terça-feira, 26 de dezembro de 2017

O PERIGOSO CASO DONALD TRUMP


Chomsky se referiu a Trump como o "personagem estranho na Casa Branca, escroque de cabelos alaranjados, que avança seus peões monopolizando as manchetes"

“Trump c’est Néron” (Trump é Nero).

Com essa frase, depois de uma hora de debates, o respeitado economista francês Daniel Cohen resumia a personalidade desconcertante e incendiária do presidente americano, num programa da rádio France Culture. 

Nele, as jornalistas políticas Christine Ockrent e Sylvie Kauffmann (ex-diretora do Le Monde) e o próprio Cohen tentaram analisar racionalmente o intempestivo ato de unilateralismo diplomático de Trump, que reconheceu Jerusalém como capital de Israel.

Mas essa não foi a primeira vez que o presidente americano surpreendeu o mundo ao desprezar acordos, tratados e convenções internacionais. Ele fez da transgressão o seu modo de governar. 

A tal ponto que quase trinta especialistas americanos de saúde mental analisaram suas imprevisíveis e imtempestivas decisões. Os 27 psiquiatras e experts que se expressam no livro “The dangerous case of Donald Trump”, lançado em setembro deste ano, chegaram a um consenso : o estado mental do presidente “apresenta um claro perigo para a nação e para o mundo”. 

Por outro lado, mais de 60 mil profissionais de saúde mental americanos assinaram uma petição pedindo o afastamento do presidente por “manifestar uma grave doença mental que o torna psicologicamente incapaz de desempenhar sua função de presidente dos Estados Unidos”. Eles citam o artigo 4 da 25a emenda à Constituição, que prevê que “o presidente deve ser substituído se considerado incapaz de cumprir os encargos de sua função”.

De costas para a comunidade internacional

Com o reconhecimento de Jerusalém como capital de Israel, anunciado dia 6 de dezembro, o presidente aniquilava mais uma vez própria diplomacia americana, além de todas as resoluções da ONU, e se colocava de costas para a comunidade internacional, que condenou em uníssono o anúncio. A única voz a aplaudir Trump foi a do primeiro-ministro Benjamin Netanyahou. 

Trump minimizou as reações negativas porque pensa que é ele quem vai resolver o conflito que já dura 70 anos. 

Na realidade, ele acaba de depositar mais uma pedra no caminho de um futuro Estado Palestino com Jerusalém-Leste como capital, previsto em todos os acordos assinados entre israelenses e palestinos e no próprio “Plano de Partilha da Palestina”, de 29 de novembro de 1947, aprovado pela Assembleia Geral da ONU na resolução 181.

No jornal “Le Monde” que sucedeu ao anúncio de Trump, o editorial falava de um homem sozinho contra todos «que desconstroi um sistema de relações internacionais que os próprios americanos construíram depois da Segunda Guerra Mundial”. A decisão era classificada de “estupro da diplomacia como modo de regulação dos conflitos».

Ao lado do editorial, o artigo de Alain Frachon tinha um título que anunciava o tom : “Trump degrada a presidência”. Ele termina dizendo que os historiadores podem dizer que “esse homem desmoralizou a democracia americana como nunca foi visto antes”.

Para o escritor Emmanuel Ruben, francês de origem judaica que acaba de lançar o livro “Sous les serpents du ciel”, essa decisão de Trump, assim como a construção de muros, como Israel vem fazendo, “são bombas de efeito retardado que cedo ou tarde explodirão na cara do Ocidente”.

“Não se pode ignorar a realidade quotidiana da ocupação e da colonização israelense, a realidade quotidiana da humilhação dos palestinos”, diz. 

Seu livro anterior se chamava “Jerusalém terrestre”. “Mas ele poderia ter-se chamado “Jerusalém celeste” pois me pergunto o que restará de Jerusalém em 2048 se continuarmos a eleger loucos furiosos milenaristas que esperam o Apocalipse para apressar a vinda de Cristo à Terra”. 

Escroque de cabelos alaranjados

Quem é esse Nero moderno ?

Os grandes intelectuais americanos se inquietam e tentam entender o fenômeno Trump.

Para o escritor Russell Banks, ele é “um tipo oco, ignorante, brutal, possivelmente doente mental, que se cerca de bilionários e de milionários para governar. Trump é uma marionete nas mãos de plutocratas e pôde garantir o apoio das massas graças a sua celebridade midiática”. Para Banks, o presidente “fez campanha atiçando o medo, os preconceitos, o racismo, a misoginia e a xenofobia. O medo ganhou. Estamos iniciando uma era sombria”, disse o escritor em entrevista ao jornal “L’Humanité”.

No “Libération”, em novembro deste ano, o grande linguista e filósofo Noam Chomsky evocava “esse personagem estranho na Casa Branca, um escroque de cabelos alaranjados, que avança seus peões monopolizando as manchetes”.

“A técnica que ele domina consiste em fazer declarações as mais excêntricas e enquanto os analistas estão checando a veracidade para determinar o grau de mentira que elas contêm, ele passa a outra declaração fazendo todo mundo esquecer o que precedeu. Ele serve aos interesses dos super-ricos – pessoas e empresas – desconstruindo peça por peça um Estado Federal que deve servir aos interesses de uma população mais frágil, mas que eles julgam indigna de interesse. Ele precipita a espécie humana ao abismo em nome de interesses econômicos de curto prazo. Quando ele fala da extração do carvão para o ‘crescimento ‘ e pelos ‘empregos’, está apenas evitando a palavra tabu, o ‘lucro’”, diz Chomsky.

Quando ele tomou a palavra pela primeira vez na ONU, ameaçando a Coréia do Norte com o Apocalipse, o jornal “Le Monde” destacou a brutalidade e a agressividade do discurso, qualificado como um longo Tweet : vulgar, simplista e incoerente. “Procuramos em vão no discurso referências positivas aos direitos humanos e a valores humanistas”, observou o editorial intitulado “Trump degrada a ONU”.

Sobre o mesmo discurso, o diretor do jornal “Libération”, Laurent Joffrin, escreveu em editorial que o povo americano corre o risco de se arrepender muito rapidamente de ter eleito “um maluco ou semi-maluco para a Casa Branca”.

Esperemos que o artigo 4 da 25a emenda à Constituição possa ser posto em prática o mais breve possível.

Para evitar o Apocalipse.

Conosaba/cartamaior

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