Os guineenses que serviram o exército português no período colonial e que até ao momento não beneficiaram das respetivas pensões anunciaram que vão entregar uma “Carta Reivindicativa” ao Presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, durante a sua estada na Guiné-Bissau para uma visita oficial de dois dias (17 e 18 de maio de 2021).
A informação foi tornada pública pelo porta-voz do Coletivo das Associações de Ex-militares das Forças Armadas Portuguesas, Braima Candé, durante uma entrevista concedida ao Jornal O Democrata, para falar da situação dos antigos comandos portugueses que não conseguiram receber as suas pensões, bem como das ações desenvolvidas pela sua organização junto da Embaixada de Portugal na Guiné-Bissau para obter um encontro com o chefe de Estado de Portugal.
Candé, filho de um dos comandos portugueses no período colonial e que agora dirige uma das organizações de antigos comandos portugueses, explicou que o coletivo tem uma “carta reivindicativa” com quatro pontos para entregar ao Presidente Marcelo Rebelo de Sousa. Acrescentou que o desejo do coletivo é entregar a carta logo na segunda-feira, 17 de maio, nas mãos do chefe de Estado português no aeroporto internacional Osvaldo Vieira, após a sua chegada à Guiné-Bissau.
CANDÉ: “PORTUGAL ASSUMIU NO ACORDO DE ARGEL QUE PAGARIA AS PENSÕES DE EX-TROPAS PORTUGUESAS”
“Temos quatro pontos escritos na carta: Primeiro, a recuperação da nacionalidade conservada, porque no período colonial os antigos militares tinham documentos como cidadãos portugueses. Assim, deve ser devolvida essa nacionalidade para que gozem do mesmo direito que os cidadãos portugueses. O segundo é o cumprimento integral do acordo de Argel (Argélia) assinado entre o governo português e os representantes do PAIGC na altura, a 26 de agosto de 1974, no qual Portugal decidiu que pagaria todas as pessoas que serviram esse país na época colonial e que até ao momento não foi cumprido. Terceiro é a facilidade na emissão de vistos na Embaixada de Portugal na Guiné-Bissau para todas as pessoas que serviram a administração colonial e que pretendam fazer tratamento médico em Portugal”, explicou.
Braima Candé disse que o quarto ponto reivindicativo tem a ver com a recuperação dos restos mortais de ex-militares portugueses enterrados em valas comuns em diferentes zonas do país e entregá-los aos respetivos familiares.
Explicou que o coletivo entregou uma carta no passado dia 12 do mês em curso a pedir que a Embaixada de Portugal facilitasse uma audiência entre o coletivo e o chefe de Estado português, para que as partes pudessem conversar abertamente sobre a situação dos antigos comandos africanos portugueses. Lembrou que entregaram igualmente outra carta ao ministro do Estado e do Interior, na qual pediram que lhes fosse dada a oportunidade de entregar uma “Carta Reivindicativa” ao Presidente de Portugal, após a sua chegada no aeroporto internacional Osvaldo Vieira.
“Acreditamos que se o Presidente Marcelo ler a nossa carta, certamente, usará a sua magistratura de influência junto do governo português para a concretização das nossas reivindicações e garantir que os antigos comandos portugueses comecem a beneficiar das suas pensões. No acordo de Argel está claramente que o Estado português iria pagar esses homens, mas como deixaram alguns bens no país, por exemplo, casas e outras infraestruturas, caberia ao Estado guineense arrendar esses imóveis e canalizar as rendas para o pagamento das pensões dos ex-militares portugueses. Infelizmente, isso nunca aconteceu e como não podemos exigir ao Estado da Guiné-Bissau, por isso estamos a exigir agora ao governo de Portugal”, contou.
Questionado sobre se já têm feito algumas diligências no passado junto da Embaixada de Portugal no país sobre a situação de ex-militares, frisou que foram várias, mas sempre são confrontados com burocracias enormes da parte dos adidos militares, responsáveis por atender os assuntos dos ex-militares, nomeadamente, as cadernetas, a contagem do tempo e outras documentações.
Candé confirmou que os primeiros adidos colocados na embaixada de Portugal colaboravam com essa organização e que tinham um dia semanal para encontrar-se com elementos das associações de ex-militares para indicar os que precisam de contagem do tempo ou cadernetas. Para além dessa facilidade, tinham também uma ficha para preencher com os nomes das pessoas que necessitavam de cadernetas, porque muitas perderam os seus documentos.
Na sequência das diligências feitas junto da embaixada de Portugal, o porta-voz do Coletivo das Associações de Ex-militares das Forças Armadas Portuguesas pediu a colaboração do chefe de Estado da Guiné-Bissau no sentido de intervir junto do seu homólogo português, para garantir abertura da parte de Embaixada de Portugal na Guiné-Bissau para que os antigos militares ou os seus familiares passam ser atendidos condignamente e que sejam resolvidos os seus problemas em termos de documentação, bem como assegurar que doravante passem a beneficiar das respetivas pensões.
Questionado sobre o número total de antigos militares portugueses na Guiné-Bissau, Candé não precisou os dados nem avançou com números, porque alguns estão velhos e padecem de doenças por isso estão a ser representados pelos seus filhos.
“Se o dinheiro em dívida for pago pelo Estado português, o maior beneficiário será o governo da Guiné-Bissau, porque os ex-militares estão a viver aqui e vão construir casas para os seus filhos. Vão realizar atividades comerciais através das quais pagarão impostos para o Estado”, enfatizou e defendeu que é urgente a intervenção do Estado guineense nesse assunto.
Braima Candé afirmou na mesma entrevista que os ex-militares portugueses “estão num estado moribundo”, uma situação que disse ter provocado revoltas no seio dos comandos portugueses.
“Alguns deles estão em desespero total. Na semana passada por exemplo, um dos antigos fuzileiros, morreu. Alguns já nem conseguem organizar a família, o que é muito grave, tendo em conta a atual conjuntura mundial”, lamentou.
Por: Aguinaldo Ampa
Foto: A.A
Conosaba/odemocratagb
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