A Global Witness diz que, em Angola, desapareceram centenas de milhares de dólares em pagamentos feitos por consórcios petrolíferos à Sonangol, alegadamente para financiar um centro de pesquisa. Que não existe.
O alerta foi dado pela organização Global Witness, que combate a corrupção no setor da exploração de recursos naturais. Esta organização internacional segue com atenção há vários anos os pagamentos para projetos sociais efetuados por companhias como a British Petroleum, ou BP, e os seus parceiros, incluindo a norte-americana Cobalt, no âmbito de negócios em Angola.
"Os consórcios concordaram em doar 350 milhões de dólares para um projeto chamado 'Centro de Pesquisa e Tecnologia’ da petrolífera angolana Sonangol", explica o especialista para assuntos angolanos da Global Witness, Barnaby Pace. Durante muito tempo, a organização tentou encontrar o centro, mas "nem a BP, nem a Cobalt nem a Sonangol nos mostraram qualquer prova de que ele existe."
Segundo a Global Witness, apenas a britânica BP respondeu sequer às indagações, afirmando que o centro ainda estaria em fase de planeamento. Isto, apesar de já ter sido efetuado o pagamento de uma grande parte da soma. O facto de não se saber onde foi empregue o dinheiro desperta suspeitas de que tenha sido desviado, diz Pace.
"O povo angolano não tem como verificar o que aconteceu a esta enorme soma de dinheiro", afirma o especialista. "Não há provas de que se trate de corrupção. Mas o que é grave é que, neste caso, os pagamentos só foram tornados públicos porque a Cobalt foi obrigada a publicar todos os seus contratos por estar cotada na Bolsa de Valores de Nova Iorque".
Transparência é 'apólice de seguro'
Barnaby Pace pergunta: Quantas outras empresas estarão a fazer pagamentos idênticos dos quais o público nada sabe? Para a Global Witness, é óbvio que as novas leis anti-corrupção nos Estados Unidos e na Europa, que obrigam as empresas a maior transparência, devem ser rapidamente implantadas, para proteger os interesses de cidadãos em países como Angola, mas também dos investidores nestas empresas. Não é, no entanto, o entendimento de muitas multinacionais, que, sobretudo nos Estados Unidos, tentam travar a implantação através de processos jurídicos.
O especialista da Global Witness diz que esta atuação dos consórcios vai evidentemente contra os seus próprios interesses. "Sobretudo as empresas que trabalham em países com regimes altamente cleptocráticos devem prepar-se para a eventualidade desses regimes caírem. E nessa altura as empresas que não são limpas correm o perigo de ser expulsas", comenta Pace.
Por enquanto, em Angola, o risco de uma empresa ser expulsa por práticas opacas e duvidosas é muito remoto. A norte-americana Cobalt, por exemplo, está sob investigação das autoridades do seu país desde 2011 por suspeita de negócios ilícitos com uma empresa angolana, propriedade de funcionários do estado e governantes, incluindo o atual vice-presidente, Manuel Vicente.
Vice-presidente angolano, Manuel Vicente (esq.), e secretário de Estado norte-americano, John Kerry
"Na altura, ele era o presidente da Sonangol, mas detinha uma participação secreta na empresa em questão", lembra o especialista da Global Witness. "É por isso que insistimos tanto na necessidade de transparência total no que toca à propriedade das empresas, sobretudo nas indústrias extrativas. Só assim se saberá quem beneficia dos contratos e só assim se poderá lutar contra a corrupção".
A DW África tentou contactar a Sonangol, o que não nos foi possível antes do fecho da edição.
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