Os funcionários públicos estavam em fila indiana às portas do Palácio do Governo para mais uma sopa dos pobres, oferta do Governo de Transição Inclusivo. (A grande massa do povo não era para aí chamada). Para aí chegarem uns arrastavam-se, outros eram levados de carrinhos de mão, empurrados por imigrantes Conacri guineenses. Os mais expeditos e ainda rijos regateavam até mais não com os ajudantes de toca tocas. Os portões do Palácio do Governo só abriam às 11, precisamente, quando o calor começava a apertar. Esse encontro diário fez com que todos se conhecessem uns aos outros e se tuteassem como se fossem crianças da mesma rua da amargura. Um magnífico dia, enfileirados como sempre, flagelados como sempre por um sol inclemente, mortos de fome e de sede como sempre viram diante de si uma aparição. Um homem, enorme, mas sereno, vindo de nenhures preparava-se para receber a ração do dia como se fosse um deles. Confusos, encolerizados tocaram a medo e ao de leve nos ombros do homem. Voltou-se chateado: - Que querem de mim?! Caíram uns em cima dos outros, formando uma montanha de desvalidos. De resto, demoraram a recompor-se. Quando, finalmente, voltaram a si, ousaram desafiá-lo: - Isso nós gostaríamos de saber! A causa da bicha é lá atrás, no poilão de Brá. Vá, desanda! O senhor sorriu-lhes pela primeira vez. Deve haver aqui algum equívoco. Eu sou o vosso salvador. O vosso messias. O D. Sebastião guineense. Vim tomar o poder para vos tirar da lama ou do buraco, como queiram chamá-lo, pobres irmãos pobres! Olharam-se atónitos. - Como é que nos podes salvar, se tens atrás de ti os que nos infernizaram a vida ao longo dos dois longos últimos anos?! Atreveram-se a perguntar. - Como é que nos podes salvar, se és acusado à boca pequena, de algumas malfeitorias antipatrióticas, como o corte abusivo de árvores de grande porte, comprometendo grandemente o nosso futuro comum?! – Acrescentaram, cada vez mais irados. - Deixe-nos em paz, irmão, que nós conhecemos o nosso salvador! Se conhecemos! Vai, mas é ocupar o teu lugar na ponta do rabo da fila, se é que fazes o favor! Ao que todos riram, desdentados, magros, esfomeados, doentes… Haviam ganho o dia. p.s.: "M'BIM TOMA" (Significa "vim tomar")Faz lembrar o "M'Ba Toma" ("Fui Tomar") dos duros velhos tempos guineenses, caraterizados pela fome e falta de víveres para o Zé Povinho. Os privilegiados não perdiam tempo nas grandes bichas porque, simplesmente, iam tomar a sua quinhão das mãos dos detentores do poder.
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