terça-feira, 2 de outubro de 2018

«OPINIÃO» " GUINÉ-BISSAU E O FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI)" - MESTRE: ALIU SOARES CASSAMA


O Fundo Monetário Internacional está de volta à Guiné-Bissau para se reunir com as nossas autoridades e avaliar o Programa de crédito alargado que está avaliado em cerca de 32,2 milhões de dólares americanos (USD).

O Executivo liderado por Aristides Gomes decidiu outra vez bater à porta do FMI para lhe solicitar um empréstimo destinado a apoiar a sua balança de pagamentos tão duramente afetada pela crise política que estamos a atravessar já la vão três anos.

Por outro lado, embora não se justifique objetivamente a comparação com um resgate financeiro que me faz pensar de imediato numa situação de banca rota, como o Estado guineense está sem dinheiro até para resolver as suas necessidades básicas, o que é facto é que o país está mesmo “à rasca” de dinheiro e não tem mais para onde se virar.

As evidências estão desde logo no próprio modus operandi do FMI sempre que há dinheiro em cima da mesa. Quando um país toma um empréstimo do FMI, o mesmo compromete-se a adotar um conjunto de políticas dirigidas à resolução dos problemas económicos estruturais. A expetativa é que esse compromisso, que também abrange os aspetos conjunturais específicos à condicionalidade própria do acordo, dê grande ênfase às reformas estruturais que garantam uma estabilidade macroeconómica de longo prazo.

No nosso caso, as receitas estão a baixar desde que a crise política se acentuou. A consequência imediata é que o Estado fica com menos capacidade de fazer face às despesas correntes do país e, também, com menor capacidade de fazer os investimentos públicos de que o país tanto carece.

O FMI, no âmbito das suas atribuições, exige uma garantia de transparência na gestão da coisa pública sem a qual não disponibiliza os financiamentos que visam reconstruir as economias.

O problema do modelo do FMI não está na teoria. O problema do modelo do FMI está na realidade. A Guiné-Bissau é um país que não tem uma efetiva economia de mercado. A Guiné-Bissau tem uma economia subdesenvolvida com forte intervenção do Estado, um grande peso da economia informal, uma enorme pobreza e uma distorção estrutural induzida pela corrupção. Portanto, para que possamos verdadeiramente beneficiar das virtudes disponibilizadas pelo conhecimento da Ciência Económica, temos que nos dispor a proceder a profundas reformas económicas.

Temos que primeiro criar uma economia livre e competitiva, assente em mercados eficientes e proporcionalmente regulados, para que depois faça sentido aplicarem-se as chamadas políticas de estabilização macroeconómicas propostas pelo FMI.

Por tudo isto, o programa de assistência financeira do FMI atualmente a ser negociado pelo Governo não vai ter qualquer eficácia, correndo-se o risco de ainda piorarmos a nossa situação devido às elevadíssimas taxas de juro que estão previstas neste programa, de dificílimo reembolso neste contexto de grandes dificuldades económico-financeiras.

O nosso país terá que se submeter às políticas recessivas que acompanham estes programas. Mas ao fazer isso, terá que imediatamente iniciar um esforço de upgrade da força de trabalho nacional, especialmente no que tange aos funcionários públicos, ao nível da seriedade, do espírito de sacrifício, da competência e da eficiência.

Recomendações

ü  -Assim, para a Guiné-Bissau, os apoios do FMI e do Banco Mundial, ou de qualquer outra instituição internacional, devem ser utilizados para criar uma nova economia e não para complicar ainda mais a nossa já débil atividade económica, em vários domínios;

ü  -Tem que se definir e implementar urgentemente um plano de transição económica do modelo oligárquico fechado que temos agora para uma verdadeira social-democracia de mercado;

ü  -Precisamos de fortes políticas orçamentais suportadas por uma máquina fiscal robusta, quer ao nível da eficácia quer ao nível da eficiência.

O governo afirmou recentemente que a campanha de caju deste ano está longe das expetativas e que o país já perdeu cerca de 21 milhões de euros. O FMI tem vindo, há já algum tempo, a alertar a Guiné-Bissau para a necessidade de diversificar a economia que se encontra demasiado dependente do Caju:

DIVERSIFICAR A ECONOMIA
O problema de excessiva dependência do Caju está identificado há muito tempo, mas pouco ou nada se tem feito para o contrariar. Assim, não é de estranhar que o FMI destaque a necessidade da Guiné-Bissau promover à diversificação da economia. Também já o tinha defendido num dos meus artigos de opinião.

O Caju tem sido o principal atractor de investimento direto externo e estou convencido que bastará uma pequena correção do preço para que toda a confiança se restabeleça. Tem sido através das exportações de Caju que o país tem conseguido arrecadar divisas e aumentar o stock de reservas internacionais, fundamentais para o cumprimento das metas económicas mínimas a que se tem proposto.

Em minha opinião, o atual momento, pela sua dureza, requer políticas económicas muito consistentes e a construção de um modelo económico muito menos dependente do Caju.
O FMI e a generalidade das instituições financeiras internacionais fazem normalmente diagnósticos económicos corretos mas erram sistematicamente nos remédios e nos tratamentos. Isso acontece porque aplicam sempre a mesma receita sem qualquer consideração pelas características culturais e outras idiossincrasias das economias em que intervêm.

Se conseguirmos romper com um passado repleto de erros e enveredarmos por uma via de seriedade, de competência, de transparência e de eficiência, estaremos em condições de garantir que nunca mais cairemos na armadilha da dívida e com isso nunca mais nos colocaremos à mercê do jugo neocolonialista do FMI.

Mestre Aliu Soares Cassamá

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