Quem o diz é o politólogo português Paulo Gorjão. O investigador salienta que a comunidade internacional tem um papel fundamental na reestruturação politico-militar da Guiné-Bissau, nomeadamente através do financiamento.
Nas últimas duas décadas, a Guiné-Bissau viveu várias tentativas e golpes de Estado, uma guerra civil e assassinatos políticos. Em abril e maio deste ano, o país foi a votos. Os guineenses deram maioria ao PAIGC na Assembleia Nacional e elegeram José Mário Vaz como o novo Presidente do país. Domingos Simões Pereira foi empossado primeiro-ministro. Esta semana, também Hermenegildo Pereira assumiu a Procuradoria-Geral da República.
A DW África entrevistou Paulo Gorjão, politólogo do Instituto Português de Relações Internacionais e de Segurança.
DW África: Acredita que a nova ordem política vai manter-se?
Paulo Gorjão (PG): Acredito que estas novas lideranças encontrarão exatamente os mesmos problemas que as anteriores. Do ponto de vista estrutural e genérico nada mudou. Sem um apoio muito forte da comunidade internacional e dos parceiros, nada mudará e na primeira oportunidade os militares intrometer-se-ão de novo na vida política da Guiné-Bissau.
DW África: Mas admite que seja possível um novo golpe de Estado?
PG: Não acho que no curto e médio prazo haja condições para isso, mas não coloco de parte a possibilidade de voltar a haver instabilidade político-militar na Guiné-Bissau. Acho perfeitamente possível se não se levar para a frente um conjunto de reformas que há muito se sabe que é preciso fazer, nomeadamente a capacitação da administração pública e, relativamente aos militares, a reforma do sistema de segurança.
DW África: Qual é o papel da comunidade internacional nessa reforma?
PG: A comunidade internacional não tem legitimidade moral ou autoridade moral para exigir essa reforma do setor de segurança se não estiver disponível a ajudar do ponto de vista financeiro a materializar essa reforma.
DW África: E que reforma é essa? O que é que é preciso mudar?
PG: É preciso definir exatamente qual é a dimensão das Forças Armadas da Guiné-Bissau, quantos elementos é que devem ter... É preciso definir um plano de formação para essas Forças Armadas, é preciso dispensar e reformar elementos… Tudo isto custa dinheiro.
DW África: Acha que a sociedade civil da Guiné-Bissau está satisfeita com os resultados das recentes eleições?
PG: O retorno à legalidade democrática vem desbloquear uma série de instrumentos de cooperação. Acho que do ponto de vista dos cidadãos da Guiné-Bissau é uma excelente notícia. É preciso substantivamente viver o dia a dia. É preciso que este processo permita que se encerre este ciclo de violência no qual a Guiné-Bissau tem estado mergulhada.
DW África: Na recente Assembleia Geral da ONU, o ministro dos Negócios Estrangeiros português falou na possibilidade do destacamento de uma força de estabilização baseada na missão militar internacional na Guiné-Bissau (ECOMIB). Acha que o país precisa de uma nova missão?
PG: Penso que sim. Essa tem sido a posição portuguesa que me parece perfeitamente legítima e que é de transição. Se a Guiné-Bissau está a entrar numa nova fase e num novo ciclo de algum modo é preciso refletir na realidade este novo ciclo. O que Portugal quer, e que me parece correto que queira, é uma resolução do Conselho de Segurança que forneça o enquadramento para uma presença militar mais alargada não só dos parceiros da CEDEAO mas também da própria CPLP.
DW África: Acredita que, portanto, o próximo passo para estabilização política da Guiné-Bissau deve ser dado pela comunidade internacional.
PG: Parece-me fundamental, acompanhando o regresso à ordem democrática e constitucional, que as Nações Unidas consagrem isso através de uma resolução do Conselho de Segurança que acompanhe a própria evolução da situação e que legitime uma recomposição da colaboração e da presença internacional na Guiné-Bissau.
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