. Porém, devido às teias com que o PAIGC controla a sociedade guineense, as permanentes disputas internas naquele partido refletem-se, em cascata, na desestabilização da Guiné-Bissau. Por isso as disputas pela liderança no PAIGC acabaram sempre por provocar golpes de Estado na Guiné-Bissau, tal como ocorreu em 1980, em 1998 e em 2012.
A chegada de uma nova geração à liderança do PAIGC, em 2014, parecia trazer a esperança da mudança nesse partido e no país. Porém, rapidamente se percebeu que a nova liderança, com um discurso ágil e moderno para o exterior, comungava internamente das ideias e métodos da "velha guarda", tendo optado pela exclusão e purga de opositores internos, esmagando impiedosamente os adversários e dividindo o país como nunca, através de um discurso mais populista, fraturante e de terra queimada. Este cenário de prelúdio de uma catástrofe política que iria mergulhar o país no caos levou a que todas as forças de oposição se tivessem juntado, em dezembro de 2019, para apoiar a eleição do general Umaro Sissoco Embaló ao cargo de Presidente da República, acabando assim com uma longa era de instabilidade, corrupção, nepotismo e desmandos de toda a espécie, que adiaram o futuro da Guiné-Bissau ao ponto de alguns o terem considerado um Estado falhado.
Um país novo a renascer das cinzas
A eleição do novo Presidente e a formação de um governo de maioria parlamentar representam não só uma nova oportunidade para o povo guineense, mas também para a cooperação entre este país e os seus principais parceiros, de entre os quais pontifica Portugal, primeiro país europeu visitado pelo Presidente Sissoco Embaló logo após a sua investidura. Tendo encontrado um país à deriva, sem disciplina e sem autoridade, o Presidente Sissoco foi inicialmente obrigado a agir com contundência e músculo político, para acabar com o caos a que ele apelidava de "república das bananas". Decorrido um ano, o país começa a entrar nos "eixos", conquistou a estabilidade política e recuperou credibilidade internacional. As novas autoridades guineenses acabam de propor a Portugal a construção de "uma parceria estratégica para o futuro, fundada no conhecimento e na cooperação económica e empresarial, em benefício mútuo". O objetivo das autoridades de Bissau consiste em industrializar o seu país, unindo sinergias com Portugal, para que este país possa expandir as suas exportações, beneficiando dos mecanismos da União Aduaneira da CEDEAO, com um mercado de 380 milhões de consumidores, onde se insere a Guiné-Bissau.
A arquitetura da proposta Aliança Estratégica para a Cooperação Económica entre Portugal e a Guiné-Bissau permitirá, por exemplo, que sapatos fabricados em São João da Madeira possam ser exportados para a Guiné-Bissau (espaço aduaneiro da CEDEAO) como produtos semiacabados, pagando taxas de 3,5%, em vez de 32%, podendo ser finalizados em território guineense com incorporação nacional superior a 12%, convertendo-se, assim, em produto de origem guineense, de acordo com a regras de origem da CEDEAO. Esta estratégia, numa lógica de win-win aplicada a vários setores da indústria irá contribuir para o incremento das exportações portuguesas, apoiando também a industrialização da Guiné-Bissau, a qualificação dos trabalhadores e a valorização do produto.
Para a sua concretização, as autoridades guineenses sugerem a criação de mecanismos de promoção de parcerias através de clusters de empresas focalizadas também em outros setores, tais como a agricultura, turismo, infraestruturas, economia do mar, florestas, recursos naturais, energia, ciência e tecnologia. Os dois governos estão apostados em inaugurar uma nova era nas relações bilaterais, com resultados frutíferos e duradouros em benefício mútuo. Que bons ventos aportem a Bissau a nova caravela da amizade, que, em boa hora, transportará o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, que será recebido com o calor e a enorme ternura que os guineenses nutrem pelos irmãos portugueses. A história registará este reencontro de dois povos bravos e irmãos para um novo começo, ao fim de 47 anos perdidos. Que prevaleça o ESPÍRITO DE BISSAU para um futuro de prosperidade partilhada entre portugueses e guineenses.
Conosaba/DN
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